A quarta-feira divide a semana de trabalho no meio e, até por isso, é o dia de mais intensas atividades. Nos dois primeiros dias, o trabalho começa tendo que vencer a poderosa inércia acumulada no final de semana. A segunda-feira, então, carrega duas bolas de ferro nas pernas do cidadão, que as vai deixando pelo caminho apenas quando o dia já vai terminando, se liberando um pouco da inércia. De modo que, na terça, já se produz um pouco mais, cabeça e músculos soltos, mas ainda com passos lentos, olhando para frente e vendo três dias ainda de muitos compromissos. A quarta-feira é o ponto alto da semana, o cidadão já pode olhar para trás sentindo que já ultrapassou dois quintos da labuta semanal. E, quando olha para frente, já começa a perceber que falta pouco, o que leva a ampliar a agenda e acelerar as atividades. “Amanhã já é quinta e, logo depois, sextou!”.
Mas a quarta-feira é também um dia mais odiado do ano, a quarta-feira tão ingrata para os carnavalescos, que chega tão depressa só pra contrariar, para encerrar os dias mais alegres e livres do ano, até porque, a segunda e a terça-feira foram de gesta, de pura loucura, seguindo ao sábado e ao domingo, quatro dias que são bruscamente interrompidos. Por quem? Precisamente pela quarta-feira. Felizmente, nem sequer precisam vencer a inércia neste dia, porque é mesmo um dia de preguiça, de ressaca e das deliciosas lembranças do carnaval.
A quarta-feira é também um dia muito egoísta. Quando um feriado cai numa quarta-feira, não se permite imprensar, ampliando a folga para os dias vizinhos. Não, está muito longe ainda do sábado, três dias na frente e do domingo, três dias atrás. Muito diferente da terça-feira que, generosamente, amplia o feriado para o dia anterior, a segunda da inércia se transformando num dia de ócio. O mesmo faz a quinta-feira, empurra o seu feriado para a frente e inclui a sexta-feira nos prazeres do far-niente. É verdade que a sexta-feira não costuma ser mais um dia de trabalho intenso, pelo menos para os profissionais liberais, já que as agendas e as atividades foram concentradas nos dois dias anteriores. Os melhores feriados são mesmo os que caem na terça-feira, quatro dias sem trabalho é a glória, mais ainda, para alguns profissionais liberais que já começam a desacelerar na tarde da sexta-feira anterior e só volta, com uma inércia agigantada, na quarta-feira, logo ela.
Não deve existir uma medida da produtividade do trabalho ao longo dos cinco dias da semana. Mas, tudo indica que é a quarta-feira, este dia tão ingrato e egoísta, que salva a economia brasileira, quando o ritmo de produção alcança o ponto mais alto, vencida a inércia dos primeiros dias de trabalho e antes que comece a desaceleração que prepara o final-de-semana. Além do mais, mesmo quando coincide com um feriado, quarta-feira, chata, rigorosa, disciplinada, tem o cuidado de evitar a propagação da preguiça e do ócio para os dias vizinhos.
Por isso, este dia tão ingrato, tão egoísta, quase perverso com o carnavalesco e com os trabalhadores, merece a gratidão dos brasileiros. E nele que se gera parte da riqueza nacional para gastar no carnaval, nos feriados, principalmente, nos longos feriados imprensados. Viva a quarta-feira. Tá certo, menos a quarta-feira de cinzas.
Sérgio C. Buarque, economista