Lula vê cumplicidade em ataque a Brasília e promete rigidez com bolsonarismo radical

Para o presidente, policiais e membros das Forças Armadas foram "coniventes" com os milhares de simpatizantes radicais de Bolsonaro que invadiram as sedes dos Três Poderes
Renata Monteiro
Publicado em 12/01/2023 às 19:31
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) Foto: EVARISTO SA / AFP


Da AFP

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou, nesta quinta-feira (12), que os invasores das sedes dos Três Poderes em Brasília contaram com cumplicidade interna e prometeu ser "mais duro" com o bolsonarismo radical, considerado uma ameaça à democracia no Brasil.

"Eu estou convencido de que a porta do Palácio do Planalto foi aberta para que gente entrasse porque não tem porta quebrada", declarou Lula durante um café da manhã com jornalistas na capital federal.

"Significa que alguém facilitou a entrada deles aqui", acrescentou sobre a entrada violenta de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro no prédio.

Para Lula, policiais e membros das Forças Armadas foram "coniventes" com os milhares de simpatizantes radicais de Bolsonaro que invadiram no domingo o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional.

Os apoiadores de Bolsonaro, que nega qualquer envolvimento com a invasão, exigiam a queda de Lula exatamente uma semana após ele tomar posse e iniciar seu terceiro mandato, após presidir o país entre 2003 e 2010.

No rastro de destruição, a turba saqueou escritórios e destruiu obras de arte de valor incalculável pertencentes ao Estado.

"Daqui para frente vamos ser muito mais duros e muito mais cautelosos, porque não pode acontecer o que aconteceu no fim de semana", declarou Lula, de 77 anos, que venceu Bolsonaro no segundo turno das eleições presidenciais, em 30 de outubro, por uma margem estreita.

Lula anunciou uma "triagem profunda" dos funcionários da Presidência. "O Palácio (do Planalto) estava cheio de bolsonaristas, de militares, e queremos ver se podemos corrigir (a situação) para colocar funcionários de carreira, de preferência civis".

"Não pode permanecer aqui dentro (com) alguém suspeito de ser um bolsonarista radical", enfatizou o presidente, que não escondeu sua desconfiança sobre sua segurança na sede do Executivo.

As autoridades avançam nas investigações para determinar quem organizou e financiou os violentos protestos que aterrorizaram o coração da capital federal, enquanto Lula prometeu pulso firme com os setores considerados "fascistas" e "terroristas".

A Advocacia-Geral da União (AGU) identificou 52 pessoas e sete empresas que estão sob suspeita de terem financiado a mobilização.

Lula "deveria responder a esses ataques sem precedentes fortalecendo os princípios democráticos, defendendo o Estado de Direito e enfrentando os problemas crônicos de direitos humanos que foram agravados durante a presidência de Jair Bolsonaro", afirmou nesta quinta-feira a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch.

A ONG pediu uma investigação "minuciosa" de quem "incitou, financiou ou cometeu" atos de violência.

Os apelos para punir os agitadores acontecem um dia depois da convocação de uma mobilização bolsonarista para um protesto nacional a favor da "Retomada do Poder", que levou o governo a reforçar a segurança, principalmente em Brasília, onde o acesso à principal área de edifícios públicos foi fechado.

As manifestações, previstas para a quarta-feira, não se concretizaram e o centro do poder político em Brasília foi reaberto ao trânsito. No entanto, permaneceu sob a vigília de policiais e veículos blindados, enquanto trabalhadores consertavam a fachada do STF.

Quase 2.000 pessoas foram detidas após as invasões no domingo - 1.159 permanecem em reclusão após serem interrogadas, de acordo com o último boletim oficial.

A agilidade nas prisões, segundo especialistas, diluíram a possibilidade de realização das manifestações anunciadas para esta quarta.

"O governo Lula agiu muito rápido para conter os grupos que estavam se organizando desde domingo. A prisão acabou desarticulando muitos por medo de serem presos", disse Guilherme Casaroes, cientista político da Fundação Getúlio Vargas.

Para o sociólogo Geraldo Monteiro, "o movimento bolsonarista está sob pressão e não tem esse grau de organização para uma contraofensiva, o que deixa muito evidente sua fragilidade. Não tem volume".

Dos Estados Unidos, para onde viajou dois dias antes do fim de seu mandato, Bolsonaro condenou os atos de domingo mas, a exemplo das últimas semanas de seu governo, manteve-se praticamente em silêncio.

O ex-presidente "não lidera propriamente, então o movimento está sem fôlego para seguir em frente", acrescentou Monteiro, co-autor do livro "Bolsonarismo: Teoria e Prática".

Após os ataques aos baluartes da democracia brasileira, Lula rapidamente recebeu o apoio dos líderes do Congresso e do STF, assim como dos governadores.

O ministro do STF Alexandre de Moraes ordenou, na quarta-feira, aos governos estaduais que proíbam o bloqueio de rodovias e a invasão de patrimônio público. O plenário do STF analisa hoje se mantém essa decisão.

Moraes determinou, ainda, a prisão do coronel Fabio Augusto Vieira, comandante da PM do Distrito Federal, - que já foi detido - e de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública de Bolsonaro e recém-nomeado secretário de Segurança da capital, por suposta "omissão e conivência" com os incidentes de domingo. Ambos foram exonerados dos cargos após os distúrbios.

Torres, que nega "qualquer tipo de conivência com barbáries", encontra-se de férias nos Estados Unidos, mas afirmou que voltará ao país. Sua chegada a Brasília está prevista para esta semana.

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