Disputa

Fernando de Noronha: Advogado acredita que ação da União sobre domínio da ilha sequer deverá ter mérito analisado no STF

Especialista Antonio Ribeiro Júnior defende que ação é juridicamente inviável porque não se pode devolver à União um bem que a Constituição diz ser de Pernambuco desde 1988. Para mudar controle seria necessário revogar artigo da Constituição Federal

Imagem do autor
Cadastrado por

Adriana Guarda

Publicado em 29/03/2022 às 14:39 | Atualizado em 30/03/2022 às 20:29
Notícia
X

Em pleno ano eleitoral, a gestão do presidente Jair Bolsonaro decidiu iniciar mais um embate com o governo de Pernambuco, envolvendo o arquipélago de Fernando de Noronha. Dessa vez, a tensão aumentou, com a União ingressando na quinta-feira (24), com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para retomar o controle da ilha. Segundo especialistas, o pedido não tem um argumento jurídico consistente e poderá 'bater na porta do STF' e nem ser analisada. O Blog de Jamildo trouxe o assunto em primeira mão. 

A Advocacia Geral da União (AGU) apresentou uma longa argumentação de 57 páginas, pedindo o reconhecimento de que a ilha pertence à União. Para embasar o pedido, cita artigos da Constituição Federal que tratam da titularidade do governo Federal em casos da existência de ilhas fluviais. A ação também alega que o governo de Pernambuco estaria descumprindo o Termo de Cessão de Uso em Condições Especiais da ilha de Fernando de Noronha, assinado em 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) e o governador da época, Jarbas Vasconcelos. Pelo acordo, o Estado seria responsável em administrar e fazer a manutenção dos bens federais, mas que estaria descumprindo a obrigação. 

"Existe a chance de ação nem ser reconhecida no STF por falta de um argumento jurídico viável. Como se poderia, por meio de uma decisão judicial, dar um bem ao governo Federal, que a Constituição diz que é do Estado?", questiona o consultor jurídico, advogado em Direito Público, especialista em direito eleitoral, professor e sócio do escritório Herculano & Ribeiro Advocacia, Antonio Robeito Júnior. "Isso romperia com o pacto federativo, retirando a autonomia do Estado de gerir e administrar seus bens. Seria uma grave violação à descentralização administrativa, que é uma característica de pacto federativo", explica.  

O advogado alerta, ainda, que a ação do governo Federal não pede apenas que o contrato de cessão seja respeitado, como alguns têm interpretado, mas o reconhecimento de domínio da ilha pela União. "A gente ouve defesas de algumas pessoas de que a União não estaria buscando a propriedade de Noronha para si, mas isso não é verdade. Bo final da ação, na parte dos pedidos, a União requer que seja reconhecido o domínio da ilha, inclusive citando artigos que falam sobre os bens classificados como da união federal e incisos que falam das ilhas fluviais, na tentativa de enquadrar a ilha como bem Federal.

Direito previsto na Constituição

A favor de Pernambuco existe uma questão legal incontestável: o artigo 15 da Constituição, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que transferiu o território federal de Noronha para a propriedade  de Pernambuco, em 1988. "Para reconhecer o domínio da União sobre Noronha seria necessário revogar o artigo 15 da Constituição. Algo pouco viável", afirma Ribeiro Júnior.

"Foi uma escolha do legislador naquele momento fazer a transferência de Noronha para Pernambuco. Até porque a regra dos bens da União não é uma regra absoluta. A própria Constituição no artigo 26 inciso 2 fala que as ilhas fluviais serão bens da União quando não forem bens dos estados", complementa o advogado.

Tags

Autor