Pagar Auxílio Brasil furando teto de gastos é sinônimo de inflação, mais desemprego e queda do PIB; entenda os motivos
O Auxílio Brasil é o programa criado para substituir o Bolsa Família, porém sua fonte de financiamento pode causar problemas para a economia
A decisão do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em manter parte dos custos com o Auxílio Brasil, programa criado para substituir o Bolsa Família, fora do teto de gastos, tem potencial para desenhar um cenário bem mais negativo em comparação ao que já é sentido atualmente na economia. Na avaliação de especialistas ouvidos pelo SJCC, a medida pode gerar mais inflação, elevar os juros e afugentar investidores, aumentando o desemprego no país, que hoje está em níveis históricos.
Além disso, economistas apontam a possibilidade de queda do Produto Interno Bruto (PIB) com a ideia do governo para o novo benefício social, com claro viés eleitoral, visto que Bolsonaro já pavimenta o caminho para sua tentativa de reeleição em 2022.
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O teto de gastos é uma regra que limita o avanço anual dos gastos públicos à inflação do ano anterior. Ele foi criado em 2016 a partir da constatação de que o País caminhava para um cenário de desastre fiscal, já que o aumento das despesas públicas crescia ao ano sistematicamente 6% acima da inflação. Nesse ritmo, a análise geral é que não demoraria até que o país perdesse a capacidade de arcar com suas dívidas.
Ex-senador pelo Cidadania, o professor pernambucano Cristovam Buarque comentou o tema nessa quinta-feira (21), durante o programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal. Na avaliação do docente, o País precisa entender a necessidade dos limites.
"O Brasil se acostumou ao longo da sua história a não ter limites nem para destruir florestas nem para torrar dinheiro do Tesouro (Nacional). A gente está descobrindo que a Amazônia tem limite e o gasto público também", observa. “Esse tema trouxe duas questões importantes para a educação do brasileiro: a percepção da pobreza que nós temos, que precisa ser ajudada, e que é preciso ter limite de gastos”, emenda.
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Teto furado e suas consequências
Como alternativa à proposta da equipe econômica liderada pelo ministro Paulo Guedes, especialistas defendem que os recursos para dar vida ao Auxílio Brasil venham de outras fontes, mas seria necessário que o governo federal batesse de frente com setores poderosos da atividade econômica.
"O pagamento poderia vir dos subsídios tributários, por exemplo, mas mexeria com os interesses corporativos dos empresários. A reforma administrativa, que não foi feita como deveria, também seria uma alternativa para cortar gastos e permitir uma folga no orçamento”, pontua o economista e sócio-diretor da Ceplan Consultoria, Jorge Jatobá.
“No caso do remanejamento de recursos dos benefícios tributários, precisaria da decisão do Congresso para realocá-los. As emendas parlamentares são outra alternativa e a reforma tributária, que fizeram apenas um remendo e não avançou, também seria outra saída", completa Jatobá.
Já Buarque diz que também poderia buscar recursos do fundo partidário. "O governo está buscando a saída mais fácil furando o teto de gastos, mas isso terá consequências para toda a população, inclusive quem vai receber o Auxílio Brasil. Com o aumento da inflação e dos juros, a pessoa vai receber R$ 400 e na mesma hora o auxílio só vai valer R$ 390. No final do ano vai valer R$ 300, com os recursos sendo corroídos pela inflação", alerta.
Menos PIB, mais inflação, juros e desemprego
Para o professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e consultor de empresas, Ecio Costa, a intenção apresentada por Guedes poderá desacreditar o governo. Tanto que, na quinta-feira (21), vários integrantes do alto escalão do Tesouro Nacional pediram exoneração. "Esse furo no teto será temporário ou vai virar bagunça, acontecendo a cada momento que o governo considerar conveniente?", questiona.
O economista acredita que as duas alternativas oferecidas pelo governo vão gerar desconfiança de toda forma. Paulo Guedes fala em uma permissão temporária para deixar de fora do teto o gasto de R$ 30 bilhões com o Auxílio Brasil de R$ 400, que começaria a vigorar em novembro deste ano e se estenderia até dezembro de 2022. Outra alternativa seria antecipar a revisão do teto de gastos, que só estava prevista para 2026.
"Aumentar o valor do Auxílio para R$ 400 e passar a beneficiar de 15 milhões para 17 milhões de pessoas é até pouco. Mas o Congresso ainda pode aumentar esse valor. Sabemos que a população precisa do Auxílio, mas sabemos que ele vai retroalimentar a inflação, os juros e a queda do PIB no longo prazo, gerando mais desemprego e mais pobreza, que é o que o Auxílio deveria evitar", diz ele.