RETRATO DO BRASIL

Auxílio emergencial reduziu a pobreza em 32,45% em Pernambuco, diz estudo da FGV

O economista da FGV Social Marcelo Neri constatou uma redução da pobreza em vários Estados do Nordeste durante a pandemia,mesmo com a queda da renda do trabalho

Angela Fenanda Belfort
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Angela Fenanda Belfort
Publicado em 23/09/2020 às 23:12
JC IMAGEM
Segundo a Caixa, todas as pessoas que procurarem atendimento durante o funcionamento das agências serão atendidas. - FOTO: JC IMAGEM
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A pandemia do coronavírus trouxe um cenário, no mínimo curioso, à já combalida economia do País: quedas grandes na renda do mercado de trabalho e uma redução da pobreza superior a 25% em vários Estados do Norte e Nordeste, segundo dois estudos sob  coordenação do economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social) Marcelo Neri, um dos maiores especialistas brasileiros em pobreza e desigualdade. "Pernambuco e sua capital Recife são os melhores exemplos deste paradoxo. Ocorreu o desempenho recorde negativo da renda em Pernambuco( -26,9%), Recife (-29,5%) e a pobreza caiu 32,45%", afirma Neri. Essa última queda foi a segunda maior entre todo os entes federativos, perdendo apenas para o Tocantins (-36,08%). No País, a média da diminuição da pobreza ficou em 20,7%. "O efeito auxílio emergencial explica a convivência do inferno do mercado de trabalho com o céu de brigadeiro da renda geral do brasileiro", explica Neri. E faz um alerta: a saída agora deveria ser a geração de renda e de novos postos de trabalho, porque é isso que vai definir o bem estar social pós-pandemia.

>> pandemia de covid-19 provocou queda na renda, diz FGV

Implantado para diminuir o efeito da pandemia, o auxílio emergencial pagou cinco parcelas de R$ 600 para trabalhadores informais e também para os que apresentam uma renda menor do que meio salário mínimo per capita, que são os brasileiros mais pobres. Em julho de 2020, esse grupo era formado por 52,1 milhões de brasileiros, contra os 65,2 milhões que estavam nessa situação em 2019. "Foram 13 milhões de pessoas que saíram desta linha de linha de renda e grande parte deste contingente está nos Estados do Nordeste", argumenta Neri.

Ele explica que durante a pandemia "ocorreu uma redução da pobreza maior do que a registrada com o Cruzado (em 1986) e com o Real em 1994". No Norte e Nordeste, as taxas de redução da pobreza foram superiores às demais regiões, porque são as que possuem maiores parcelas da população dentro do público alvo que recebeu o auxílio emergencial. Somente como exemplo, seguem alguns Estados e os seus respectivos percentuais de redução da pobreza registrados em julho deste ano contra 2019: Rondônia (-30,73%), Acre (-27,04), Maranhão (-27,72%), Piauí (-25,63%), Ceará (-27,5%), Rio Grande do Norte (-27,15%), Paraíba (-29,97%) e Alagoas (-29,72%). O estudo que contém essas informações chama-se Qual foi o Impacto Imediato da Pandemia do Covid sobre as Classes Econômicas Brasileiras.

O problema, como argumenta Neri, é que essa queda da pobreza ancorada principalmente no auxílio emergencial não foi "sustentável". O auxílio emergencial já vai reduzir o seu pagamento mensal a partir deste mês passando para R$ 300. Antes, era R$ 600 por mês. E em dezembro o auxílio emergencial será extinto. "Provavelmente, vai aumentar a pobreza já este mês e ainda mais em dezembro. O Nordeste tem um grande programa de microcrédito, o CrediAmigo, que pode ajudar. Tudo vai depender das políticas públicas a serem implementadas", comenta Neri, citando que o que pode contribuir para melhorar esse cenário é a geração de renda ou postos de trabalho. Ele alega também que o Brasil tem poucos recursos financeiros e a situação fiscal não vai permitir a continuação do pagamento desses auxílios.

A "cambista" Elisangela Ferreira do Carmo trabalha, sem carteira assinada, numa banca do bicho em Sítio Novo, em Olinda, e recebe R$ 200 por dezena. O marido dela está desempregado há mais de três anos e faz, em média, uma vez por semana, serviços gerais na casa de um "advogado" recebendo cerca de R$ 400 mensais. Ela e o marido receberam, cada um R$ 600, do auxílio emergencial, em cinco parcelas mensais. "Me ajudou muito. A banca do bicho fechou durante os primeiros meses da pandemia. Com o dinheiro do auxílio, paguei os R$ 500 de aluguel e passei a fazer uma feira com o restante. Passei a comprar mais alimentos, como cereais, carnes e verduras", contou. Na média, ela e o marido tiveram um acréscimo de 20% da renda familiar devido ao auxílio emergencial. E o mais grave: caso não tivessem recebido o auxílio emergencial, os dois poderiam ter ficado sem qualquer renda durante parte da pandemia. Ela só voltou a trabalhar em setembro e ele também "passou meses" sem fazer qualquer "bico".

ESTUDO

A outra pesquisa citada por Neri é intitulada Efeitos da Pandemia sobre o Mercado de Trabalho Brasileiro: Desigualdades, Ingredientes Trabalhistas e o Papel da Jornada. Ela mostra que o brasileiro teve uma redução média de 20,1% da renda no segundo trimestre deste ano, comparando com os três primeiros meses deste ano. A renda dos brasileiros mais pobres caiu 27,9% e os brasileiros mais ricos também apresentaram uma redução de 17,5% (da renda). O que mais puxou essa queda, segundo o estudo, foi a redução de jornada de trabalho média de 14,34% para uma parte dos trabalhadores.

Ambos os estudos coordenados por Neri usaram as bases de dados do IBGE, que são os dados oficiais usados que indicam o comportamento de variáveis que traçam o cenário da economia brasileira, incluindo renda, mercado de trabalho, entre outros. O do trabalho sobre o mercado de trabalho compara o segundo trimestre com o primeiro deste ano. E o que analisa o comportamento da redução da pobreza compara julho último com a situação das mesmas classes econômicas em 2019.  

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