ENTREVISTA

'Nosso compromisso é fazer o que falta'. Confira entrevista com João Campos, que assume Prefeitura do Recife nesta sexta (1º)

Campos conversou com o Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC) sobre os seus planos para o Recife nos próximos quatro anos e sobre o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, entre outros assuntos

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JC

Publicado em 01/01/2021 às 0:01
Entrevista
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Bisneto do ex-governador Miguel Arraes (1916-2005) e filho do também ex-governador Eduardo Campos (1965-2014), João Campos (PSB) assume nesta sexta-feira (1º), aos 27 anos, a Prefeitura do Recife, o mais jovem na história da cidade. Entre as capitais brasileiras, o político, que é vice-presidente nacional de seu partido, foi o mais jovem a ser escolhido pelos eleitores no pleito municipal de 2020.

Após disputa carregada de artilharia com a prima, a deputada federal Marília Arraes (PT), João emergiu das urnas como uma das novas faces da esquerda nacional. Ele foi eleito o prefeito da capital pernambucana em novembro passado, com 56,27% dos votos válidos, no segundo turno. O socialista, que teve 447.913 votos, tem como vice Isabella de Roldão (PDT).

Engenheiro formado pela Universidade Federal de Pernambuco, Campos conversou com o Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC) sobre os seus planos para o Recife nos próximos quatro anos, quando deve construir um hospital, criar programa de crédito e enfrentar o desafio de povoar o Centro da cidade.

Deputado federal eleito em 2018, o mais votado da história do Estado, o jovem prefeito comentou ainda sobre o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, sobre as articulações no Congresso Federal e sua disposição para articular peças do intrincado tabuleiro na disputa pelo Governo de Pernambuco em 2022, quando deve ter o aliado e antecessor, Geraldo Julio (PSB), no pleito.

O novo prefeito anunciou seu secretariado ao longo desta semana pelas redes sociais e já fez uma mudança na estrutura do governo, reduzindo de 19 para 18 o número de secretarias, unificando pastas e criando uma nova, a de Esportes.

Confira a íntegra da entrevista

SJCC: Neste ano que começa, temos que falar, também, do que o Recife já teve nos últimos anos. Sua campanha foi pautada nisso também: “Nós chegamos até aqui e vamos para frente”. Agora, até que ponto o senhor considera que sua gestão é de continuidade? Até que ponto o senhor está representando algum tipo de ruptura nessa gestão do PSB, que já vem há oito anos?

João Campos: Eu sempre coloquei ao longo da campanha que o caminho dos últimos oito anos do Recife fez a cidade avançar. A cidade conquistou equipamentos, conquistou programas, conquistou ações que não existiam, como é o caso do Compaz, da Upinha, da Faixa Azul, da Academia Recife. Tudo isso representa avanços na cidade, mas o nosso compromisso não era de estar à disposição apenas para fazer o mesmo, mas de poder fazer o que falta no Recife. Foi por isso que a gente, no primeiro dia de campanha, visitou a comunidade de Irmã Dorothy, assim como faremos no primeiro dia de gestão, porque lá falta saneamento, falta regularização fundiária, falta crédito, falta Upinha. Então, nosso compromisso, desde o início, é fazer o que falta. E vai ser agora que teremos a oportunidade de poder fazer essa entrega e mostrar o tanto que ainda faremos pelo Recife.

SJCC: Para o seu secretariado, o senhor lançou mão de muitas pessoas que estão vindo do governo Paulo Câmara. O que é que vai ser diferente em relação a Geraldo Julio, por exemplo, nessa área?

João: Nós montamos um secretariado composto por aquilo que a gente acredita: com a força da renovação, da juventude, com a experiência de bons quadros que têm resultados, que têm serviços prestados à frente da gestão pública. Isso para que a gente possa implementar nossa marca, que é poder fazer com que a gestão seja cada dia mais eficiente e que os serviços cheguem à população com maior qualidade. Recife vai fazer o dever de casa, vai construir projetos importantes, buscar caminhos de financiamento, de operação de crédito, de obras estruturadoras. Nós temos 87% da nossa economia baseada em serviços, então, a qualificação das pessoas vai ser um elemento importante. A gente tem que se consolidar como uma cidade que forma pessoas para poder potencializar o mercado de trabalho. Nosso secretariado, tenho certeza, é o mais qualificado dentre as capitais brasileiras e vai fazer toda a diferença para, junto com a gente, poder fazer o Recife avançar cada vez mais.

SJCC: Prefeito, já que falamos de secretariado, gostaria de lembrar que tivemos a votação da reforma administrativa no final do ano passado, 2020, e tivemos também uma polêmica em torno da economia que tinha sido feita com essa reforma, cerca de R$ 78. Era para ser uma economia maior ou não era? Ou o momento não era esse e vai ter ainda algum tipo de economia, de alguma reforma na prefeitura, além daquilo que a gente já viu?

João: São duas coisas diferentes. A reforma administrativa não tem como foco a economia. A gente tem uma reestruturação da máquina, do funcionamento das secretarias, fusão de algumas pastas, extinção de outras. Há, inclusive, empresas do setor privado que fazem sucessivos cortes de pessoal e isso não representa uma melhor eficiência na gestão dessas empresas. Faremos agora em janeiro um anúncio robusto de medidas de austeridade, de cortes, de redução de despesas, que vai economizar milhões de reais. [Com a reforma,] nosso objetivo foi tornar a gestão mais eficiente. Conseguimos criar uma pasta ampla para licenciamentos. Todos os licenciamentos da cidade do Recife estarão em um único local. A gente conseguiu fazer a transformação digital ganhar um status de secretaria. Conseguimos fazer a separação de Turismo e Esportes, que tanto o trade turístico, quanto o segmento de esportes clamavam por isso. Conseguimos trazer aquilo que vai ser a nossa marca. Então, agora, com a estrutura pronta, isso será o início de um modelo de gestão que será exitoso. E neste mês iremos anunciar um pacote, sim, de cortes, de redução de despesas e gastos, que não vai ser de R$ 78. Vão ser milhões e milhões de reais.

SJCC: O senhor poderia quantificar de quanto seria essa economia almejada e falar em que setores há gorduras e poderiam ser requalificados para funcionar melhor e com menos custos?

João: Desde o momento da instalação do escritório de transição, a gente começou a trabalhar nesse projeto, mergulhando em todas as áreas que podem ter uma otimização dos gastos, e a gente fará o anúncio agora no mês de janeiro. Então, vai ser um pacote robusto, transversal, que pegaria todas as secretarias, e vai olhar para uma gestão mais eficiente. A gente sabe que a economia deles vai passar de milhões, mas faremos esse anúncio completo neste mês.

SJCC: O que chama atenção ainda na reforma administrativa é que cargos foram extintos e outros criados. Esses últimos têm salários mais altos. Isso demonstra a intenção de trazer pessoas da iniciativa privada ou atrair profissionais para a prefeitura? Há muitas pessoas reclamando que dizem: “Porque ele está querendo gente de outros partidos para poder alocar essas pessoas.” Qual é o objetivo desses cargos com o salário mais alto?

João: Na reforma administrativa, foram reduzidos 225 cargos. Então, do número total que existia e do número que passou a existir, são 225 cargos a menos. Nós conseguimos fazer a recomposição de funções de liderança para poder tornar mais competitivo, visando atrair melhores quadros. Para a gente competir de igual para igual com o mercado e poder trazer os melhores quadros que estão à disposição da nossa cidade, para que eles estejam juntos tomando conta das políticas públicas, implementando modelos exitosos de ações, de participação popular, de desenvolvimento urbano, inovação urbana e possa fortalecer a educação da cidade, a saúde. A gente só poderá fazer isso se tiver pessoas qualificadas. Quem acompanhou a formação do nosso time, do nosso secretariado sabe que esse é o nosso compromisso, trazer os melhores quadros para a gestão municipal.

SJCC: Prefeito, nós começamos o ano ainda sob o risco de alastramento da pandemia. O senhor visitou o ministro da Saúde, chamou uma equipe para discutir como é que fica um plano B. O que seria possível afirmar sobre o plano de vacinação do Recife? Como isso vai se dar, quantas vacinas nós vamos receber? Como passamos ano passado por um lockdown, há o risco de restrição, novamente, a comércio e outras atividades? Como está este tema na sua cabeça?

João: Vacina é a nossa prioridade, porque ela é a única solução para a pandemia. A vacina é única solução que vai, efetivamente, resolver esse problema de saúde tão grave. A gente criou o comitê da vacina do Recife. Ele tem dois eixos. O primeiro é discutir junto com o Plano Nacional de Imunização quais são os caminhos que o Ministério da Saúde está desenhando. O segundo eixo é, se o Ministério não fizer a parte dele, não fizer a aquisição de vacinas e distribuição, nós vamos fazer. Recife vai ter, sim, uma campanha de vacinação. Nós vamos proteger as pessoas da cidade. Então, esse comitê, liderado por nós e um grupo de especialistas, junto com a Secretaria de Saúde, vai montar esses dois eixos. Se o Ministério fizer a parte dele, ótimo. Se não fizer, Recife estará pronto para comprar as vacinas e insumos para iniciar a campanha de vacinação contra o coronavírus.

SJCC: Isso custa milhões de reais. Nós temos esses recursos? De onde eles viriam, por exemplo?

João: A gente está em uma discussão com os centros que produzem vacinas. Visitei ainda na transição, o Instituto Butantan, fizemos uma reunião no Ministério [da Saúde]. Tem alguns programas internacionais, alguns deles o Brasil é signatário, como é o caso do programa da Universidade Oxford e da AstraZeneca, tem o da americana Pfizer, tem a CoronaVac. Então, são várias ações diferentes e que a gente está dialogando para que na primeira oportunidade chegue ao Recife e a gente possa fazer a vacinação. Em resumo, se o Ministério não fizer a parte dele, a gente vai fazer, porque não vamos admitir a possibilidade do Recife não ter a vacina.

SJCC: Com judicialização?

João: O STF já autorizou, inclusive foi uma solicitação da OAB e do governador Flávio Dino, do Maranhão, que os municípios e estados façam essa discussão.

SJCC: Prefeito, neste ano há possibilidade de aulas das escolas retornarem em formato híbrido, com aulas a distância e presenciais. Ano passado, porém, muitos alunos, cerca de 3 mil que são das séries finais, receberam um chip e puderam ter essas aulas em casa com estrutura para isso. No caso das séries iniciais, cerca de 50 mil estudantes não tiveram esse chip e muitas famílias não têm condição de colocar internet para que os alunos tenham aula em casa. O senhor pretende fazer alguma coisa em relação a isso, considerando que aula já deve começar no próximo mês, em fevereiro?

João: O modelo híbrido é um modelo que vai existir até que se tenha uma solução definitiva para a pandemia, porque as crianças e profissionais de educação que fazem parte do grupo de risco têm que ter uma atenção muito especial nesse período. Então, qual será o nosso foco? Primeiro, fazer uma grande medição para ver qual foi o tamanho do déficit de aprendizagem durante a pandemia, para que seja possível construir alternativas individualizadas para que a gente possa fazer o acolhimento dos profissionais e dos alunos, da integração com a família e possibilitar a retomada do aprendizado. Foi feito importante para a conectividade dos alunos, principalmente dos anos finais, e a gente vai poder, a partir deste ano, fazer o fortalecimento desse modelo híbrido, mirando sempre para que, assim que possível, retornemos ao modelo presencial, com todos os cuidados necessários, mas que a gente coloque a tarefa da aprendizagem como central na nossa gestão.

SJCC: Mas tem como garantir para essas crianças mais chips, mas estrutura para que elas possam ter essas aulas em casa? Porque haverá gente que não terá condições de assistir às aulas quando elas forem a distância.

João: Uma parte já foi feita, como os chips e um programa de doação de celulares. A gente vai fazer essa consolidação, porque o nosso objetivo é não deixar nenhuma criança para trás. Faremos isso junto com o secretário Fred Amâncio, com um diálogo com os professores, com a rede para viabilizar um ensino híbrido de qualidade que possa chegar a todos e todas que fazem parte da rede.

SJCC: Como é que fica, a partir de agora, sentado na cadeira de prefeito, sua relação com o Grande Recife? Já se discutiu na campanha quando falava sobre mobilidade, porque temos vários problemas. Mas como vai ser a questão do ponto de vista prático? 70% do sistema de ônibus passa pelo Recife, e o Recife tem que ser um ator mais preponderante nessa questão. O senhor vai fazer alguma mudança em relação a como se posiciona, lembrando que houve uma greve no final do ano, quando o sindicato acusou o PSB de estar fazendo um estelionato eleitoral. O que é que muda na prática, agora, com o senhor gerindo a mobilidade do Recife?

João: Transporte público é fundamental. 70% das pessoas utilizam esse modal na nossa cidade, então, o fortalecimento dele é indispensável. A gestão do transporte na RMR é função de um consórcio metropolitano. A prefeitura deve, dia após dia, exercer com rigor a posição dentro do consórcio e fazer exigência de maior qualidade de ônibus, por um melhor roteiro, para que a gente possa otimizar essas rotas e dar maior conforto ao usuário do transporte público. Esse é o foco. Então, fazendo isso junto ao consórcio e a prefeitura fazendo sua parte exclusiva, que é a ampliação das faixas azuis, que a gente possa fortalecer tudo aquilo que foi compromisso na campanha mais de 100 km de ciclofaixas, R$ 70 milhões para recuperação de calçadas da cidade, fortalecer a mobilidade ativa, que é a bicicleta ou através da caminhada. Então, há muitos caminhos a serem feitos e um deles é o transporte público, o que faremos com grande rigor neste ano.

SJCC: Durante oito anos, o prefeito Geraldo Julio fez 150 km de ciclofaixas, mas ainda há uma grande reclamação, que não tem haver com a quantidade, mas na ligação entre elas. Pois há ciclofaixas que não se comunicam. Sua prioridade vai ser 100 km de novos trechos apenas ou fazendo também uma ligação entre as que já existem?

João: Antes de Geraldo ser prefeito, tínhamos 25 km de ciclofaixa, e ele fez mais de 130 km, mais de cinco vezes o que já existia. E nós faremos mais 100 km nos próximos quatro anos, fazendo uma interligação de trechos importantes. Uma das ações que faremos é interligar a Zona Norte com a Zona Sul. Um pleito antigo, reivindicado por muitas pessoas. Vamos fazer ligações em grandes avenidas que já estão projetadas para serem feitas. São intervenções que não são baratas, mas são essenciais.

SJCC: Que avenidas grandes são essas? Porque essa é também uma das reclamações. As pessoas falam que a prefeitura faz as ciclofaixas, mas não atende às grandes vias.

João: Nós vamos fazer a interligação da Zona Norte com a Zona Sul, esse é um pleito importantíssimo, e estamos estudando duas grandes ações de implantação de ciclofaixas: uma na Imbiribeira e outra na Caxangá. São ações estruturadoras. A Interligação sempre vai avançar mais. Isso é natural. O projeto executivo está sendo atualizado, mas isso é garantir a presença dentro da Mascarenhas de Moraes e da Caxangá. Ações estruturadoras que faremos nos próximos quatro anos.

SJCC: Pelo canteiro central? Se não for assim, as pessoas correm o risco de serem atropeladas, porque não temos um trânsito tão civilizado.

João: Veja, a forma como vai ser disposta quem vai dizer isso é um projetista, um engenheiro ou outra pessoa que faça projetos na área. A ação vai ser correta, do ponto de vista técnico, prezando pela segurança.

SJCC: Na reta final da campanha, no final do governo, Geraldo Julio anunciou a retomada das obras do habitacionais do Encanta Moça, no Pina, e o senhor também prometeu resolver as palafitas. Teve até uma confusão grande com a candidata Marília Arraes, dizendo que ela estava dando números errados. Como é que o senhor vai atacar, na prática, agora, como prefeito, a questão das palafitas, que é tão importante para a nossa cidade?

João: Primeiro ponto, em nenhum momento eu disse que iria zerar palafitas. Inclusive esse foi o motivo do debate. É um número que, por mais justa que seja a demanda, não se mostra possível fazer em quatro anos. A gente tem uma tarefa imensa de poder fortalecer a habitação de interesse social na nossa cidade. No Encanta Moça são 600 unidades habitacionais que serão entregues na nossa gestão.A gente tem que fazer uma discussão enquanto país. Hoje no Brasil não há nenhum programa de habitação de interesse social. Não tem nenhum programa nacional de financiamento para política pública de construção de casa para quem precisa. São 8 milhões de residências que deveriam ser construídas no Brasil e não tem essa previsão. Então, nós vamos discutir um modelo onde a prefeitura possa investir, possa fazer uma operação de crédito para isso e discutir, também, parcerias público-privadas para habitação na nossa cidade. O que é importante ser dito? Nós vamos focar num modelo no qual possam ser construídas casas para as pessoas da cidade. Se o governo federal não está fazendo a parte dele, a gente vai fazer a nossa parte, que é poder viabilizar isso.

SJCC: No começo da campanha, todos os candidatos falavam na necessidade de povoar o bairro do Recife. Existe alguma proposta voltada para isso que o senhor já tem isso engatilhado?

João: É importante compreender o Centro do Recife e o bairro do Recife em dois eixos diferentes. O bairro do Recife é a primeira ilha, onde tem a maior parte do Porto Digital e das empresas de tecnologia. O segundo é São José, Santo Antônio, Cabanga e Joana Bezerra representa a segunda parte. A gente tem que discutir a moradia no Centro e hoje ela aparenta ser mais viável perto de São José e Santo Antônio.

SJCC: Mas e o bairro do Recife?

João: A viabilidade está mais nítida em São José e Santo Antônio, e isso atende a demanda do bairro do Recife. As pessoas que trabalham, por exemplo, no polo de tecnologia do bairro podem morar em São José e Santo Antônio, como se faz na rua da Aurora, por exemplo.

SJCC: Mas qual seria o foco do bairro do Recife? Seria, então, para negócios?

João: O foco é levar moradia para o Centro do Recife. E que se tenha no bairro do Recife uma grande localização de atividades, um polo de serviços e atividades na área de tecnologia, por exemplo, e que se coloca moradia ali próximo, do outro lado do rio. Então, há sim planos sendo desenvolvidos para fortalecer a moradia no Centro do Recife, como é o caso da Avenida Guararapes, que a gente pode fazer uma discussão para fazer uma revitalização da via, da Dantas Barreto, que foi um anúncio nosso na campanha. Levar moradia é fundamental. Levar moradia para o Centro do Recife é importantíssimo para que a gente possa fazer uma revitalização e ocupação daquele território.

SJCC: Mudando um pouco o foco e falando sobre educação e a questão dos professores. Fizeram um protesto em dezembro para que não acontecessem aulas em janeiro. Só começar o ano letivo em março. As escolas da rede estadual e privada também estão paradas. Qual vai ser sua diretriz? Como é que fica esta questão?

João: A partir deste mês de janeiro, junto com o secretário Fred Amâncio, a gente vai ter um núcleo específico para discutir a volta às aulas, o modelo híbrido, a conectividade, da medição da defasagem de aprendizagem, das condições necessárias para a volta segura das aulas. Tudo isso vai ser discutido ao longo deste mês para a gente poder consolidar um modelo adequado. Não vamos colocar ninguém em risco. Não vamos botar o aluno em risco ou professor. Agora a gente tem uma responsabilidade com a educação. O Brasil ao longo da pandemia parece que deixou a educação em segundo plano, algo que não podemos deixar nunca em segundo plano. Se a saúde é tão importante nesse momento, e deve ser, a educação também deve ser. Então, a gente tem que falar disso com a sociedade, a gente tem que fazer um esforço concentrado para poder viabilizar o quanto antes a retomada.

SJCC: O seu pai teve coragem, lá atrás, de peitar o sindicato dos médicos e também dos professores. O senhor está dizendo que, independente de protestos, o senhor vai retomar as aulas porque é necessário ter aula?

João: Não estou dizendo isso. Estou dizendo que a gente vai discutir neste mês de janeiro. Sempre com diálogo com os professores, com o sindicato, com representantes dos alunos, discutir com a rede, porque é um desafio que está posto na sociedade e está custando a todos nós. Não é um desafio apenas do prefeito. É um desafio da comunidade escolar. E faremos isso prezando pela segurança, com equilíbrio entre a segurança da saúde e a preservação do conhecimento. Com muita serenidade. Ninguém vai passar por cima de ninguém. Vai ser feito com diálogo e será construído dessa forma.

SJCC: Entendi. Mas qual é sua disposição, seu desejo? O que o senhor gostaria de fazer?

João: Veja, a gente não governa com base em desejos, mas nas evidências e na construção através de diálogo. Então, para construir uma alternativa para educação, ela será construída ouvindo a educação. Meu compromisso é sentar com quem faz educação no Recife, com a gestão municipal, com a rede e discutir uma solução conjunta. Não vou chegar para impor nada. A gente vai chegar para construir e que a decisão seja pensada, prioritariamente, no aluno que precisa aprender e no professor que tem que ter a segurança para ensinar.

SJCC: Prefeito, neste ano não tem Carnaval. E aí, para além da preocupação com a diversão, o senhor tem uma responsabilidade, como gestor, com o impacto econômico dessa medida. Mas o senhor tem algum projeto para compensar quem esperava faturar no Carnaval e não vai ter isso neste ano?

João: A cultura é algo fundamental, é a raiz de uma sociedade, que pode dar sustentação, bem-cuidar, vigor e crescimento. Então, nós temos esse compromisso com a cultura. Ao longo desse mês nós vamos lançar o Chama a Cultura, que anunciei na campanha e chamará a cultura para começar a construir as alternativas. O Carnaval é um importante ciclo e momento de manifestação cultural, mas também representa uma atividade que tem toda uma cadeia, desde o trabalho informal, passando por comércio de roupas, refrigerantes, lanches, o trade turístico, acomodação, hotelaria, restaurante. Tudo isso está envolvido no Carnaval. Então, vamos fazer a discussão e teremos, sim, medidas anunciadas e apresentadas pela prefeitura e a gente vai fazer isso já neste mês para poder consolidar e acrescentar no nosso pacote de acolhimento e fortalecimento da cultura e dos setores envolvidos com o Carnaval.

SJCC: Como ficarão os informais e outras pessoas que dependem desse período?

João: Nós vamos, juntos com a Secretaria de Cultura e outras secretarias envolvidas na formulação do Carnaval, elaborar e anunciar neste mês esse plano para o momento que seria o Carnaval. É importante dizer também que, se dependesse da vontade do prefeito, enquanto cidadão do Recife, enquanto alguém que ama nossa cultura, todos nós gostaríamos de ter um grande Carnaval, o maior do mundo, como o Recife faz, mas a gente não pode estar pautado apenas pelo desejo, mas ouvir e entender o que pode ser feito. Entender que a gente está no meio de uma pandemia. A alternativa vai ser fazer a proteção, o acolhimento e as medidas para superar esse momento junto com quem faz a cultura.

SJCC: Qual a chance de adiar para o meio do ano? Considerando que há no Congresso ideias para reunir as principais cidades do Carnaval e fazer em julho ou agosto. Há chance de aderirmos a esse movimento e fazer Carnaval no meio do ano?

João: Nós conversamos com o deputado Luizinho, que é o presidente da comissão extraordinária da covid-19, e a ideia seria transferir o feriado nacional para o mês de julho. Isso está sendo construído, acho que é, inclusive, uma ação positiva a ser feita, mas não garante que a festa poderá ser em julho. A definição de quando poderá ser feita toda a aglomeração e encontros no Carnaval, como a gente sabe e gosta de fazer, será apenas quando tiver uma solução definitiva da vacina. Então, esse é um ponto que a gente tem que discutir. Mas até lá, temos que ter todas as medidas para proteção e fortalecimento da cadeia produtiva e da cultura, então isso é muito importante.

SJCC: Agora no fim do ano, a Caixa pagou a última ajuda federal para as pessoas mais necessitadas. Ou seja, acabou o auxílio emergencial. O desemprego já está em 18%. O senhor na campanha prometeu fazer financiamento. Quando é que isso começa para tentar compensar a queda na economia que é brutal, como consequência da pandemia?

João: Vamos, no primeiros 90 dias, colocar em funcionamento o crédito popular do Recife. Serão R$ 3 mil com quatro meses de carência, fortalecendo o comércio local da nossa cidade. Enquanto deputado eu criei a frente parlamentar em defesa da renda básica, defendi a manutenção do auxílio emergencial, que a gente aumentasse a transferência de renda no país. O que acontece? Com o fim do auxílio em dezembro, são 120 milhões de brasileiros no auxílio, desses, 40 milhões são inscritos no Bolsa Família, se você corta do dia pra noite o auxílio, 80 milhões de brasileiros ficam sem renda. Eu não acredito que há sustentabilidade social desse jeito. Então, deveria ter um programa mais continuado, de transição, para uma maior transferência de renda. Esse é um motivo de grande preocupação. As prefeituras terão que construir uma alternativa para tentar fortalecer isso. Aqui no Recife, a gente vai lançar o crédito popular do Recife, que vai estar à disposição dos recifenses para poder investir, gerar renda e emprego na nossa cidade.

SJCC: Quais vão ser os critérios, quem vai poder pegar esse dinheiro, como ele terá que ser utilizado? Isso já está planejado?

João: A primeira operação de crédito será feita no primeiro trimestre, nos primeiros três meses do governo. São R$ 3 mil, com os quais você pode tanto para um negócio já existente. Imagine, você tem uma barbearia ou um salão de beleza, você fabrica bolo, aí pega o dinheiro e pode comprar um forno, pagar despesas do seu negócio. Se você não tiver, poderá abrir um CNPJ e a gente vai ajudar com esse dinheiro. Pode ser para capital de giro. É de livre discricionariedade, é de livre uso desde que seja na sua atividade.

SJCC: Basta ter um CNPJ?

João: Um CNPJ, porque será firmado um contrato com um fiador também junto e é possível que pessoas negativadas também tenham acesso. Uma condição especial, com taxa de 0,99%.

SJCC: Vai ser feita com algum banco? Porque a prefeitura não pode fazer.

João: Será com a Agência de Fomento do Estado de Pernambuco. Vamos assinar um contrato e ela virará operadora financeira. O município fará um aporte de dinheiro e ela a operação para garantir a taxa de 0,99% de juro, que não existe em nenhum banco.

SJCC: Na campanha o senhor prometeu um hospital dedicado à infância. Já é possível falar qual será o bairro que vai ser beneficiado, qual o valor da obra, previsão de entrega, se já no segundo ano de gestão, terceiro ou quarto? Além disso, como será o fluxo de atendimento, vai ser pra Down, autismo, dislexia, déficit de atenção, multiespecializado?

João: Nós anunciamos e vamos fazer o Hospital da Criança do Recife. Ele vai ficar próximo ao bairro do Ibura, porque isso é uma demanda porque a maior parte dos hospitais infantis que existem estão na Zona Norte ou na Zona Central da cidade, e esse ficará próximo ao Ibura e Jordão. Vamos poder também agora em janeiro dar início a todo trâmite, contratação, projeto executivo, depois disso licitar a obra, começar a obra, então, a gente tem uma estimativa que vai ser algo em torno de R$ 40 milhões o investimento para fazer o hospital, que será construído ao longo dos próximos quatro anos e terá seu funcionamento ainda no nosso mandato.

SJCC: Geraldo Julio está saindo agora da prefeitura, o senhor está assumindo, e se fala muito que ele é um candidato natural para o governo do Estado. Ele hoje é o candidato natural do PSB para o governo em 2022?

João: Geraldo fez uma grande gestão à frente da prefeitura, conseguiu fazer o Recife avançar. A gente olha para o Recife de oito anos atrás e olha para o Recife de hoje, vemos que Recife avançou muito. Ele é uma pessoa comprometida, competente, boa de trabalho, de serviço, que vai ter a oportunidade de tirar agora um justo, merecido e curto descanso e a partir desse momento discutir com o partido. Geraldo é um quadro que vai estar à disposição do nosso partido para poder construir. Tem muito chão pela frente. Ele sabe que contará com nosso apoio para poder construir projetos que fortaleçam nossa cidade, nosso Estado, nosso partido. O cenário de 2022 ainda está muito distante, ainda tem muito tempo, e na política as coisas são muito dinâmicas. Agora, é importante aqui fazer um reconhecimento ao trabalho de Geraldo. O que ele fez na nossa cidade, a gente vai poder avançar ainda mais, porque a gente recebe a cidade muito melhor, muito mais organizada, preparada para esse caminho do desenvolvimento que a gente vai montar.

SJCC: Mas o senhor diria que ele daria melhor essa contribuição numa secretaria de infraestrutura ou Casa Civil?

João: Geraldo vai ter a oportunidade de poder construir as alternativas, de pensar como serão os próximos anos. Sabe quando você chega ao final de uma jornada e a sensação que dá é a de dever cumprido? De que fez bem feito, de que se dedicou, que abriu mão da vida pessoal, da família, da rotina com os amigos para poder cuidar da cidade? Então, Geraldo se dedicou muito. Ele é uma pessoa muito intensa, muito dedicada, e eu não tenho dúvidas de que essa é a sensação que passa no coração e na cabeça dele, que cumpriu bem o dever e o papel. Isso daí gera uma esperança de que ainda pode fazer muito.

SJCC: O senhor estava na Câmara Federal e agora é prefeito do Recife, mas o que acontece na Câmara não deixa de lhe interessar, até por causa da situação que vivemos, na qual os municípios às vezes não podem ficar dependendo simplesmente do governo federal. No final do ano passado, chegou-se a falar muito na sua preferência por Arthur Lira, que é do PP e candidato à presidência da Casa, e uma parte do PSB de Pernambuco também estaria apoiando. Qual a sua preferência? Existe uma preferência ou não e o que o senhor espera dessa eleição, que vai acontecer agora no início de fevereiro?

João: Esse debate vai ser feito na bancada do PSB. Naturalmente agora a gente assume o mandato de prefeito e vamos cuidar da cidade. O companheiro Milton Coelho, que era primeiro suplente, assumiu o mandato, e eu tenho certeza que o PSB vai saber fazer esse debate dentro da bancada. São duas ações diferentes também. Uma é a composição do bloco, o outro a eleição para presidente. Embora parecidos, quem conhece o funcionamento da casa sabe que são ações distintas. O PSB vai saber fazer esse debate e construir uma alternativa para um maior protagonismo do partido dentro do parlamento.

SJCC: Roberto Freire, pelas redes sociais, disse que o senhor seria um grande político se errasse pouco. Por isso ele pediu para o senhor não apoiar Lira. Se o senhor tivesse a oportunidade, o que gostaria de responder a ele?

João: Esse debate do que acontece dentro do parlamento, é um debate feito, muitas vezes, por gente que está de fora e não conhece o que acontece. Eu sempre defendi a tese de que era importante ver quais eram as candidaturas postas. Porque se você pega as principais, todas elas podem ter alguma eventual relação com o governo. Não tem, até o momento, nenhuma candidatura de oposição, como eu defendi. Inclusive, fiz uma solicitação à bancada para discutirmos uma candidatura própria de oposição. Então, essa é a nossa posição, porque todas as candidaturas com favoritismo têm relações com o governo Bolsonaro, seja com líder de governo no Congresso, participação em ministério, então, a independência só com uma candidatura de oposição.

SJCC: Mas Lira não seria melhor para o Recife, porque o senhor conhece e tem proximidade JHC lá em Alagoas? Por causa disso, ele poderia ser o melhor para o Recife?

João: Ele apoiou a candidatura de JHC no segundo turno, em Maceió, a segunda capital feita pelo PSB, e como eu disse, o parlamento tem uma dinâmica muito própria, então, Artur é um deputado que tem relação com muitos deputados, é conhecido por ser uma pessoa de palavra. Naturalmente, a dinâmica é muito própria do parlamento. A tese que eu defendo é que a oposição tenha uma candidatura própria. Mas isso vai ser construído no âmbito da bancada, que é muito preparada, que tem competência, sabe dialogar, sabe vencer eventuais divergências dentro da própria bancada, e no mês de janeiro vai poder construir isso da maneira mais saudável possível. Eu espero que o parlamento continue a ser um esteio importante para o Brasil. Continue a ser um ponto importante de debate, com as portas abertas e em funcionamento. Essa é a grande tarefa que o parlamento tem para os próximos anos.

SJCC: Falando aqui da política, hoje tem eleição para Mesa de Diretora da Câmara do Recife. Vai haver bate-chapa entre socialistas? Porque Eduardo Marques manifestava a intenção de buscar a reeleição e em paralelo apareceu a candidatura de Romerinho Jatobá, e alguns parlamentares disseram que o senhor não sinaliza. O senhor não quer interferir nisso, não é para interferir ou tem algum candidato da sua preferência? Ou vai esperar o que acontece?

João: Eu conheço a dinâmica do parlamento. Fui deputado federal e respeito muito a dinâmica do parlamento. Ele sabe se organizar e tem um papel importante de representatividade. Todo mundo que chega ao parlamento chega legitimamente eleito, escolhido pelas pessoas. Então, eu tenho certeza que a nossa bancada, que é a maior, são 12 vereadores do PSB, vai tomar a decisão correta, de posicionamento e construção. Assim, a Câmara de Vereadores vai poder fazer uma legislatura importante para a cidade. Todos os vereadores, seja de situação ou oposição, chegaram porque foram escolhidos, porque foram eleitos. Então, isso é um motivo de respeito e tenho confiança que esta legislatura vai fazer um importante trabalho.

SJCC: Prefeito, muito obrigado pela entrevista neste primeiro dia do ano para o Jornal do Commercio, Rádio Jornal, TV Jornal. Mas antes de encerrar gostaria que o senhor falasse com o seus concidadãos do Recife e mandasse uma mensagem sobre o que podemos esperar nos próximos quatros anos do senhor.

João: Quero desejar um feliz ano novo e agradeçer a todos os recifenses, quem votou em mim e também quem não pôde votar. A partir de agora, a gente governa para todos e todas. Os palanques estão desmontados. Os palanques ficam nas eleições. Agora, é juntar as pessoas da cidade para a gente poder avançar, para a gente vencer a pandemia e construir a cada dia uma cidade que acolha, que cresça, que distribua e que tenha oportunidade para todas as pessoas. Então, feliz ano novo, fique certo de que eu estou muito animado para a gente poder crescer juntos e governar a cidade e fazer o que falei na campanha: fazer o Recife largar na frente. Então, que Deus nos abençoe — queremos agradecer a proteção divina sempre — e vamos em frente.

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