Bolsonaro: o populismo fiscal

O sistema político disforme, frustrações, descrença nas instituições da democracia liberal, uma sociedade fragmentada pela polarização odienta, foi o campo fértil para eleger um presidente populista, autoritário e gestado no ventre do corporativismo
GUSTAVO KRAUSE
Publicado em 13/08/2020 às 9:43
De fato, Bolsonaro não governou. Perdeu popularidade, sem que houvesse fuga dos bolsonaristas de raiz Foto: EVARISTO SA/AFP


O Brasil é um país prisioneiro e quatro “ismos” perversos.

O autoritarismo tem suas raízes na sociedade escravocrata e continua presente no cotidiano brasileiro simbolizada pela boçalidade das “carteiradas” e pela discriminação racial.

O estatismo. Esta é uma doença cuja origem está na composição da esquadra “cabralina”: a nobreza (mamando nas tetas do reino), os militares e o clero providos pelo dinheiro público. Todos, funcionários públicos. Mãos e roupas de seda. Empreender e trabalhar eram desonras. A plebe suava sangue. Este relação enfermiça tem raízes psicanalíticas.

O patrimonialismo. Weber e Raimundo Faoro estudam em profundidade este fenômeno que alimenta a praga da corrupção, do clientelismo e do cinismo, sem limites, do corporativismo. A fórmula é simples: mistura o público com o privado e aí nascem os estamentos burocráticos e o capitalismo de compadrio. Governantes, castas, “empresários” celebram churrascos e banquetes às custas do Erário Público.

O populismo. Em síntese o Brasil é um país iliberal. Os saltos econômicos foram dados a partir de uma “modernização conservadora”, financiada majoritariamente pelo recursos públicos, tendo o Estado como propulsor do nacional-desenvolvimentismo.

Hoje, o sistema político disforme, frustrações, descrença nas instituições da democracia liberal, uma sociedade fragmentada pela polarização odienta, foi o campo fértil para eleger um presidente populista, autoritário e gestado no ventre do corporativismo.

Fenômeno! Não tinha projeto de governo muito menos de nação e fez funcionar o mantra “sou contra tudo que está aí”, menos, menos é o que dizem as articulações com o “centrão”. E na agenda ultraconservadora dos costumes manteve-se fiel aos seus (pre)conceitos, o que seria aceitável, se não declarasse inimigos os que divergissem de suas ideias.

Aparentemente, as escolhas de Moro e Paulo Guedes pareciam ratificar dois pilares do governo: o combate ao crime organizado e à corrupção e uma proposta ultraliberal da qual não tinha a menor noção, traduzida no esperança do slogan “Mais Brasil e menos Brasília”.

Certamente não imaginava a complexidade do desafio de governar. Ainda assim, emplacou uma improvável, mas amadurecida Reforma Previdenciária, sem uma pitada de gosto populista ao mandar alterar a idade mínima para as mulheres. Valeu! Mas deixou equipe econômica assustada. Afinal, o martelo sobre o assunto já fora batido.

Para dar vazão à comunicação governamental, usou o gogó das redes sociais. Já tinha dado certo. Uma festa para a imprensa. Deixou claro os inimigos reais e imaginários e no ritual matinal do “café com sal” fez a festa da mídia. Cada palavra um “flash”; cada sentença uma manchete. E o desenho claro do conflito de “crises” quase cotidianas.

De fato, não governou. Perdeu popularidade, sem que houvesse fuga dos bolsonaristas de raiz. Manteve em momentos difíceis uma avaliação entre 25 a 30% de apoio. E as reformas estruturais paradas. O crescimento PIB, ano passado, foi medíocre mas a economia dava mostras de lenta recuperação. Aí vem a tragédia da pandemia e o drama de uma politização inacreditável: vida versus mote na questão da quarentena; ciência às escuras versus a terapia mágica receitada pelo Presidente, a cloroquina salva!

A equipe vai se desfazendo. A eleição de 2022 dita os comportamentos presidenciais. Cabeças rolam. Assessores qualificados entregam o boné. Não há bom governo sem que o Presidente dite os rumos. O “Posto Ipiranga” era uma salvaguarda para a ignorância econômica.

Pois bem, para evitar uma convulsão, criaram-se, acertadamente, vários mecanismos de proteção econômica social, entre eles, o auxílio emergencial para os mais carentes e os 34 milhões de “brasileiros invisíveis”, suportado por um “orçamento de guerra”.

Bingo! O Presidente encontrou a pedra de toque do mais perigoso e danoso populismo: o populismo fiscal. O curioso é que rede de proteção social da renda mínima, do imposto de renda negativo ou do “Renda Brasil”, como política pública permanente, é criação de mentes liberais: John Stuart Mill (século XIX) e Milton Friedman (século XX) que estão dando voltas no túmulo porque, concedido de forma aleatória e compensatória é um desastre para as contas públicas. Tudo muito simples. Privatização, desestatização, reforma administrativa reforma tributária? Tudo muito complicado. Salim Mattar, Rubens Novaes, Mansueto e outros deram no pé. Os “ismos” estão ganhando a parada. Paulo Guedes resiste. Até quando?

O Presidente descobriu o “BOLSANÁRIO”, o mecanismo perverso e eleitoralmente eficaz para a eleição de 2022, se uma pedra, entre as muitas mexidas, não caia na cabeça do Presidente.

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