2022

Quem controla a máquina ganha a eleição? Saiba o que dizem políticos e analistas

Apesar da aparente vantagem eleitoral que partidos que já estão no poder teoricamente possuem, resultados de pleitos passados mostram que uma estrutura governamental, por si só, não é capaz de garantir uma vitória nas urnas

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Renata Monteiro

Publicado em 05/01/2022 às 8:00
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No Brasil e em outras partes do mundo é comum que a proximidade das eleições provoque o ressurgimento de debates sobre temas bem específicos. Em terras tupiniquins, de tempos em tempos nossos políticos e os analistas da área trazem à tona discussões a respeito do uso eleitoreiro da máquina pública. Mas o que exatamente isso significa?

"Quem tem a máquina na mão tem o controle da agenda política e isso gera exposição, gera notícia. Além disso, tendo o controle sobre o orçamento é possível gerenciar políticas públicas, viabilizar uma coalizão de partidos beneficiando aliados através de cargos. O gestor consegue se fortalecer para chegar a uma reeleição ou para eleger seu escolhido como sucessor", explica o cientista político Vanuccio Pimentel, da Asces/Unita.

Apesar da aparente vantagem eleitoral que partidos que já estão no poder teoricamente possuem, resultados de pleitos passados mostram que uma estrutura governamental, por si só, não é capaz de garantir uma vitória nas urnas. Em 2018, dos 20 governadores que tentaram se reeleger, 10 renovaram os seus mandatos. O número chama atenção, mas é a menor taxa de reeleição entre governadores desde 2006, quando apenas 6 dos 20 mandatários que disputaram conseguiram vencer. Em 2010 foram 13 reeleições entre 20 tentativas, e em 2014, das 18 candidaturas postas, 11 saíram vitoriosas.

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Em Pernambuco, desde a redemocratização, alguns governadores até chegaram a se reeleger, mas apenas um, Eduardo Campos, falecido em 2014, conseguiu fazer um aliado se tornar seu sucessor, Paulo Câmara (PSB). No Recife, desde 1988 apenas Gilberto Marques Paulo (então no PFL), João Paulo (PCdoB) e Geraldo Julio (PSB) conseguiram este feito, sendo que os dois últimos tiveram dois mandatos consecutivos.

Sobre o cenário estadual, o cientista político Antônio Lucena diz que duas coisas podem explicar o fenômeno que levou Eduardo a ser o único governador da história recente de Pernambuco a conseguir levar um afilhado político ao Palácio do Campo das Princesas: a conjuntura econômica daquela época e a estratégia que ele usou para enfraquecer a oposição durante as suas gestões.

"O governo Eduardo Campos se beneficiou de um momento muito favorável no Brasil inteiro, que foi o superciclo das commodities. Nesse período, houve grandes investimentos do governo federal em toda a região Nordeste, o que fez com que o PIB de Pernambuco crescesse de forma consistente e isso fosse operado favoravelmente pelo então governador. Eduardo foi, inclusive, responsável por uma divisão considerável na oposição do Estado, o que acabou por beneficiar o candidato do PSB", detalhou o docente.

Durante o período em que Campos foi governador, importantes forças que antes engrossavam o coro da oposição ao PSB no Estado, como o grupo do senador Jarbas Vasconcelos (MDB) e o Democratas, liderado localmente pelo ex-governador e ex-ministro da Educação Mendonça Filho, passaram a integrar a base do governo. Algum tempo depois, o DEM até retornou para a oposição, mas o MDB de Jarbas ainda faz parte da Frente Popular.

No grupo que faz oposição ao governador Paulo Câmara hoje, têm sido recorrentes as críticas feitas ao momento que o Executivo estadual escolheu para lançar o Plano Retomada, iniciativa que prevê investimentos da ordem de R$ 5 bilhões entre 2021 e 2022 em áreas como infraestrutura, segurança pública e saúde. Para o ex-senador Armando Monteiro (PSDB), por exemplo, a ação tem “caráter eleitoreiro”.

“Pernambuco tem essa situação curiosa, o governador fala de um plano de retomada do desenvolvimento no último ano de gestão. Primeiro que não é retomada, pois se não havia desenvolvimento, não há o que retomar. Além disso, esse é um discurso de caráter eleitoreiro, pois o Estado está anunciando um mega plano de desenvolvimento no apagar das luzes do governo. Tudo agora é eleição, cada manifestação da administração, cada ação anunciada, tudo se confunde com o processo eleitoral”, observou o tucano.

Questionado sobre essas críticas durante debate no fim de dezembro, Paulo Câmara justificou o lançamento do Plano Retomada na reta final do governo afirmando que Pernambuco foi afetado pela crise econômica que atingiu o Brasil entre 2015 e 2018, o que exigiu mais austeridade do Estado ao realizar investimentos. De 2019 até agora, declarou o governador, a pandemia de covid-19 desviou todo o foco da gestão para ações relacionadas ao combate do coronavírus.

"É só olhar a contextualização e ver o que aconteceu com o País de 2020 para cá para saber as dificuldades que enfrentamos nos últimos sete anos. Se olharmos de 2015 a 2018 o que nós víamos pelo País são vários e vários estados sem pagar folha de pagamento, sem pagar 13º, sem cumprir suas obrigações básicas. Mas Pernambuco, apesar de toda crise, nunca deixou de cumprir as suas obrigações com o funcionalismo público, avançou em todas as áreas, seja na educação, saúde, segurança pública. (...) De 2019 para cá a gente teve um cenário diferente, porque a pandemia chegou e nós fizemos um dever de casa muito importante a partir do início da nossa segunda gestão, de toda uma estruturação para que o Estado voltasse a ter capacidade de investimento. Os primeiros quatro anos cuidando de se adaptar às quedas de receita em virtude da crise, e no segundo governo justamente voltando a investir", argumentou o governador.

Pré-candidato a governador, o prefeito de Jaboatão dos Guararapes, Anderson Ferreira (PL), afirmou em um recente almoço com a imprensa que não se intimida nem fica desanimado em disputar a eleição diante do volume de entregas que seus adversários estão planejando fazer nos próximos meses. "Eu derrotei aqui em Jaboatão o candidato que representava duas forças políticas, a do governo e a do município. Eram duas máquinas, mas eu não consegui derrotar? Eu comecei a campanha com 6% (das intenções de voto), ninguém acreditava na minha candidatura, usaram de todas as estratégias, tentaram lançar candidatos para me desidratar. (...) ‘Ah, porque eles são bons, sabem ganhar eleição, têm muito dinheiro’. Dinheiro não compra o sentimento de um povo que quer mudança", cravou.

Não se pode esquecer, contudo, que mesmo em proporção muito menor, Anderson também está diante de uma máquina governamental, e isso ocorre também com outros pré-candidatos oposicionistas, como a prefeita de Caruaru, Raquel Lyra (PSDB), e o prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (DEM). O ministro do Turismo, Gilson Machado, outro cotado para a disputa, também tem em suas mãos uma estrutura de governo, no seu caso federal, que pode ajudar a beneficiá-lo no pleito de 2022.

"No caso dos pré-candidatos ao Governo de Pernambuco, todos têm uma vitrine. Isso é importante porque gera um conteúdo positivo no lugar em que ele está e também é uma base para ele mostrar seu trabalho no Estado. A máquina, em si, tem um alcance muito pequeno, são alcances locais, no caso das prefeituras, então o que se espera é que eles tenham um apoio significativo nos seus municípios e em alguns colégios ao redor”, pontuou Vanuccio Pimentel.

LEGISLAÇÃO

No Brasil, tanto a legislação eleitoral quanto a Lei de Responsabilidade Fiscal determinam uma série de limites para tentar impedir que gestores usem a administração pública para obter benefícios eleitorais. Segundo Antônio Lucena, de modo geral os órgãos de controles são eficazes em fiscalizar desmandos cometidos por gestores públicos nessa seara, mas pode haver exceções.

“Se uma instituição estiver aparelhada, fica muito difícil de você colocar para frente as malversações do governo. Basta você ver a questão do governo Bolsonaro com a Procuradoria-Geral da República. Uma série de erros de políticas públicas, a questão da covid e tudo mais que a CPI identificou, mas não é dado encaminhamento a elas porque a PGR está nas mãos de um aliado”, afirmou.

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