Um grupo de cerca de 25 comerciantes informais, entre fiteiros, amoladores de faca, engraxates e chaveiros, realizou protesto na manhã desta terça-feira (28), em frente ao Mercado São José, na área central do Recife. Eles trabalhavam no entorno da Praça Dom Vital, e reclamam que a Diretoria Executiva de Controle Urbano do Recife (Dircon) retirou seus materiais da rua dois meses atrás, sem avisá-los, enquanto o comércio estava fechada por conta da pandemia do coronavírus.
O chaveiro Marcos Aurélio de Oliveira, de 52 anos, disse que, quando foi buscar seus pertences confiscados na sede da Dircon, encontrou apenas sua barraca, danificada. “Estava tudo jogado no chão. Tudo enferrujado, molhado da chuva. Não tinha nem como levar de volta”, contou. Os objetos que estavam dentro tinham desaparecido. “Quando cheguei lá, não tinha nada. Tudo sumido. Chave de fenda, furadeira.”
>> Prefeitura do Recife remove pontos de fiteiros no bairro de São José
>> O que mudou na paisagem do Recife durante a pandemia e você não viu
Marcos é chaveiro há aproximadamente 26 anos no bairro - ofício que herdou dos pais. “Estou com os documentos desde a época do meu pai, falecido, que trabalhava no Cais de Santa Rita”, falou. Perder o pouco que tinha foi um golpe duro para o homem. “Eu chorei, não vou mentir. Eu tinha tudo construído aqui, e não consegui (reaver) nada”, lamentou.
Ângela Maria do Nascimento, 54, também tem uma longa história no mercado. São pelo menos 37 anos como amoladora no local. Ela relatou que foi surpreendida pela ligação de uma colega avisando que as barracas estavam sendo removidas pela prefeitura. “Peguei um moto táxi e consegui retirar minhas mercadorias de dentro. Mas danificaram o fiteiro da gente”, denunciou.
Sem direito ao auxílio emergencial do Governo Federal e sem o sustento do comércio, Ângela teve dificuldade de cuidar da mãe acamada durante a pandemia. A trabalhadora reclama que a prefeitura entregou a cesta básica apenas para, tempos depois, retirá-los do local de trabalho. “Deram uma feira para nos enganar e tiraram o fiteiro da gente”, afirmou.
Como parte do projeto de revitalização do Largo do Mercado de São José, em andamento desde o ano passado, o comércio informal vêm sendo movida da rua para anexos espalhados no bairro - no Centro Comercial do Cais de Santa Rita e no Anexo do Mercado de São José. Ângela, no entanto, é contra a transferência para o Cais de Santa Rita. “Não tem como trabalhar lá. O pessoal (que foi movido para) lá está morrendo de fome. Ninguém vai comprar lá, não. É distante”, disse.
Ela ainda se queixa do tratamento por parte dos fiscais. Segundo a presidente da Associação de Trabalhadores Informais do Recife (APIR), Alessandra Fonseca, os trabalhadores vêm sendo alvos de intimidações. “A Dircon trata todo mundo mal, perseguindo algumas pessoas que precisam trabalhar. Simplesmente eles mandam: ou você guarda o amolador ou a gente confisca.”
Na tentativa de recuperarem a mercadoria, no prédio da Diretoria, os proprietários são recebidos com desdém, de acordo com a organizadora do ato. “Quando chega lá, o pessoal fica rindo. São pessoas analfabetas, tratadas como lixo, sem ninguém por eles”, declarou.
A APIR cobra um posicionamento do município. “Os fiteiros foram saqueados, e até hoje a prefeitura nunca conversou com a gente, nem para dizer que tinha um novo lugar. Simplesmente tiraram e acharam que a gente não ia fazer nada”, falou Alessandra. A Associação ainda pleiteia pela apresentação de um plano de retomada da atividade dos trabalhadores, que estão paradas desde então.
Neste dia de protesto, os manifestantes foram em caminhada até a sede da prefeitura, com apitos e cartazes.
Por meio de nota, a secretaria de Mobilidade e Controle Urbano do Recife (Semoc) falou que está "em discussão com a categoria para indicar novos locais de trabalho, sem que haja ônus à mobilidade da população", e que recebeu uma comissão neste terça para dar continuidade ao diálogo e achar uma "solução benéfica para os comerciantes e para a mobilidade da população."
A pasta ainda disse que notificou oficialmente os comerciantes informais em questão sobre a retirada das barracas "desde 2019, quando deu início à requalificação do entorno do Mercado de São José".