Por José Maria da Nóbrega e Ricardo Guedes
O alagamento é responsável por mais de 44% de todos os desastres naturais registrados entre 2000 e 2019. Um dos fatores para este fenômeno é o crescimento desordenado das grandes cidades sem o devido planejamento. Com uma urbanização tipicamente de periferização e de metropolização, acompanhados pelo alto grau de informalidade, baixa qualidade ambiental, por desigualdades socioespaciais, bem como dinâmicas de exclusão e segregação socioespacial.
Com essa caracterização urbana, aliada a falta de gestão e planejamento das instituições municipais, cada vez mais esses eventos serão comuns. A desestruturação afeta toda a cidade e os recursos hídricos, mudando os caminhos dos córregos, rios e até lagos, aterrando mananciais, resultando em mudança da topografia do local.
Outro fator é a impermeabilização do solo causada pela terraplanagem e os demais impactos não planejados, como a construção das ruas sem o devido procedimento formal, as drenagens pluviais direcionadas a pontos únicos, além dos constantes descartes de materiais no meio ambiente o que ocasiona entupimentos, corroborando ainda mais para os devastadores alagamentos.
Muitos estudos têm sido feitos sobre as consequências e soluções para esses eventos. Essa questão é estudada por várias frentes de trabalho no mundo, com os resultados das pesquisas sendo publicados em revistas e jornais no mundo todo. Soluções existem, mas falta a gestão pública se basear em tais estudos.
Segundo o Plano Diretor de Drenagem e Manejo de Águas Pluviais da Cidade do Recife (PDDR da EMLUB), em 2015 a cidade tinha cerca de 160 pontos críticos de alagamento em suas vias urbanas.
E mesmo com esse excesso de água nas vias, estudos comprovam que os aquíferos da região metropolitana do Recife estão sofrendo um abaixamento em seus níveis, o que demonstra o que o grande grau de impermeabilização das cidades pode provocar.
Com a impermeabilização, a água que deveria se infiltrar no solo e chegar nos aquíferos é direcionada para outro lugar, contribuindo para o alagamento e diminuindo o nível de água dos aquíferos. O desabastecimento do aquífero é provocada pela falta de infiltração do solo. Existem muitas cidades sofrendo com esse desabastecimento do aquífero no mundo e as consequências para cidades costeiras são ainda maiores.
Solução para esses efeitos já está sendo colocada em prática e são comumente chamadas de técnicas compensatórias. Uma delas é a técnica de Desenvolvimento de Baixo Impacto na qual há uma abordagem da gestão pluvial ecologicamente viável, favorecendo o menor impacto e utilizando-se da natureza para ser a infraestrutura de drenagem das chuvas.
Para que se consiga utilizar soluções alternativas, é necessário que se mude a cultura construtiva, em que sejam utilizados os pavimentos porosos, drenagem por trincheiras de valas, com poços que possam ter infiltração, mais reservatórios de detenção com sistema de infiltração, tanto subterrâneos como de superfícies, etc. Falta gestão pública dos recursos hídricos, falta responsividade dos atores políticos, dos governos.
José Maria Nóbrega, doutor em Ciência Política pela UFPE. Ricardo Guedes, engenheiro mecânico, doutorando em Engenharia Civil pela UFPE