Poluição sem medida
Aumento de queimadas no país piora a qualidade do ar nas cidades e torna necessária a implantação de medidas adotadas em outras partes do mundo
A demora na regulamentação das leis no Brasil poderia ser objeto de estudos frequentes e aprofundados. O ritual do aperfeiçoamento institucional passa por demandas setoriais, atravessa os obstáculos parlamentares e chega a virar lei – mas a regulamentação entra num vácuo onde nada previsto pela legislação acontece. Parece ser o caso, mais uma vez, da Política Nacional de Qualidade do Ar, sancionada pelo presidente da República este ano, mas que precisa ser regulamentada para sair do papel. Todos os discursos de apropriação política se esfumaçam, sem consequência, e soam como promessas ilusórias, quando as leis não servem para nada por falta de empenho dos legisladores – e também do governo que aprova as leis e deixa tudo ficar como estava antes.
Praticamente a metade dos estados brasileiros não dispõe de estações de monitoramento da qualidade do ar – algo que deveria ser impensável numa época em que a tecnologia permite o acompanhamento da vida, do ambiente e até da comunicação virtual dos indivíduos em tempo real e de modo intensivo. A medição da qualidade do ar que se respira precisa ser incorporada como direito dos cidadãos, além de elemento fundamental de orientação de políticas públicas, da saúde à economia. Se a poluição é detectada como alta, as pessoas podem ser instruídas a ficar em casa, ou sair às ruas com proteção diante do risco ambiental. Se ninguém sabe objetivamente a quantas anda a qualidade do ar, a população se prejudica, e os governos se eximem de cumprir com a sua responsabilidade.
Dos 12 estados que não contam com estações de monitoramento, cinco se localizam no Nordeste – Sergipe, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte e Piauí. E por incrível que pareça, unidades da federação nos quais as queimadas mais incidem, como Amazonas, Mato Grosso e Tocantins, também não possuem os medidores. Se isso atesta a deficiência na gestão dos estados, não poupa o governo federal que pretende se mostrar com destaque na atenção ao meio ambiente, incluindo o presidente Lula e a ministra Marina Silva. E ambos vêm sendo justificadamente criticados nas últimas semanas, por causa das dificuldades na gestão da crise climática que torra o Brasil.
Sem regras detalhadas para que as medições sejam obrigatórias, a qualidade do ar pode permanecer péssima, e piorar, sem que a gestão pública se disponha a adotar medidas de prevenção e regressão da poluição. O exemplo mais evidente é o controle das emissões de gases poluentes pelos veículos. De acordo com o Conselho Nacional de Meio Ambiente, apenas 5% da frota responde por metade da poluição emitida. Entre as ações aguardas do poder público, estão a descarbonização, a arborização e a preservação e ampliação de áreas verdes e mananciais. Quanto menor for a capacidade de informação a respeito do ambiente, maiores são as consequências para as populações, as cidades, os países e o planeta – como, aliás, a atual crise das queimadas no Brasil escancara.