Atualizada às 19h30
Em 1888, neste dia exato de 13 de maio, era assinada pela princesa Isabel a Lei Áurea, que marcou a abolição da escravatura. Hoje, 132 anos depois, existem muitas críticas por parte do movimento negro a respeito da celebração desta data e do verdadeiro protagonismo do feito. Mesmo ciente destas problematizações, Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares, escolheu não apenas comemorar este dia como realizou uma série de postagens e publicações de artigos no site oficial da instituição, em que critica Zumbi dos Palmares e a própria consciência negra. Vale lembrar que a fundação está ligada à Secretaria Especial da Cultura, pasta do Ministério do Turismo.
Camargo é uma figura polêmica que já chegou a chamar Zumbi de "falso herói". Ao escolher exaltar o 13 de maio ele provoca o movimento que prefere celebrar o 20 de novembro, nascimento de Zumbi e Dia da Consciência Negra. Nas postagens das redes sociais da Fundação Palmares, a postura da instituição foi duramente criticada pelos internautas.
"Triste demais ver o que se tornou essa instituição. Vem sendo demolida em meio às ordens de um lunático, a construção de um povo que lutou e luta pra ter sua história contada da forma certa", escreveu um internauta nos comentários do Twitter.
Em resposta às postagens de homenagem à princesa Isabel, várias pessoas postaram fotos de personalidades negras que já faleceram, como a antropóloga Lélia Gonzalez, o escritor Abdias do Nascimento ou os mestres jongueiros Tio Mané e Tia Maria do Jongo.
Para a militante Bernadete Lopes, que ocupou o cargo de diretora de Patrimônio Histórico da Fundação Palmares durante a gestão de Gilberto Gil no Minc, Camargo não representa a população negra. “A gente passou a a vida inteira tentando desconstruir esse discurso que a abolição só aconteceu por bondade da princesa Isabel, como se antes da assinatura da Lei Áurea não houvesse tido nenhuma luta pela libertação das pessoas escravizadas. Isso é absolutamente mentira", pontua.
"O 13 de maio é uma data para reflexão, que aponta que a abolição é inacabada, e não um motivo para celebrar. Sérgio Camargo acaba negando a história de vida e de luta de muitas negras e muitos negros que inclusive morreram por esta causa. A postura ele é abominável.”
A atriz Zezé Motta também se posicionou contra e explicou de forma muito didática os porquês através de um texto no seu Facebook. "A princesa e seu feito são reverenciados nos livros escolares de história e a data, Dia da Abolição da Escravatura, foi instituída no calendário oficial como algo a ser comemorado. Mas para o movimento negro não há o que festejar", escreveu.
Na sequência, Zezé Motta prosseguiu: "Depois de muita luta das negras e negros do Brasil colônia, como a do Quilombo dos Palmares e a Revolta dos Malês, por exemplo, a Lei Áurea veio, mas veio sem nenhuma reparação moral ou econômica".
"Muitos permaneceram na própria fazenda onde trabalhavam como escravos por não ter para onde ir, outros, largados à própria sorte, passaram a ser marginalizados e discriminados, dando início às mazelas que combatemos até hoje", continuou.
Em março deste ano, Sérgio Camargo extinguiu sete órgãos colegiados da Fundação Palmares além de ter exonerados funcionários. Deixaram de existir o Comitê Gestor do Parque Memorial Quilombo dos Palmares, a Comissão Permanente de Tomada de Contas Especial, o Comitê de Governança, o Comitê de Dados Abertos, a Comissão Gestora do Plano de Gestão de Logística Sustentável, a Comissão Especial de Inventário e de Desfazimento de Bens e o Comitê de Segurança da Informação.
A chegada e permanência de Sérgio Camargo ao posto de presidente da Fundação Palmares foi bastante conturbada. Indicado pelo ex-secretário da Cultura Roberto Alvim em novembro de 2019, sua nomeação chegou a ser suspensa por uma ação cívil pública protocolada pela Justiça do Ceará no mês seguinte devido justamente a seus comentários de cunho racista. Entretanto, em fevereiro deste ano, o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, derrubou a decisão e Camargo voltou ao cargo.
Desde que Regina Duarte assumiu a pasta da cultura do governo Bolsonaro, a secretaria de o presidente da Fundação Palmares vêm tecendo críticas um ao outro. Ela já chegou a chamá-lo de “ativista” de forma pejorativa em uma entrevista ao Fantástico.