Publicado em 20/12/2018 às 14:22
| Atualizado em 20/12/2018 às 15:20
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Por Luana Ponsoni
Mauro Espíndola se encantou com as ginastas do Brasil nos Jogos de Atenas, mas não ousou tentar treinar a modalidade, taxada como "esportes de menina". Foto: Bobby Fabisak/JC Imagem
O olhar compenetrado para as meninas da minha escola brincando de boneca foi bruscamente interrompido. "Mauro, boneca é coisa de menina!", alertou a minha mãe. Eu tinha entre 7 e 8 anos. E, em ambiente escolar, no local onde costumava passar horas do meu dia, a mesma bronca se repetiu. Vinha até da mãe de algum coleguinha. A minha nunca teve preconceito. Só aquela negação típica e inicial de quando confirmei, aos 18 anos, o que ela sempre soube.
Não a culpo por me recriminar quando criança. Ela estava apenas descobrindo como ser mãe de alguém com uma orientação sexual diferente do que é imposto por uma sociedade machista e cheia de rótulos. Naquele momento, ela simplesmente não conseguia perceber que brinquedo não tem sexo. Que as crianças só querem se divertir, só querem imaginar. Durante muito tempo, o meu desconforto foi com essa realidade. Com o anseio de me encaixar em um mundo polarizado entre as cores rosa e azul.
Os sinais da minha homossexualidade afloraram aos 10 anos, que é a pré-adolescência, começo da puberdade. Comecei a sofrer muito preconceito na escola. Não tinha o comportamento esperado para um menino. De jogar futebol, ser mais agressivo. Era tranquilo, mais meigo. E é incrível como as crianças podem ser cruéis. O triste é que elas replicam o comportamento que veem em casa. E um contamina o outro.
Dentro desse contexto, os apelidos, provocações e brincadeiras de mau gosto pareciam brotar de um acervo infinito de crueldade. Eu estava no inferno, não restavam dúvidas. Dali para frente, tudo foi ficando mais difícil.
Lembro de alguns momentos tentando me encaixar no ambiente idealizado para os "meninos". Por incentivo do meu irmão, que jogava futebol, tentei entrar nas disputas desse esporte nos jogos internos da escola. Também com os amigos do prédio. Foram experiências frustrantes. Aquilo não era para mim.
Já a ginástica artística... Eu ficava fascinado na frente da TV, vendo Daiane dos Santos, Daniele Hypólito "voando" nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004. Me via fazendo esse esporte. Mas nunca pedi a minha mãe. Sabia que não era "coisa de menino". No Recife, acho que só tinha um lugar onde a modalidade era ensinada. E não é que houvesse uma proibição quanto a alunos do sexo masculino. É que só meninas procuravam a modalidade.
Acabei crescendo um atleta enrustido. Sempre fui competitivo, sempre gostei de mexer o corpo. Tentei o judô e gostei muito. Treinei por um tempo, mas houve mudança nos horários da escola e precisei sair. Então, fui para o vôlei, que dizem ser mais para as meninas. Adorei também. Fui bem, mas parei no mirim, porque o técnico da escola que eu estudava optou por só treinar as meninas.
Anos depois encontrei no crossfit a atividade para depositar toda a minha ânsia de extravasar aquela energia e competitividade. Comecei a treinar em 2015 e, para minha alegria, também encontrei exercícios de ginástica nesse esporte. Finalmente tiver a oportunidade de aprender alguns dos movimentos feitos pelas meninas da seleção brasileira em Atenas.
Eu nem tinha ideia, mas, a partir do momento em que entrei na box, o menino que não ousou pedir a mãe para ser ginasta ficou lá atrás. Assim como os xingamentos, preconceitos e humilhações. No crossfit e na vida, eu sou Mauro Espíndola, 28 anos, atleta, completo e feliz. Levou algum tempo, mas entendi que quebrar barreiras é ter liberdade para voar.
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