A negligência contra os pernambucanos que sofrem com a desigualdade racial no estado já conta, ao menos, com um instrumento legal para ter os dias contados. “Que eles possam passar a ter vez, a ter voz e oportunidades”, afirmou a governadora Raquel Lyra, que sancionou esta semana o Estatuto da Igualdade Racial, documento já existente no plano federal e em outros estados brasileiros, finalmente chegando a Pernambuco. Um avanço que era aguardado há muitos anos, para respaldar o esforço institucional e direcionar políticas públicas em favor da população de pretos e pardos, que representa dois terços dos pernambucanos.
O governo estadual promove um passo histórico, e abre perspectivas de implementação de políticas específicas para a redução da miséria e a ampliação de oportunidades para essa parcela, formada em larga medida por excluídos e discriminados. São vítimas de violência, são os que mais morrem por armas de fogo, os que mais passam fome e buscam empregos, como reconheceu a governadora. No Brasil inteiro é assim, e em Pernambuco, também. Com o agravante do empobrecimento estadual nos últimos anos, levando mais gente negra para a miséria e a travessia de dificuldades.
A sanção do Estatuto visa garantir mais acesso à educação, saúde, cultura e empregos, além de reforçar a rede de proteção para os negros, combatendo ainda a intolerância racial. O projeto substitutivo que resultou no documento é de autoria da deputada Rosa Amorim, que destacou a importância da sanção para a implementação de políticas públicas antirracistas. É claro que a desigualdade racial não se corrige com um instrumento legal, mas a legitimação da luta contra a desigualdade ganha outro peso, e pode mobilizar ainda mais a opinião pública em favor das causas da inclusão e da melhoria da qualidade de vida do povo negro em Pernambuco.
O projeto de lei havia sido aprovado em maio na Assembleia Legislativa, e foi sancionado sem vetos por Raquel Lyra, em solenidade no Palácio do Campo das Princesas, ao lado da vice, Priscila Krause. Entre as diretrizes aprovadas, está a criação de cotas, o registro de casos de racismo e a implantação de medidas afirmativas em diversas áreas, incluindo o mercado de trabalho. O Estatuto da Igualdade Racial de Pernambuco tem 42 artigos. Na saúde, prevê a adoção de medidas para a redução de vulnerabilidades da população negra. Na educação, a ampliação do acesso aos cursos técnicos e universitários, no âmbito do Estado. Na cultura, o estímulo a produções do movimento negro, e a manifestações da população negra. Na segurança, a sistematização e divulgação de dados sobre violações de direitos humanos e homicídios.
O estatuto nacional foi sancionado há 13 anos, em 2010, e serve de base para os estatutos que se espalham pelas unidades da federação. Em mais de uma década de validação, no entanto, pouco se viu de efetiva conquista para a população negra, que continua sendo a mais aviltada e fragilizada em seus direitos, numa nação em que a desigualdade social, em notória escala, apresenta a questão da raça como causa estrutural a ser enfrentada, sem arrodeios.