Operação de combate à corrupção

Operação Apneia: MPF apresenta recurso para manter ação contra ex-secretário de Saúde do Recife na esfera federal

A denúncia ajuizada pelo MPF inclui o ex-secretário Jailson Correia e mais cinco pessoas. A Justiça Federal se declarou incompetente para julgar o caso; entenda

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JC

Publicado em 29/06/2021 às 17:46 | Atualizado em 29/06/2021 às 18:43
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O Ministério Público Federal (MPF) apresentou um recurso ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) para que a ação penal da Operação Apneia não siga para a esfera estadual. A denúncia, ajuizada pelo MPF contra seis pessoas, trata de contratação, por parte do município do Recife, da microempresa Juvanete Barreto Freire (Brasmed Veterinária) para o fornecimento de respiradores para o enfrentamento da pandemia de covid-19.

São alvos da denúncia do MPF, o ex-secretário de Saúde do Recife Jailson de Barros Correia, o ex-diretor executivo de Administração e Finanças da Secretaria de Saúde do município Felipe Soares Bittencourt e a ex-gerente de Conservação de Rede da Secretaria de Saúde do Recife Mariah Simões da Mota Loureiro Amorim Bravo, bem como os empresários Juarez Freire da Silva, Juvanete Barreto Freire e Adriano César de Lima Cabral.

As investigações foram deflagradas no ano passado para investigar possível direcionamento e desvio de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). Na primeira instância, porém, a Justiça Federal declarou-se incompetente para julgar os crimes de dispensa indevida de licitação e peculato, declinando o caso para a Justiça Estadual, bem como declarou incompetência territorial para apreciar crimes contra a ordem tributária, alegando que competiria à Seção Judiciária de São Paulo.

Uma das razões para a incompetência seria que recursos do SUS não teriam sido utilizados no pagamento dos respiradores. A Justiça apontou que o Fundo Municipal de Saúde (FMS) recebeu diversos repasses de verbas do Ministério da Saúde para fins de combate à pandemia no âmbito do SUS, este seria o motivo pelo qual, anteriormente à conclusão das investigações sobre a origem dos recursos utilizados, havia indícios de utilização de recursos federais na prática criminosa investigada.

Mas ao fim das investigações, diz a Justiça, o resultado foi outro. "Não obstante, ao relatar o inquérito policial em questão, ao fim das investigações, a Autoridade Policial consignou: “(…) No caso dos contratos objeto desta investigação, em decorrência do distrato firmado antes da conclusão das obrigações estabelecidas, somente um pagamento chegou a ser realizado. Tal pagamento foi efetuado através de ordem bancária, com utilização de conta do Fundo Municipal de Saúde de Recife. Necessário esclarecer, por oportuno, que obtido extrato da referida conta junto ao Banco do Brasil, via sistema SIMBA, observou-se que não houve aporte de recursos do Ministério da Saúde em data próxima à do único pagamento realizado no interesse desses contratos. (…)”, diz trecho da decisão da 36ª Vara Federal da Justiça Federal em Pernambuco.

Na mesma decisão, a Justiça ainda levou em consideração uma auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco que concluiu que a Conta Bancária utilizada para pagamento não se encontra no rol daquelas destinadas ao recebimento dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Saúde, na modalidade Fundo a Fundo, ou para qualquer outra aplicação específica de verbas federais (convênios, acordo, ajustes e outros instrumentos congêneres).

O que alega o MPF?

No recurso do MPF, os procuradores da República Cláudio Dias e Silvia Regina Pontes Lopes defendem que a falta de transparência na aplicação de recursos durante a pandemia inviabiliza a rastreabilidade ampla e prévia dessas verbas por órgãos federais, inclusive os de persecução criminal (MPF e Polícia Federal), ensejando violação ao interesse federal, e a competência da Justiça Federal.

De acordo com o Ministério público, a União cofinanciou as ações de saúde, auxílio e combate à covid-19 em valores que superam R$ 1 bilhão no Recife. O MPF também destaca manobras contábeis dos gestores denunciados, que teriam ocultado e alterado as fontes de custeio das aquisições dos respiradores, de forma a dificultar a atuação dos órgãos federais de controle.

“Não há de se restringir a discussão da competência federal, limitando-a a uma questão eminentemente ‘patrimonial’, sob pena de se aglutinar o sentido jurídico-normativo da expressão ‘em detrimento de interesse federal’, constante do art. 109, IV, da Constituição, convertendo-o em mera repetição da expressão ‘em detrimento de bens da União’, o que, em escorreita hermenêutica constitucional, não se afigura assertivo”, declaram os procuradores da República.

Além disso, destacam que o contexto dos fatos das investigações revelam o interesse da União, em razão "do co-financiamento bilionário" mediante repasse de grandes recursos aos entes subnacionais para o enfrentamento da pandemia. Segundo o MPF, a mudança do financiamento de gasto do Fundo Municipal de Saúde para empréstimo da Caixa Econômica Federal contraria o gerenciamento de bens e interesse de empresa pública federal, ensejando por este argumento, da mesma forma, a competência da Justiça Federal para processamento do feito.

O MPF reforça que houve uso de verbas do SUS, o que atrai a atribuição fiscalizatória da União, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Destaca ainda que a aplicação desses recursos, incluindo os estaduais e municipais, está sujeita à fiscalização do Sistema Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus). O MPF também argumenta que a Lei Federal 8.080/90 estabelece que compete à direção nacional do SUS definir e coordenar, dentre outros, os sistemas de redes integradas de assistência de alta complexidade – caso das aquisições alvos da denúncia.

Conforme argumentam os procuradores da República, os recursos transferidos para a Juvanete Barreto Freire ME foram oriundos do Fundo Municipal de Saúde, vinculados ao SUS. Além disso, segundo as apurações, do total pago por esse fundo em 2020 para o enfrentamento da pandemia, a maior parte dos gastos foi de recursos federais. De acordo com nota técnica do Ministério Público de Contas de Pernambuco (MPCO/PE), o total repassado do Fundo Nacional de Saúde ao Fundo Municipal de Saúde do Recife, no ano passado, foi de mais de R$ 580 milhões, dos quais aproximadamente R$ 125 milhões foram destinados ao combate à pandemia.

Por fim, na ação o MPF reforça o que diz o enunciado 16 da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão. "Havendo transferência de recursos da União, inclusive fundo a fundo, a fiscalização federal atrai a atribuição do Ministério Público Federal". 

Confira o recurso

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