BRASIL

Desperdício de água é imoral

Estudo relativo a 2022 e divulgado esta semana ressalta a continuidade das perdas monumentais na distribuição do líquido mais precioso à vida

Imagem do autor
Cadastrado por

JC

Publicado em 07/06/2024 às 0:00
Notícia

Os dados sobre o que se derrama de água, no Brasil, que deveria ser destinada à população, não constituem novidade. Mas o que impressiona, cada vez mais, é a permanência de problemas conhecidos, sem que soluções sejam apresentadas, adotadas, defendidas e executadas, seja por parlamentares, integrantes do Judiciário ou governantes que demonstrem indignação com situações de claro e incisivo prejuízo coletivo. Como se não adiantasse mostrar o descabido, porque o descabido é tido como coisa natural, normalizada pela insensibilidade, pela omissão e pela incompetência. Eis o que parece ser o caso do histórico nível de desperdício de água em todo o território nacional.
De acordo com o Instituto Trata Brasil, os brasileiros deixaram de aproveitar 7 bilhões de metros cúbicos do mais precioso líquido para a vida, em apenas um ano, 2022. Como esse gigantesco vazamento vem de muitos anos seguidos, por décadas, a perda de água própria para o consumo acumula a imoralidade do descaso que se propaga como questão insolúvel. É o desperdício alçado à condição de existência própria, como se as tubulações rompidas, as falhas na distribuição, a falta de manutenção e de segurança nos equipamentos de distribuição fossem gerados por si mesmos, com vontade e autonomia para seguir negando o recurso hídrico aos cidadãos.
O volume de 7 bilhões de metros cúbicos de água perdida seria suficiente para abastecer, por exemplo, o estado do Rio Grande do Sul, durante nada menos que cinco anos. Vale recordar que, por causa das enchentes, mais de 900 mil gaúchos ficaram sem água potável, há poucas semanas. O índice de perda, na média nacional, foi de quase 38% em 2022, praticamente a mesma taxa de perda de 2018. Há estados em que a perda chega a 71% (Amapá) e outro em que não passa de 33% (Mato Grosso). Ainda estamos longe do que o próprio governo federal considera aceitável, que seria uma perda de 25%, vista em alguns países desenvolvidos. Melhor seria menos ainda – afinal, derramar um quarto da água distribuída no chão não deixa de ser desperdício.
O que se chama de insegurança hídrica, a população desabastecida conhece como sofrimento diário. Muita gente no Brasil não conta com acesso à água tratada – dezenas de milhões de pessoas. A perspectiva de enfrentamento das mudanças climáticas, por outro lado, faz com que as ondas de calor e os períodos de estiagem sejam cada vez mais prováveis, nos próximos anos. A tragédia no Sul mostrou que as chuvas intensas também podem ocasionar escassez de água. Se pudéssemos armazenar e distribuir alguns bilhões de metros cúbicos por ano, a segurança hídrica resultante de um menor desperdício poderia representar a garantia de um padrão de qualidade de vida para a população brasileira, mesmo em face da crise climática. O desperdício atual, que vem de longe, é imoral diante do presente e do futuro da humanidade. Precisamos, isto sim, economizar água, e não, desperdiçá-la.

Tags

Autor