Imagine se um novo governante resolvesse anunciar uma obra por dia, a cada dia de seu mandato, durante os quatro anos de gestão. A agenda semanal estaria preenchida com promessas de variados tamanhos, dirigidas para diversos públicos em diferentes localidades. Tal governante, pródigo em semear o futuro, garantiria a conclusão de todas as obras, uma por uma, mesmo se não soubesse de onde viria o dinheiro para tamanha soma de gastos. O presente, por sua vez, seria mais ocupado pelas possibilidades asseguradas, do que por soluções concretas para os problemas cotidianos da população. Ao invés disso, em contraponto à agenda de demandas coletivas acumuladas, o gestor ou a gestora proporcionaria espetáculos bem ajustados pela propaganda oficial, em ciclos repetidos a cada 24 horas, inclusive finais de semana. Desse modo, nem os cidadãos mais zelosos, nem a imprensa mais crítica, talvez sequer a oposição, poderiam reclamar de tão operoso governo!
Pois de acordo com o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE), Pernambuco possui uma lista de obras inacabadas que daria, até com folga, para um governante com a mania incontrolável de lançamento de projetos que demoram a sair do papel e das placas. A caricatura, no entanto, não exagera no prejuízo aos cofres públicos e no atraso para os pernambucanos. O TCE aponta que, em 2023, com dados de 2022, havia 1.504 obras paradas em todo o território estadual, a maioria delas de mobilidade urbana, num prejuízo de mais de R$ 1,8 bilhão. Para lembrar o caso mais gritante, os corredores viários para os ônibus BRT, na Região Metropolitana do Recife, já guardam uma década de atraso – deveriam ter ficado prontos para a Copa do Mundo de Futebol de 2014, no Brasil, quando uma enxurrada de promessas serviu para turbinar a expectativa política do evento. O fracasso da seleção canarinha, derrotada na goleada de 7 a 1 para a Alemanha, parece ter sido o prenúncio do fracasso na redenção da infraestrutura, associada à Copa, aqui e em outras partes do país.
O desperdício bilionário vem de contratos firmados pelo Estado (319) e pelos municípios (1.185). Do total de obras que jogaram dinheiro no lixo, 462 foram declaradas paralisadas pelos próprios gestores, e mais de mil apresentam sinais de abandono, com menos de 15% dos recursos aplicados. É improvável que essas mais de 1.500 obras não tenham sido anunciadas com destaque pela publicidade dos governos, levando a prejuízos ainda maiores para o bolso dos cidadãos – que é de onde vem o chamado dinheiro público. O pior é que fica por isso mesmo. Tanto em relação às obras, quanto às impacientes propagandas.
O órgão judiciário de controle está correto ao chamar a atenção para a importância do planejamento e da elaboração de projetos, para evitar o dinheiro perdido. Mas seria talvez mais válido – e efetivo – que surgisse, no arcabouço institucional brasileiro, legislação específica para coibir o abuso dos anúncios de obras sem recursos garantidos para sua finalização. Para que o governante hipotético do início deste texto não se torne, em breve, ultrajante realidade.