Da Estadão Conteúdo
Os legisladores da Rússia deram nesta quinta-feira, 24, sua aprovação final a um projeto de lei que expande as restrições às atividades vistas como "propaganda" aos direitos LGBTQIA+, em mais um passo de uma repressão de anos à comunidade do país.
O novo projeto de lei amplia a proibição do que as autoridades chamam de "propaganda de relações sexuais não tradicionais" para menores, estabelecida pela legislação apelidada de lei da "propaganda gay". A lei foi adotada pelo Kremlin em 2013 em um esforço para promover "valores tradicionais" na Rússia. Agora, os legisladores passaram a proibir a divulgação de tais informações para pessoas com 18 anos ou mais.
O projeto de lei foi aprovado na terceira e última leitura nesta quinta pela Duma, a câmara baixa do Parlamento. Ele irá para a câmara alta, o Conselho da Federação, e depois para o presidente Vladimir Putin, cuja assinatura lhe dará força legal.
"Qualquer propaganda de relações não tradicionais terá consequências", disse o presidente da Duma, Viacheslav Volodin, nas redes sociais. Segundo ele, o projeto de lei "protegerá nossos filhos e o futuro do nosso país das trevas espalhadas pelos Estados Unidos e pela Europa".
O novo projeto de lei proíbe todos os livros de publicidade, mídia e recursos on-line, filmes e produções teatrais que contenham tal "propaganda", um conceito vagamente definido. A proibição de 2013 foi muitas vezes promulgada contra qualquer representação de uniões do mesmo sexo e usada como uma ferramenta para reprimir grupos e ativistas de direitos LGBTQIA+.
As infrações são puníveis com multas. Se cometidos por não residentes, podem levar à sua expulsão da Rússia. As multas variam de 100.000 a 2 milhões de rublos (R$ 8.800 e R$ 176.000). Para algumas violações, os estrangeiros podem enfrentar 15 dias de detenção antes da expulsão.
A Rússia proibiu explicitamente os casamentos entre pessoas do mesmo sexo em 2020 ao adotar emendas à Constituição do país que, entre outras coisas, estipulavam que "a instituição do casamento é a união entre um homem e uma mulher".
'Influência ocidental'
A Rússia tenta apresentar as relações LGBTQIA+ como um produto da influência ocidental e está endurecendo sua retórica, à medida que seu confronto com o Ocidente sobre o conflito na Ucrânia se intensifica. Durante anos, Vladimir Putin se colocou como a antítese dos valores liberais ocidentais. Essa retórica foi reforçada, desde que ele enviou tropas à Ucrânia em 24 de fevereiro, isolando Moscou e provocando uma repressão sem precedentes no país.
Dilia Gafurova, líder do Sfera, um grupo de direitos LGBTQIA+, considera especialmente "preocupante que o Estado diga que as pessoas LGBTQIA+ são uma invenção ocidental" e alertou sobre os possíveis efeitos de demonizar um grupo inteiro.
Segundo o site da Duma, a nova legislação proibiria "a venda de mercadorias, inclusive estrangeiras, que contenham informações proibidas". As autoridades também podem bloquear sites que contenham informações proibidas.
As produtoras de filmes russos e as editoras de livros temem que o projeto de lei resulte na proibição de clássicos como "Lolita", de Vladimir Nabokov. A Duma disse que "filmes que promovem tais relações não receberão certificado de distribuição".
A ativista Dilia Gafurova pediu às autoridades que não usem a comunidade LGBTQIA+ "como instrumento de confronto ideológico". "Nós apenas somos. Não há nada de errado conosco e nada que deva ser silenciado", afirmou.