A chamada "creator economy" na ótica jurídica
Disse certa feita George Bernard Shaw: "Liberdade significa responsabilidade. Por isso tanta gente sente medo dela". Sobre jornalismo.....
No ambiente da comunicação, mormente no jornalismo, espera-se dos seus profissionais que sejam conscientes de transmitir ao público informações claras, verídicas, e que prestigiem o interesse coletivo, respeitando a privacidade, a intimidade, a honra e a imagem alheias. A responsabilidade da comunicação é do comunicador, donde se extrai a máxima: se o outro não entende o que você fala, a culpa é sua, não do outro.
Quando se coloca na berlinda o fenômeno cultural dos "influenciadores digitais", cujo crescimento vem sendo meteórico, chegando a ser visto dito fenômeno como desafiador ao jornalismo convencional, e não mais como simples passatempo da juventude sedenta por visibilidade na internet, passando a se converter em um negócio multibilionário, é de se aplicar o mesmo raciocínio. O influenciador, afinal, não é apenas uma celebridade, é um comunicador.
No plano jurídico, o tema se projeta sobre a teoria das responsabilidades, quer na esfera cível, seja na órbita criminal, por se tratar de uma atividade remunerada, que propicia algum nível de risco à coletividade (a partir do "gatilho" da má comunicação).
O influenciador digital promove, de modo oneroso, uma relação de intermediação com os seguidores ao anunciar serviços e produtos. A amplitude que é capaz de reunir impõe, naturalmente, balizas, dada a vulnerabilidade intrínseca ao consumidor. Daí porque não pode, por exemplo, glorificar o jogo de azar como caminho fácil para o sucesso financeiro, e sim compreender que tais jogos tendem a proporcionar um ciclo de comportamento compulsivo, arrastando as pessoas para problemas graves como estresse constante, distúrbios do sono, distanciamento familiar, isolamento social e tensão financeira.
Sendo o influenciador um "fornecedor por equiparação" na dinâmica própria com os seus seguidores, nada mais óbvio senão vincular a essa atividade lucrativa a devida repercussão no que se refere ao conteúdo do que é anunciado. Mesmo sendo, como é, uma profissão nova, ainda em processo de regulamentação, isto não significa que o criador de conteúdo esteja isento de seguir as normas publicitárias e outras em vigor no País, inclusive, sob o prisma ético.
O desafio que se apresenta parte do pressuposto de que, mesmo sendo os jogos de azar proibidos por aqui, se os domínios de determinadas plataformas estão abrigados em Países que autorizam e regulamentam a exploração da atividade, cabe ao legislador brasileiro prevenir e reprimir a utilização de cassinos on line para conferir aparência lícita a dinheiro sujo e aos influenciadores que se qualifiquem para que a sua atuação se profissionalize paulatinamente.
O Brasil possui mais de meio milhão de influenciadores digitais. É vice-líder de ranking nessa categoria, atrás apenas dos EUA. Existe um mercado multibilionário que torna imperativo que se exija que tais pessoas assumam responsabilidade sobre o que anunciam, tanto quanto que procurem se cercar de
aconselhamento jurídico para que não aceitem propostas que os vinculem solidariamente por iniciativas dos anunciantes.
Sendo o influenciador pessoa pública que empresta credibilidade ao que comunica, nada mais lógico: não lhe é dado invocar a "creator economy", cuja base repousa no "marketing de conteúdo", como blindagem. O influenciador fala de pessoa para pessoa e não de uma marca para uma pessoa: nisso está o seu pulo do gato, como também pode estar seu calcanhar de Aquiles.
Vem a calhar o realce de Yheuriet Kalil: "O trabalho do influenciador tem muito a ver com liderar e ajudar o outro. Infelizmente nem todo criador de conteúdo pensa e age dessa forma. Todo influenciador é eternamente responsável por aquilo que compartilha, afinal, influência é a soma de conteúdos relevantes e atitudes responsáveis". Consequentemente, responsabilizar quem divulga não é censurar, nem perseguir, nem estigmatizar o sucesso, mas dar concretude ao comando constitucional: a vida social em harmonia é fruto da combinação simbiótica de deveres e direitos, ou vence o caos, o que a ninguém aproveita.]
Gustavo Henrique de Brito Alves Freire, advogado