Prefeitura do Recife já era dona de parte do terreno "trocado" para construir Parque da Tamarineira
Documentos obtidos pelo JC mostram que o município já tinha ciência de que possuía pelo menos 25 mil m² dos 105 mil m² permutados com a Santa Casa de Misericórdia
A Prefeitura do Recife já era dona de cerca de 23% do terreno que ganhou da Santa Casa de Misericórdia para construção do Parque da Tamarineira, na Zona Norte da cidade, em troca de lotes no Antigo Aeroclube, no Pina, na Zona Sul. Documentos obtidos com exclusividade pelo JC mostram que o município já tinha ciência de que possuía pelo menos 25 mil m² dos 105 mil m² quando anunciou a suposta troca.
Mesmo assim, uma lei enviada pelo prefeito João Campos (PSB) e aprovada pela Câmara Municipal em outubro de 2023 autorizou a cessão do Sítio Tamarineira ao município, alegando que eram inteiramente da Santa Casa. Em troca, a instituição ligada à Arquidiocese de Olinda e Recife receberia seis lotes de 18 mil m² situados no futuro Parque Eduardo Campos, com a intenção de vendê-los para a iniciativa privada e quitar dívidas.
Os lotes do Pina foram avaliados em R$ 35 milhões, enquanto o imóvel da Tamarineira em R$ 38 milhões — o que, em tese, geraria um lucro de R$ 3 milhões a favor do município.
Contudo, ainda em 2020, uma mulher — que terá o nome preservado pela reportagem — entrou com uma ação de usucapião contra a Santa Casa para adquirir 25 mil m² desse terreno, que fica nas proximidades das avenidas Norte, Rosa e Silva e da Rua Cônego Barata. No processo, ela alegou que já o ocupava há anos e que havia feito diversas benfeitorias nele. A instituição religiosa, por sua vez, contestou o pedido.
Então, como de praxe que em qualquer processo do tipo, o município, o Estado de Pernambuco e União foram intimados para conferir se o terreno demandado não se tratava de área pública - já que, nesse caso, o usucapião não é oferecido. Então, em janeiro de 2023, o município respondeu que o terreno se encontra “totalmente inserido em área pública” e não edificante. Por isso, pediu a extinção da ação.
Sem que o imbróglio jurídico entre esses três entes — Santa Casa, a senhora citada acima e a Prefeitura — fosse resolvido, a permuta foi autorizada e divulgada com pompa. Atualmente, o caso está na Vara da Fazenda Pública da Capital, cuja última movimentação foi um pedido do juiz para que o município se manifestasse - o que ainda não aconteceu.
Por nota, a Santa Casa de Misericórdia informou que a área em questão, que está sendo reivindicada, segue sob disputa judicial e que não comentará processos que não transitaram em julgado.
Já a Prefeitura do Recife negou que o terreno seja público. Afirmou que está registrado em nome da Arquidiocese e que “há um processo judicial em curso, no qual se discute usucapião de duas áreas, de 24.437,47 m² e de 1.262,38 m². Apenas essa área menor é pública e está fora da área a ser permutada”.
MPPE CONTESTA PERMUTA
A permuta entre os terrenos tem sido contestada também pela Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo do Ministério Público de Pernambuco (MPPE). Em dezembro, ela recomendou que a alienação dos lotes no Pina fosse suspensa, a fim de destiná-los à construção de habitação de interesse social e equipamentos comunitários.
Após 20 dias do prazo de resposta, contudo, o município não respondeu. Ainda neste mês, a Promotoria deve promover uma audiência sobre o assunto. Ao JC, já adiantou que, caso a recomendação não seja seguida, pretende ingressar com uma ação judicial.
"Em razão do grande déficit habitacional do Recife, o poder público deveria destinar os 12 lotes, com área total de 3,8 hectares, para a construção de mais conjuntos habitacionais, além de equipamentos voltados à coletividade, como escolas, creches e praças, para benefício dos cidadãos que residem em comunidades do Pina, especialmente os que recebem auxílio-moradia", argumentou a promotora Fernanda da Nóbrega, no texto da recomendação.
Ainda, ela relembrou que o prefeito João Campos (PSB) aponta a falta de terrenos na cidade como um dificultador para a construção de habitações do tipo na cidade, que tem um déficit habitacional superior a 71 mil moradi