Sempre que os números do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) relativos aos cursos de licenciatura são divulgados, revelam como ainda são frágeis as políticas públicas de educação destinadas à formação de professores.
Aqui se inclui o enfrentamento da baixíssima atratividade pela carreira do magistério (apenas 2% dos jovens desejam ser professores no Brasil – quadro muito diferente do de países desenvolvidos), passando pelas precárias condições de trabalho na maioria das escolas públicas e por uma formação muito desvinculada da realidade do chão de escola (muita teoria e pouca prática).
Isso sem falar na fragmentação curricular dessa formação, ou seja: as faculdades de educação, em geral, não dialogam com as licenciaturas das áreas específicas; muitas vezes, o professor até domina o conteúdo, mas não sabe como ensiná-lo.
Hoje, no Brasil, as licenciaturas são um híbrido desarticulado entre os bacharelados de uma área específica e as disciplinas pedagógicas. Os dados do Enade revelam a baixíssima qualidade desses cursos, especialmente os da modalidade do ensino a distância (EaD). Além disso, constata-se que boa parte dos ingressantes chegam com muitos déficits de aprendizagens. Sem resolver esses imbróglios, não vamos solucionar o problema da qualidade da Educação Básica em nosso país.
O ministro da Educação Camilo Santana criou um grupo de trabalho (GT) para efetuar recomendações a respeito do que é preciso fazer para reverter essa situação. Nada contra essa iniciativa, mas já sabemos o que é preciso fazer, e não é de agora. O que está faltando mesmo é atitude política para mudar – não se faz omelete sem quebrar ovos!
Como relator das resoluções da Base Nacional Curricular da Formação Inicial e Continuada de Professores no âmbito do Conselho Nacional de Educação (CNE), que estão vigentes em nosso país (mas ainda não foram implementadas pelo MEC),gostaria de trazer algumas sugestões, na perspectiva de contribuir com esse GT.
Ou se cria um espaço institucional nas universidades destinado exclusivamente à formação de professores que aglutine aqueles que de fato querem dedicar-se ao tema, trazendo também professores inspiradores que estão atuando na Educação Básica, ou não vamos avançar. Sem isso, acho muito difícil romper com a atual fragmentação curricular e com o hiato que separa as universidades das escolas públicas.
É preciso criar um sólido programa de atratividade para estudantes que ainda estão no Ensino Médio para que optem pela carreira do magistério. Nesse programa caberia a institucionalização de bolsas de Pré-Pibid – o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) é um exitoso programa de iniciação à docência para estudantes que cursam licenciaturas em nosso país. Os alunos do Pré-Pibid estariam vinculados ao Pibid da sua futura área de atuação, e assim já se iriam engajando em seu futuro curso universitário.
É preciso criar o que estou chamando de um Fies (Financiamento ao Estudante do Ensino Superior)de qualidade para financiar estudantes em cursos presenciais inovadores de universidades particulares que não conseguem concorrer com os famigerados cursos de EaD de 99 reais!
Por fim, as universidades precisam estar mais abertas às mudanças que estão acontecendo no mundo do trabalho, e isso inclui os cursos de formação de professores. Como dizia o professor Richard Hamming – matemático americano já falecido–, os professores deveriam preparar o aluno para o futuro do aluno, não para o passado do professor.
Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)