Quando o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva deixou a carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, em 8 de novembro do ano passado, lideranças partidárias avaliavam que, fora da prisão, ele poderia ajudar a organizar a oposição contra o presidente Jair Bolsonaro. Seis meses depois, porém, o petista não encontrou o protagonismo político que tinha no passado, mantém pouca interlocução com outros setores da oposição e praticamente não tem diálogo com segmentos da sociedade fora da esquerda.
Acostumado a tomar algumas das principais decisões do partido, Lula foi confrontado recentemente em uma escolha do PT em Pernambuco e não atuou para resolver impasse em torno da candidatura para a prefeitura de São Paulo.
"A libertação de Lula não despertou qualquer nova energia no partido", avalia o cientista político Carlos Melo, do Insper. "Lula preso tensionava muito mais com a política do Brasil do que agora", disse.
De novembro para cá, Lula não se reuniu nem com antigos aliados, como os presidentes do PDT, Carlos Lupi, e do PSB, Carlos Siqueira.
O ex-presidente José Sarney (MDB) e outros antigos parceiros políticos já reclamaram a interlocutores do que chamam de isolamento de Lula. Presidentes de centrais sindicais que não são ligadas ao PT também criticam a postura.
"Ele está bastante recluso, contido, acho até que por orientação dos advogados. Não está aquele Lula de antigamente", disse Lupi, que foi ministro do Trabalho.
Para Siqueira, os sinais de que Lula teria uma atuação menos ampla foram dados logo em seu primeiro discurso após deixar a prisão, quando defendeu que o PT lance candidatos próprios em todas as grandes cidades. "Podia ter sido um discurso de unidade da esquerda mas foi um exclusivista, pensando no PT", disse ele.
Exceções nas agendas de Lula são encontros com Guilherme Boulos (PSOL), líderes de movimentos sociais e acadêmicos para debater questões como economia e saúde.
A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann, afirmou que começou a articular encontros de Lula com os presidentes das outras siglas antes da pandemia e deve retomar as conversas. Para ela, a atitude de Lula não mostra isolamento, mas, sim, um novo posicionamento político.
O ex-presidente passou um ano e meio preso, após ser condenado em segunda instância a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá. O processo já chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reduziu a pena a 8 anos e 10 meses. Na quarta-feira passada, o Tribunal Regional Federal da 4ª. Região (TRF-4), manteve a condenação do petista a 17 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro na investigação do sítio de Atibaia.
Nos últimos seis meses, o ex-presidente se dedicou a resolver questões familiares e ao relacionamento com a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, com quem está morando.
Também têm tomado tempo de Lula as disputas internas do PT. No início do ano, ele participou de uma reunião para arbitrar a disputa entre quem defende o apoio a João Campos (PSB-PE) e à deputada Marília Arraes (PT-PE) na candidatura à prefeitura do Recife.
Segundo relatos, Lula tentou impor o nome de Marília mas foi confrontado pelo senador Humberto Costa (PT-PE), que defende aliança com o PSB.
Também não tem se esforçado para evitar a indicação de Jilmar Tatto como candidato do PT a prefeito de São Paulo. Para lideranças petistas, são sinais de que Lula hoje depende mais do PT do que o partido depende dele, ao contrário do que ocorreu nos últimos 40 anos.
Lula tem intensificado as transmissões ao vivo pela internet e entrevistas a rádios e jornais regionais e veículos do exterior.
Com relação às próximas eleições, auxiliares dizem Lula não descarta novas alianças para fora da esquerda, mas não está disposto e não vê condições para repetir a ampla conciliação com empresários e partidos políticos que o ajudou a se eleger em 2002.
Os termos seriam outros. Um dos motivos é a adesão de grande parte da elite ao bolsonarismo.