Em colaboração com Natália Ribeiro, da Rádio Jornal
Só após três pessoas serem feridas em menos de um mês, Pernambuco retomará o monitoramento de tubarões no litoral do Grande Recife, paralisado em novembro de 2014 - um trabalho que, por não ter sido continuado, custou vidas, amputações e traumas em vítimas do animal.
As pesquisas acontecerão na segunda fase do Projeto Megamar - idealizado pelo engenheiro de pesquisa e professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Fábio Hazin - que também liderou o extinto Projeto de Pesquisa e Monitoramento de Tubarões no Estado de Pernambuco (Protuba) e faleceu em junho de 2021 pela covid-19.
O projeto teve início em julho do mesmo ano, com o objetivo de estudar a megafauna - como tubarões, botos, barracudas, raias e tartarugas. Hoje, é coordenado pelo professor da UFRPE e engenheiro de pesca José Carlos Pacheco e supervisionado por Paulo Oliveira.
Segundo Paulo, a segunda fase depende apenas da conclusão de trâmites burocráticos para começar. A previsão, segundo ele, é que isso aconteça entre o final de março e o início de abril.
Antes dos incidentes, o estudo seria feito apenas no entorno do Porto, capitaneado em R$ 1,5 milhão pelo Porto de Suape. Agora, irão até Olinda, com um acréscimo de R$ 500 mil nos investimentos, dado pela Secretaria de Ciência e Tecnologia, através da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe).
“Suape já tinha o projeto Megamar contratado e a primeira fase já tinha sido executada. Fizemos a ampliação com aditivo contratual e remanejamento de recursos no âmbito da Facepe”, explicou a secretária de Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco (Semas), Ana Luiza Ferreira.
Desde a última semana, o Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit) deixou de ser de responsabilidade da Secretaria de Defesa Social (SDS-PE) e passou a ser comandado pela Semas.
MONITORAMENTO DE TUBARÕES EM PERNAMBUCO
Os tubarões serão monitorados por em torno de 30 receptores acústicos que serão levados por uma embarcação até o fundo do mar nos locais mais críticos da costa, segundo explicou Paulo Oliveira.
Ao mesmo tempo, serão feitas 24 expedições para capturar, marcar e então soltar novamente animais das espécies tigre, cabeça-chata e galha preta em uma zona mais distante das praias.
Os dispositivos vão detectar quando os tubarões se aproximarem a até 500 metros no entorno. Então, de tempos em tempos, os receptores serão retirados do mar, e terão seus dados baixados e analisados pelos pesquisadores.
Isso servirá para entender melhor a dinâmica dos animais, segundo o professor. “Assim, vamos saber se os tubarões que foram marcados e deixados mais longe da costa estão se reaproximando”, disse.
“É importante ressaltar que apesar de o monitoramento não estar em curso, o trabalho de educação está sendo feito”, complementou o especialista da UFRPE, que também pretende, através do Megamar, invasões do peixe-leão no Estado.
Nos últimos dias, têm sido substituídas e instaladas novas placas de sinalização que alertam sobre a presença de tubarões na faixa litorânea do Grande Recife e a intensificação do patrulhamento através de sobrevoos de helicóptero.
O Corpo de Bombeiros também alegou que irá iniciar o treinamento dos guarda-vidas municipais para aumentar o efetivo nas praias e disponibilizar pronto atendimento a possíveis vítimas de mordidas de tubarão.
TUBARÕES VOLTAM A ASSOMBRAR PERNAMBUCO
Com os três novos casos, o Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (CEMIT), contabiliza, agora, 77 ocorrências desde 1992, sendo 67 no continente e outras 10 no arquipélago de Fernando de Noronha.
Diante disso, em entrevista à Rádio Jornal, na manhã desta segunda-feira (13), o engenheiro de pesca Jonas Rodrigues, também da UFRPE, apontou que estamos “vivendo um novo momento extremamente preocupante para uso das praias do litoral pernambucano”.
Antes mesmo dos incidentes recentes, Jonas criticava a paralisação dos programas de pesquisas, que, segundo ele, foram responsáveis por reduzir os casos em 96% desde 1992 - um modelo de sucesso que foi estudado por países como Austrália e Estados Unidos.
“Tivemos um dos melhores resultados no mundo, com investimento de R$ 1 milhão por ano para desenvolver as atividades. Isso demonstra o quanto as ações, desenvolvidas a custo baixo, tiveram um grande resultado”, pontuou.
POR QUE TUBARÕES TÊM MORDIDO BANHISTAS EM PERNAMBUCO?
O geólogo Fábio Pedrosa, da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), pontuou que a problemática dos tubarões em Pernambuco representa uma conjunção de fatores. Entre eles, a topografia submarina da região, que possui um "canal natural" onde os animais ficam presos quando a maré abaixa.
Outro é a proximidade dos portos de Suape e do Recife. "Eles são predadores extraordinários, com olfato aguçadíssimo, então se aproveitam do rastro de lixo orgânico que vai sendo despejado pelos navios em suas rotas oceânicas”, explicou.
Segundo Jonas, foram descobertas as espécies de cerca de 15 tubarões envolvidos entre os casos. No continente, estiveram o tigre e o cabeça chata. Já em arquipélago de Fernando de Noronha, o tigre e o limão.
“São espécies com tamanho considerável e que podem portanto ofertar algum risco para seres humanos; inclusive por suas estratégias de predação, porque são animais de corpo de cadeia, que vão em busca de alimentação e têm agressividade elevada”, citou.
COMO EVITAR NOVOS INCIDENTES COM TUBARÃO?
No debate desta segunda, o coordenador do Instituto Praia Segura, Rômulo Bastos, defendeu novamente ações que não apenas evitem incidentes com tubarões, mas que também recuperem o ecossistema ao qual estão inseridos, como a recuperação do estoque pesqueiro que serve de alimentação para os animais.
“No nosso entendimento, o tubarão está sendo mensageiro da natureza para dizer que está tudo errado. Ele diz: tomem as providências para colocar a casa em ordem”, disse.
Ainda, pediu pelo o retorno dos testes de telas de proteção, contra a chegada de tubarões até a beira das praias, um projeto discutido desde 2006.
Elas permitiriam um “quadrado de proteção”, que impediria a entrada dos tubarões - sem machucá-los - ao mesmo tempo que permitiria os banhistas de curtirem a praia e os surfistas de praticar o esporte sem preocupações.
Entretanto, para Jonas, outras soluções e medidas devem ser tomadas como paliativo do problema do ponto de vista emergencial.
“O equipamento pode ser utilizado se bem testado e avaliado, porque passa a informação para a população de que aquele local está seguro. Mas, nesse momento, por não haver teste, não se pode atestar que esse equipamento vai ser eficaz”, afirmou.
A secretária da SEMAS garantiu que a ciência guiará as próximas decisões, que serão tomadas com base na avaliação técnica das universidades. “O papel do governo é unir todas as pontas para que a gente saia com as soluções.”
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