Após fazer sua carreira nas sombras das prisões israelenses, onde passou 23 anos, Yahya Sinwar ascendeu para liderar o Hamas na Faixa de Gaza. Hoje, para Israel, é considerado "um homem morto".
O chefe do grupo islamista palestino, de 61 anos, é o idealizador do ataque de 7 de outubro, no qual os comandos do Hamas dispararam contra bases militares, kibutzs e um festival de música eletrônica em Israel, que neste dia sofreu a pior ofensiva contra civis desde sua criação em 1948.
De acordo com as autoridades israelenses, 1.200 pessoas morreram, incluindo mais de 300 militares, e cerca de 240 foram sequestradas. "A estratégia é dele, ele montou a operação", provavelmente em um ou dois anos, explica à AFP Leila Seurat, pesquisadora do Centro Árabe de Pesquisa e Estudos Políticos (CAREP, na sigla em francês), em Paris.
Ele "impôs seu próprio ritmo para mudar a relação de forças no terreno e pegou todos de surpresa", completou. Classificado como "rosto do diabo" e declarado um "homem morto" pelo Exército israelense, Sinwar não aparece em público desde outubro.
"Ele é o homem de segurança por excelência" que, com o "carisma de um líder", "toma decisões com grande calma", disse à AFP Abu Abdallah, ex-prisioneiro do Hamas, em 2017, quando Sinwar assumiu o poder do grupo islamista.
Radical e pragmático
Nascido em um campo de refugiados em Khan Yunis (sul), juntou-se ao recém-fundado Hamas em 1987, ano da Primeira Intifada (levante contra a ocupação israelense). Aos 25 anos, liderou uma unidade de inteligência do grupo islamista que punia "colaboradores", os palestinos condenados por espionagem para Israel.
Em 1988, fundou o Majd, serviço de segurança interna do Hamas. Ao ser preso no ano seguinte, se consolidou como líder dos detentos. Condenado diversas vezes à prisão perpétua, foi libertado em 2011 juntamente com 1.000 reclusos liberados por Israel em troca do soldado Gilad Shalit, que foi refém do Hamas por cinco anos.
Sinwar viu Israel eliminar seus mentores, como o xeque Ahmed Yassin e Salah Shehade, fundador das Brigadas Ezzedin al Qassam, o braço armado do Hamas. Em 2015, foi adicionado à lista de "terroristas internacionais" dos EUA, ano em que é alvo de múltiplas tentativas de homicídio.
Ele foi eleito líder do Hamas na Faixa de Gaza em 2017, impulsionado pela estratégia "radical no âmbito militar e pragmático na esfera política", analisa Seurat. "Não é a favor da força pela força, mas sim da força para empurrar [os israelenses] para a negociação", completou a especialista.
Estrangulado "com kufiya"
A imprensa israelense publicou trechos de seus interrogatórios, nos quais diz ter sequestrado um traidor. "Nós o levamos para o cemitério de Khan Yunis, coloquei-o em uma cova e o estrangulei com uma kufiya (lenço palestino). Tenho certeza de que ele sabia que merecia morrer", conta.
Na esfera política, o líder do movimento islamista sonha com um Estado palestino que reúna todos os territórios ocupados: a Faixa de Gaza, atualmente governada pelo Hamas no sul; Cisjordânia, onde o Fatah de Mahmoud Abbas controla áreas inteiras no norte; e Jerusalém Oriental.
"Ele fez saber que puniria quem tentasse impedir a reconciliação com o Fatah" recorda o Conselho Europeu de Relações Exteriores. Enquanto seu antecessor incentivou uma face mais moderada do grupo, Sinwar prefere colocar a questão palestina em primeiro plano através de meios mais violentos.
Relações entre Israel e os países árabes
Em 2018-2019, em um contexto de desinteresse global pela causa palestina, e de uma crescente normalização das relações entre Israel e os países árabes, ele incentiva as "Marchas de Retorno", confrontos ao longo da cerca de separação entre Gaza e Israel, que deixaram quase 300 mortos.
No conflito atual, o Exército israelense bombardeou de forma incessante a Faixa de Gaza como forma de represália, deixando cerca de 15.000 mortos, entre eles mais de 6.150 de menores, segundo o Ministério da Saúde do Hamas.
A troca de reféns israelenses no marco da trégua entre Israel e o Hamas, que neste momento privilegiou prisioneiros de Jerusalém Oriental e da Cisjordânia ocupada, fez com que a popularidade de Sinwar disparasse na Cisjordânia, onde diariamente é possível ver homenagens a ele.