Em um País que tem 14 milhões de desempregados e 19 milhões de pessoas passando fome, quem poderia ser contra o Auxílio Brasil, que vai substituir o Bolsa Família e o Auxílio Emergencial? Alinhado à estratégia do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de melhorar sua popularidade para concorrer à reeleição em 2022, o ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou o auxílio de R$ 400 até o final de 2022, mas desagradou o mercado quando informou que o dinheiro virá do descumprimento do teto de gastos.
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Você entende o que ele quer dizer e o que nós brasileiros temos a ver com isso? Pois então, foi assim: em 2016, o ex-presidente Michel Temer criou o teto de gastos, limitando o governo a não aumentar as despesas acima da inflação do ano anterior. Na prática, é uma medida para evitar a gastança pública, para segurar as rédeas e evitar que se saia torrando recursos ilimitadamente. O mecanismo começou a valer em 2017.
"O teto foi uma grande conquista para o Brasil do ponto de vista fiscal. Desde 1988, o País registrava um crescimento da despesa pública bem acima da inflação e isso trazia desequilíbrio para a economia como nos juros, no mercado de trabalho e no PIB. Está claro que a convicção de Bolsonaro não é social, é eleitoral. Ele está no modo desespero. A CPI da Covid apontou muitos problemas da sua gestão no combate à pandemia e ele está recorrendo ao populismo fiscal, assim como fizeram outros presidentes. Ninguém se coloca contra uma política de transferência de renda em um País como o Brasil, mas é preciso avaliar como será feita", alerta o economista e sócio-diretor da Ceplan Consultoria, Jorge Jatobá.
Pagar o Auxílio Brasil descumprindo o teto de gastos pode significar descontrole da inflação (já alta), aumento do desemprego (hoje em níveis históricos), pressionar uma alta dos juros altos, derrubar o PIB e - com todos esses fatores juntos -, descambar em uma recessão. Ex-senador pelo Cidadania, o professor Cristóvão Buarque comentou o tema nesta quinta-feira (21), durante o Passando a Limpo, na Rádio Jornal, com Geraldo Freire.
"O Brasil se acostumou ao longo da sua história a não ter limites nem para destruir florestas nem para torrar dinheiro do Tesouro (Nacional). A gente está descobrindo que a Amazônia tem limite e o gasto público também. Esse tema trouxe duas questões importantes para a educação do brasileiro: a percepção da pobreza que nós temos, que precisa ser ajudada, e que é preciso ter limite de gastos", observa.
POBREZA VAI PERSISTIR
Ao invés de descumprir o teto de gastos, os economistas defendem que os recursos para provar o Auxílio Brasil venham de outras fontes, mas seria necessário que o governo Federal batesse de frente com setores poderosos da atividade econômica.
"O pagamento poderia vir dos subsídios tributários, por exemplo, mas mexeria com os interesses corporativos dos empresários. A reforma administrativa, que não foi feita como deveria, também seria uma alternativa para cortar gastos e permitir uma folga no orçamento. No caso do remanejamento de recursos dos benefícios tributárias, precisaria da decisão do Congresso para realocar. As emendas parlamentares serão outra alternativa e a reforma tributária, que fizeram apenas um remendo e não avançou, também seria outra saída", defende Jatobá.
Já Buarque diz que também poderia buscar recursos do fundo partidário e das emendas parlamentares.
transitória até o final de 2022. "O governo está buscando a saída mais fácil furando o teto de gastos, mas isso terá consequências para toda a população, inclusive quem vai receber o Auxílio Brasil. Com o aumento da inflação e dos juros, a pessoa vai receber R$ 400 e na mesma hora o auxílio só vai valer R$ 390. No final do ano vai valer R$ 300, com os recursos sendo corroídos pela inflação", observa.
SERÁ TEMPORÁRIO OU RECORRENTE?
O professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e consultor de empresas, Ecio Costa, pontua que a medida poderá desacreditar o governo. Tanto que, na quinta-feira (21), vários integrantes do alto escalão do Tesouro Nacional pediram exoneração. "Esse furo no teto será temporário ou vai virar bagunça, acontecendo a cada momento que o governo considerar conveniente?", questiona.
O economista acredita que as duas alternativas oferecidas pelo governo vai gerar de desconfiança de toda forma. Paulo Guedes fala em uma permissão temporária para deixar de fora do teto o gasto de R$ 30 bilhões com o Auxílio Brasil de R$ 400, que começaria a vigorar em novembro deste ano e se estenderia até dezembro de 2022. Outra alternativa seria antecipar a revisão do teto de gastos, que só estava prevista para 2026.
"Aumentar o valor do Auxílio para R$ 400 e passar a beneficiar de 15 milhões para 17 milhões de pessoas é até pouco. Mas o Congresso ainda pode aumentar esse valor. Sabemos que a população precisa do Auxílio, mas sabemos que ele vai retroalimentar a inflação, os juros e a queda do PIB no longo prazo, gerando mais desemprego e mais pobreza, que é o que o Auxílio deveria evitar", diz.
MERCADO EM POLVOROSA
O mercado também reagiu muito mal à proposta do governo de respeitar o teto de gastos para pagar o Auxílio Brasil. "A relação dívida-PIB já vinha numa crescente faz tempo e se agravou com a pandemia. O mercado vê tudo isso com péssimos olhos, comparando a relação dívida-PIB do Brasil com outros países dos BRICs. Além disso, o mercado precifica um calote com relação aos títulos públicos e os juros começam a aumentar", destaca o presidente da Multinvest Capital, Osvaldo Moraes.
Na avaliação dele, a inflação é preocupante caso se confirme o desrespeito ao teto de gastos. Se ela hoje está em escalada, poderá subir ainda mais. "O mercado reage, o dólar sobe e muitos produtos atrelados à moeda norte-americana sobe junto com ele, como margarina, trigo, açúcar, carnes", enumera.
A impressão se confirma em levantamento do Ibre/FGV, com base em relatório do FMI, apontando que a disparada dos preços foi mais intensa aqui do que no restante do mundo. A explicação, segundo economistas, está na desvalorização do real frente ao dólar devido à crise institucional e às incertezas fiscais. A expectativa é que a inflação brasileira fique maior do que a de 83% dos países do mundo.
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