Número de crianças e adolescentes baleados bate recorde no Grande Recife, aponta instituto

Somente no ano passado, 13 crianças e 118 adolescentes foram atingidos por tiros nos municípios do Grande Recife
Raphael Guerra
Publicado em 30/01/2023 às 9:52
Heloysa, de apenas 6 anos, brincava na rua no momento em que acontecia uma perseguição policial na comunidade de Salinas Foto: FOTO AUTORIZADA E CEDIDA PELA FAMÍLIA


O número de crianças e adolescentes baleados bateu recorde no Grande Recife em 2022, segundo levantamento do Instituto Fogo Cruzado. O resultado levou em consideração os últimos quatro anos, quando houve aumento da circulação de armas de fogo no País, graças aos decretos assinados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

Nos últimos quatro anos, 7.109 pessoas foram baleadas no Grande Recife. Desse total, 42 eram crianças e 428 eram adolescentes. 

Somente no ano passado, 13 crianças foram atingidas por tiros. Três morreram. Já entre os 118 adolescentes baleados, 71 não resistiram. 

Em 2021, foram oito crianças e 108 adolescentes baleados; em 2020, 11 crianças e 93 adolescentes; em 2019, 10 crianças e 109 adolescentes foram feridos a tiros.

Para a coordenadora regional do Instituto Fogo Cruzado em Pernambuco, Ana Maria Franca, o ano de 2023 traz, para a governadora Raquel Lyra, o desafio de proteger a vida de crianças e adolescentes e impedir que os mais jovens continuem entrando para as estatísticas. 

"É preciso olhar com mais atenção para a circulação de armas nas mãos de civis no Estado. Arma de fogo não é solução para a violência. Ela é o agravamento da violência. Se não queremos que nossas crianças e adolescentes cresçam em bairros violentos, com pessoas armadas, não podemos naturalizar armas de fogo dentro de casa”, afirmou Ana Maria Franca. 

Entre as 42 crianças baleadas nos últimos quatro anos no Grande Recife, metade foi vítima de balas perdidas. Nem mesmo dentro de casa elas estavam protegidas. Nove crianças foram baleadas quando estavam dentro de residências.

"Em Pernambuco, os tiros têm um alvo certo. A maioria dos casos é de tentativas de homicídio e muitos deles ocorrem dentro de residências. Mas em um tiroteio, quem não é alvo também pode ser atingido e o número de vítimas de bala perdida explodiu na região no último ano", disse Ana Maria Franca.

A gestão Raquel Lyra manteve a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, Criança, Juventude e Prevenção às Drogas. Carolina Cabral, titular da pasta, tem a difícil missão de planejar e lançar programas para tirar as crianças e jovens da situação de vulnerabilidade e, consequentemente, reduzir a violência.

BALA PERDIDA MATOU MENINA EM PORTO DE GALINHAS

A menina Heloysa Gabrielle, de 6 anos, foi uma das vítimas de bala perdida em 2022. Ela brincava na rua, na comunidade de Salinas, na praia de Porto de Galinhas, em Ipojuca, quando foi atingida por um tiro disparado por um policial militar do Batalhão de Operações Especiais (Bope). O caso foi em 30 de março.

Na época, os policiais do Bope alegaram que houve uma troca de tiros com um suspeito que fugia de moto. Os PMs disse ainda que as viaturas foram atingidas. Mas a investigação mostrou que o suspeito não efetuou nenhum tiro.

WELLINGTON LIMA/JC IMAGEM - INVESTIGAÇÃO Viatura usada pelos militares do Bope passou por perícia no dia seguinte à morte da criança

Isso foi comprovado a partir dos depoimentos de testemunhas no local onde a menina foi morta e também por perícias realizadas nas armas de fogo entregues pelos policiais e na reprodução simulada.

Os PMs do Bope contaram ter apreendido um revólver calibre 22 com três munições deflagradas e três intactas e atribuíram a arma ao suspeito que estava sendo perseguido e que conseguiu fugir.

O suspeito, posteriormente, se apresentou à polícia e afirmou nunca ter usado uma arma de fogo.

A perícia, em relatório final, também excluiu a possibilidade de o tiro que atingiu menina ter sido de uma arma calibre 22.

A perícia, inclusive, apontou que o mais provável é que tenha sido de uma arma calibre .40, a mesma usada pelo policial indiciado - e que confessou ter disparado tiros durante a perseguição policial. 

O cabo Diego Felipe de França Silva, apontado como autor do tiro na menina, foi indiciado pela polícia e, posteriormente, denunciado pelo Ministério Público. Atualmente ele responde, em liberdade, pelo crime de homicídio qualificado - por resultar em perigo comum e por erro de execução (quando se pretende ferir alguém, mas outra pessoa é atingida). 

Ele foi afastado das atividades por determinação da Justiça.

A audiência de instrução e julgamento do PM está marcada para o dia 14 de junho. Testemunhas de acusação, arroladas pelo Ministério Público, e de defesa (convocadas pelo advogado do PM) serão ouvidas.

No mesmo dia, o réu será interrogado - mas tem o direito de permanecer em silêncio. Após essa fase, o juiz poderá decidir se o PM irá a júri popular.

 

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