O mais recente relatório produzido pela Dados para um Debate Democrático na Educação (D3E) traz uma visão contemporânea da educação profissional no Brasil, que contou com a participação de especialistas renomados nessa área. Aqui, em particular, gostaria de citar os professores Francisco Cordão e Amin Aur, que muito me ajudaram nos pareceres e resoluções que produzi ao longo de minha jornada no Conselho Nacional de Educação (CNE).
Penso que são (ainda) muito poucos aqueles que não conseguem enxergar a importância da educação técnica profissionalizante para a inserção qualificada de jovens no mundo do trabalho e seu papel para o crescimento econômico do Brasil.
As pesquisas mostram que os trabalhadores com formação técnica ganham, em média, 32% a mais do que aqueles com ensino médio convencional entre os indivíduos de 24 a 65 anos de idade.
A taxa de desemprego, por sua vez, para os que têm tal formação técnica é 3% menor do que entre aqueles com o ensino médio convencional. Outra informação importante vem do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), segundo a qual trabalhadores que concluíram o ensino técnico desfrutam de salários até 24,9% maiores em comparação com aqueles que não seguiram essa trajetória educacional.
Alguns estudos também revelam o enorme impacto da modalidade do ensino técnico profissionalizante no Produto Interno Bruto (PIB). Um recente estudo do Insper revelou que o PIB brasileiro pode aumentar até 2,32% caso o país consiga triplicar o número de jovens matriculados no ensino técnico. O crescimento projetado resulta do aumento da empregabilidade e maiores salários de quem tem essa qualificação profissional.
A pergunta que fazemos é: porque, no Brasil, essa modalidade ainda é tão pouco procurada pelos jovens e suas famílias, apesar de todos esses resultados?
Para se ter uma ideia, apenas 9% dos jovens que cursam o ensino médio no Brasil estão matriculados em algum curso técnico, enquanto a média nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 38%.
Em países como Alemanha, Áustria e Suíça, esse percentual é superior a 50%. Talvez a resposta esteja na origem da criação dessa modalidade de ensino no Brasil, em 1909, quando foram fundadas as chamadas Escolas de Aprendizes, e que, de alguma maneira, ainda se perpetua na cabeça das pessoas.
Como dizem os autores do trabalho em tela, intitulado Educação profissional no Brasil contemporâneo: ampliação do acesso e valorização, citando o decreto que instituiu essas escolas, havia em seu surgimento um viés assistencialista e até policialesco: “Que para isso se torna necessário, não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensável preparo technico e intellectual [sic], como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastará da ociosidade ignorante, escola do vício e do crime”.
Mas o país começa a dar demonstrações de que esse jogo pode mudar e a educação profissional pode ganhar, enfim, a devida importância retratada pelo interesse dos jovens, independentemente de sua classe social.
Isso se revela não só no Novo Ensino Médio, que traz a oportunidade de os jovens cursarem essa última etapa da educação básica mediante o ensino técnico profissionalizante, mas também pela recente proposta do governo federal de trocar impostos que deveriam ser pagos pelos estados por ampliação de vagas em cursos técnicos profissionalizantes. Para mim, um ponto importante é alinhar esses esforços com as cadeias produtivas locais – uma aliança entre oferta e demanda para que efetivamente haja a empregabilidade dos jovens.
Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE.