O Carni, coletivo pernambucano de arte negra e indígena, está realizando nesta semana uma série de ações no perfil Instagram do Solar dos Abacaxis. Inserção em Circuitos Mercadinhológicos parte das observações e reflexões dos artistas sobre as dinâmicas estabelecidas pela pandemia do novo coronavírus, em registros em vídeos, fotografias e sons.
Único contemplado do Nordeste para Local da Ação, iniciativa do Solar dos Abacaxis de apoio à produção artística durante a pandemia, realizada com os recursos doados para o FunColab (que, inclusive, está aberto para doações), o projeto do Carni dialoga com a proposta da instituição de retomar as intervenções na rua, entendendo as disputas simbólicas que esses espaços tensionam.
O nome do projeto faz alusão à obra Inserções em Circuitos Ideológicos, de Cildo Meireles, criada nos anos 1970, e também propõe uma revisão crítica dela a partir de percepções sobre o mercado da arte. Para desenvolvê-lo, os artistas selecionaram mercadinhos de bairro que cada um frequenta para realizar as ações, por entenderem que se trata de espaços que, durante a pandemia, se tornaram um dos únicos pontos permitidos de congregação de pessoas.
Até agora, o grupo compartilhou três obras no perfil do Solar dos Abacaxis: Só Ia ao Mercado, livro-ação: Ana Lira; Inclusive, Eu, de Lia Letícia; e Senhas Para Quê Te Quero, de Iagor Peres. Neste trabalho, por exemplo, Iagor utiliza as fichas distribuídas para o controle de acesso ao estabelecimento para criar uma provocação que pode ser lida como uma reflexão sobre contato, política e afetividades.
No vídeo, ele substitui a senha que recebeu na entrada por outra ficha com o número 100 mil, em alusão ao número até então número de vítimas da pandemia no Brasil. "De alguma forma, é uma tentativa de se inserir nesses circuitos e passar algum tipo de recado, divagação", pontua o Iagor.
Além deles, o Carni, fundado em 2016, atualmente o Carni é formado por Abiniel Nascimento, Ariana Nuala, Caetano Costa, Gi Vatroi, Kalor Pacheco, Kildery Iara, Leticia Barros, Mário Miranda e Victor Lima.
No contexto do isolamento social, o coletivo, que é multidisciplinar, com artistas, comunicadores, críticos, designers, entre outros, tem buscado entender como fortalecer suas trocas e ampliar suas redes de ações.
"Uma das nossas questões enquanto coletivo é a importância do encontro nos nossos processos. A fisicalidade sempre teve uma reverberação muito forte para nós e agora estamos buscando entender como articular essa presença, como nos articular, através do virtual", explica. "Nosso trabalho se pauta muito por uma troca efetiva, mais do que a execução de uma obra em si. Pensamos a articulação desses agentes em diferentes frentes e circuitos culturais para abrir espaços para a nós e para outros."