A situação das artes da cena é historicamente delicada e a fragilidade das políticas públicas voltadas para o setor ficaram ainda mais evidentes com a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus. Artistas de linguagens como teatro, dança e performance, além do circo, calcadas na presença, estão entre os primeiros que tiveram suas atividades paralisadas e devem ser uns dos últimos a voltar. Nesse sentido, a Lei Aldir Blanc é encarada como um bem-vindo e necessário suporte, mas não como uma solução final.
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Como o caráter emergencial da lei sugere, a iniciativa sancionada na última segunda-feira pela Presidência da República, após uma intensa luta e articulação da classe artística, os recursos devem fornecer garantias para que os fazedores de cultura garantam sua sobrevivência durante a pandemia e encontrem ferramentas para dar continuidade aos seus trabalhos. Para a artista da dança Duda Freyre, o momento é de articulação para gerar mudanças estruturais na forma como se pensa a cultura no Brasil.
“O cenário da dança em Pernambuco, em meio à pandemia, é de perplexidade e de uma volta à articulação. Os artistas da dança têm migrado para outras áreas, diante das dificuldades e é preciso encarar esse espírito de emergência da lei tanto no sentido de urgência desse aporte quanto na ideia de que precisam emergir novas formas de fazer, de capacitar aqueles que tradicionalmente não têm acesso aos recursos e às tecnologias; transformar a política cultural e fazer com que ela chegue também ao Brasil profundo”, pontua.
Duda ressalta que o processo de engessamento e dificuldades precede a crise causada pela pandemia e a dança tem sofrido com a falta de política nacional e a descontinuidade de ações como o Prêmio Klaus Vianna, da Funarte, que garantia um importante fomento para a área.
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No teatro, a situação também é complicada. Diante das incertezas, eventos importantes, como o Festival de Teatro de Curitiba, alteraram suas edições. No caso do evento paranaense, só participarão atrações locais e as atividades serão realizadas em espaços abertos. Se a circulação de obras pelo país já era difícil, com o cenário que se desenha, ela deve ficar ainda mais desarticulada. Em Pernambuco, eventos como o Trema! Festival de Teatro e o Festival de Circo do Brasil ainda não sabem como viabilizarão sua execução, já que ambos têm caráter internacional.
Desde a eclosão da pandemia, alguns grupos e artistas têm recorrido às transmissões ao vivo pelas redes sociais para continuar suas atividades, mas poucos são os que conseguem monetizar essas ações. Várias iniciativas de financiamento coletivo têm sido lançadas para tentar garantir a manutenção das atividades desses artistas e coletivos, que ainda se veem com dúvidas quanto às indefinições em relação aos repasses dos recursos da Lei Aldir Blanc.
Incertezas
Fátima Pontes, coordenadora-executiva da Escola Pernambucana de Circo, pontua, por exemplo, que não se sabe quais serão os critérios para definição dos valores destinados à manutenção de espaços culturais, pequenas empresas e organizações comunitárias. De acordo com a lei, eles podem variar entre R$ 3 mil e R$ 10 mil reais por mês, de acordo com critérios estabelecidos pela gestão local.
“No cenário de pandemia, nos articulamos em um Fórum de Gestores de Espaços Culturais de Pernambuco, com representantes de cerca de 50 equipamentos culturais de todo o estado. A gente parou de trabalhar, mas as contas não pararam de chegar. Como garantir a manutenção desses espaços? Embora existam diretrizes de destinação dos recursos na lei, há uma certa autonomia dos estados, então critério precisam ser definidos: vão abrir editais de emergência? O recurso vai ser aportado diretamente? É para quem está cadastrado no Mapa Cultural? O dinheiro vai ser usado em editais e prêmios que deveriam ser obrigação do Governo do Estado ou vão lançar convocatórias específicas? Tudo isso tem que ser explicado”, enfatiza.
Outro ponto que gera preocupação é uma possível burocratização do processo, uma vez que os recursos têm caráter emergencial e profissionais da área já estão sofrendo os impactos há pelo menos quatro meses.
“A Lei de Emergência pode nos garantir a possibilidade de continuar nossa articulação a longo prazo e é preciso que ela chegue em todos os que necessitam, do artista contemporâneo aos fazedores de cultura de municípios que nem secretaria de Cultura tem.
Estamos nos organizando para existir”, reforça Duda Freyre.
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