CIDADANIA

"Agora que usufruo da vida". As lições da terceira idade no Dia Internacional da Pessoa Idosa

Neste 1º de outubro, quando o Estatuto do Idoso completa 18 anos, vovôs e vovós mostram que como é possível viver bem na terceira idade em um país que ainda não garante todos os direitos previstos por lei para este grupo

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Katarina Moraes

Publicado em 01/10/2021 às 6:00
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Foi há pouco que a artesã Maria Auxiliadora Magalhães, a dona Zizi, como é conhecida, de 77 anos, começou a viver o que chama de “juventude”. Quando não está trabalhando com o que ama, sai junto aos amigos e se diverte. Duas vezes por semana, bate ponto na ginástica. Ela não se rende aos estereótipos normalmente atribuídos aos idosos, e leva uma vida agitada. E nesta sexta-feira, a comemoração também é dela. Pois no dia 1º de outubro de 2003 foi criado o Estatuto do Idoso, que visa a garantia de uma velhice saudável para os 37,7 milhões de brasileiros que estão na terceira idade atualmente, 18% da população total do país.

A lei sancionada há 18 anos pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) elencou direitos e garantias da pessoa idosa, além de criminalizar condutas violentas que são recorrentemente praticadas contra esse grupo, como maus-tratos, abandono e exposição da saúde física e psíquica ao perigo, segundo o especialista em Direitos Humanos, advogado e professor Esdras Peixoto. “A cobrança por políticas públicas, feita pelo Ministério Público, e as delegacias especializadas começaram a ser implantadas a partir dessa legislação, que é uma das mais avançadas do mundo”, elogiou o especialista.

“A vida do idoso é muito boa; ele tem a melhor idade. Não temos filhos para cuidar, os companheiros já estão aposentados e podemos usufruir da nossa juventude. Eu e meu marido somos muito ativos, temos hoje uma outra perspectiva de vida. Inclusive, sou muito elogiada por ser comunicativa e muito ativa, o que me orgulha”, contou. Zizi pratica ginástica e produz artesanato em projetos do Grupo JCPM, através do IJCPM e do RioMar Recife, como forma de ser financeiramente independente, já que não tem direito a aposentadoria.

ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
Zizi Magalhães e Ivani Belo, 71 anos, Artesã. Dia Internacional da pessoa Idosa. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
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Zizi Magalhães, 71 anos, Artesã. Dia Internacional da pessoa Idosa. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
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Ivani Belo e Zizi Magalhães, 71 anos, Artesã. Dia Internacional da pessoa Idosa. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM

A realidade dela é, inclusive, a de muitos outros idosos no país - ou seja, pessoas com mais de 60 anos, segundo definição da Organização Mundial de Saúde (OMS). Um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgado em fevereiro deste ano mostrou que dos 37,7 milhões de brasileiros idosos, 18,5% ainda trabalham - ou por escolha própria, ou por precisarem. Em 2020, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) informou que 70% dos 35 milhões de aposentados recebiam um salário mínimo por mês.

Por não estar inclusa no benefício, a autônoma Ivani Belo continua tendo uma “rotina trabalhosa”, como ela mesma elenca, aos 71 anos. Ela diz que tenta não pensar na velhice, apesar dos problemas cardíacos e a coluna sempre lembrá-la da idade que tem, e tenta seguir a vida com leveza. “Minha vida foi um aprendizado grande e continua sendo, porque nunca deixamos de aprender, e a vida também me ensina. Sempre fiz sacrifícios, mas nunca lamentei, porque gosto de lutar para vencer”, contou ela, que desde cedo achou na costura sua vocação.

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Ivani Belo, 71 anos, Artesã. Dia Internacional da pessoa Idosa. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
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Ivani Belo, 71 anos, Artesã. Dia Internacional da pessoa Idosa. - ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM

Já Osmar Amarante ensinou que nunca é hora de parar de sonhar. Foi aos 67 anos que ele concluiu o ensino superior no curso de Gestão Ambiental de uma faculdade particular. “Movido por meus sonhos e buscando mudar a minha realidade, ingressei na universidade logo que tive oportunidade. O que sempre me impulsionou foram meus sonhos, característica essa que ensinei aos meus filhos. Eu, Osmar, não acredito em destino. Creio que nós somos capazes de mudar o rumo de nossas vidas, batalhando e sem desistir”, explicou o funcionário público.

Assim como Osmar, outros idosos têm adiado cada vez mais a saída do mercado de trabalho, conforme Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua). De 2012 a 2018, o percentual de pessoas acima de 60 anos empregadas subiu de 5,9% para 7,2%. Na avaliação da psicóloga e professora universitária Jocely Burda, é essencial que as empresas se deem conta de que a diversidade de gerações dentro em uma companhia é algo saudável e gera maior produtividade. "Nossos idosos hoje são das gerações baby boomer e X. São pessoas, que no geral, têm mais disciplinas, são regradas e se sentem úteis ao passar seus conhecimentos e experiências."

Com o objetivo de valorizar e ajudar a quebrar estereótipos contra os mais velhos, o Grupo JCPM lança a campanha Dia Internacional da Pessoa Idosa simultaneamente no RioMar Recife e em outras três cidades, Fortaleza, Aracaju e Salvador. A mensagem central “Não tenha preconceito com o seu futuro” estará espalhada em pontos de grande circulação de pessoas nos shopping, com vídeo institucional que traz o assunto à reflexão.

“Dentro dos nossos debates sobre Inclusão e Diversidade, escolhemos temas que consideramos importantes para trabalhar nos empreendimentos ao longo do ano porque entendemos que os shoppings são locais também para despertarmos a sociedade e convidarmos as pessoas a refletirem. E é preciso pensar sobre as posições ocupadas por pessoas idosas, algo que vem se transformando ao longo das décadas”, reflete a Diretora de Desenvolvimento Social do Grupo, Lucia Pontes.

É preciso pensar sobre as posições ocupadas por pessoas idosas, algo que vem se transformando ao longo das décadas
Diretora de Desenvolvimento Social do Grupo JCPM, Lucia Pontes

Se a lei é considerada um avanço, por que idosos continuam a ser violentados?

As inspiradoras histórias de determinação e bem-estar contadas na reportagem infelizmente não são a realidade de todos os idosos. Em 2020, foram registradas 77,18 mil denúncias de violações de direitos humanos contra pessoas acima de 60 anos recebidas pelo canal telefônico Disque 100, disponibilizado pelo governo federal. No primeiro semestre de 2021, foram mais de 33,6 mil casos denunciados no Brasil. No mesmo período, o Centro Integrado de Atenção e Prevenção à Violência Contra a Pessoa Idosa (CIAPPI) de Pernambuco, vinculado à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SJDH), recebeu 559 denúncias e, a partir destas, foram identificadas o quantitativo de 1.449 violações.

Segundo a coordenadora do CIAPPI, Cibelle Almeida, o número foi acentuado devido às medidas de contenção contra a covid-19. “Os idosos estão mais dentro de casa com o agressor, que ficou desempregado ou teve o trabalho reduzido. Recebemos denúncias principalmente de maus-tratos, negligência e agressão física e psicológica, normalmente cometidas pelos próprios familiares", explicou. Cibelle ainda salientou que as estatísticas são subnotificadas, já que muitos idosos têm medo de denunciar, e pediu para que vizinhos estejam atentos a sinais de agressão e, caso haja, procurem o Centro.

Esdras Peixoto aponta que esses crimes continuam a acontecer porque o Estado ainda falha na aplicação da lei. “Como tudo que tem acontecido no Brasil de uns tempos para cá, tem havido bastante retrocesso também nessa questão. As pessoas voltaram a ter atitudes preconceituosas, de desleixo e de maus-tratos. E isso acontece também nas redes públicas e privadas de saúde, onde os idosos são vistos não como uma pessoa, mas como um fardo. O problema da legislação está na implementação pelo poder público e na falta de respeito por parte da sociedade civil e das empresas”, avaliou.

Essa não deve ser uma preocupação apenas de quem é idoso ou de quem tem entes mais velhos, mas de todos. Isso porque segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil mantém a tendência de envelhecimento da população. Em 2019, os idosos somavam 32,9 milhões de pessoas, 6 milhões a mais que as crianças de até 9 anos de idade. Naquele ano, os idosos representavam 15,7% da população, enquanto as crianças até 9 anos de idade respondiam por 12,8%. A estimativa do IBGE é que, em 2060, um em cada quatro brasileiros terá mais de 65 anos de idade, e a da sociedade é de que o cuidado com esse grupo de pessoas que será ainda mais amplo seja de fato efetivado.

"É preciso mais investimento em políticas sociais, maior presença de fiscalização do Ministério Público, mais incentivo à auto organização da sociedade civil para que ela entre nessa briga, construa associações e movimentos para defender os idosos, e principalmente que o mercado respeite o direito deles terem dignidade, saúde e assistência médica", pediu o advogado.

Canais para denúncias e informações

  • Disque 100 - Disque Direitos Humanos: 100
  • Centro Integrado de Atenção e Prevenção à Violência Contra a Pessoa Idosa (CIAPPI) -Telefone: (81) 3182-7649 e E-mail: [email protected]
  • Mais informações sobre os direitos da Pessoa Idosa – (81) 3182-7649

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É preciso pensar sobre as posições ocupadas por pessoas idosas, algo que vem se transformando ao longo das décadas

Diretora de Desenvolvimento Social do Grupo JCPM, Lucia Pontes

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