Pressão de big techs e desarticulação da base adiam PL das Fake News

A incerteza sobre o número de votos para aprovar a proposta fez com que a base governista optasse por cancelar a apreciação do projeto nesta terça-feira
Estadão Conteúdo
Publicado em 02/05/2023 às 23:48
O pedido de adiamento partiu do relator da proposta, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) Foto: PEDRO FRANÇA/AGÊNCIA SENADO


Sob pressão de big techs como Google, TikTok e Meta (controladora do Facebook) e da oposição, a Câmara dos Deputados adiou a votação do projeto das Fake News.

A incerteza sobre o número de votos para aprovar a proposta fez com que a base governista optasse por cancelar a apreciação do projeto nesta terça-feira, 2.

O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), chancelou o pedido, após ouvir os líderes dos partidos. "Estou sendo justo com o País, não com radicalismos", disse Lira.

O pedido de adiamento partiu do relator da proposta, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Ele alegou que precisava de mais tempo para atender todos os pedidos de mudança no texto.

Após anunciar o adiamento, Lira foi cobrado pela bancada evangélica. O grupo era contrário ao projeto, mas, diante da constatação de que governistas não tinham apoio suficiente para aprová-lo, passou a querer votar a proposta.

O presidente da Câmara se irritou com a pressão do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que acusou Lira de não respeitar os parlamentares da oposição ao adiar, na semana passada, a votação.

O presidente da Câmara lembrou que o projeto foi adiado por causa justamente do pedido da oposição e que havia sido feito um acordo de procedimentos que não foi respeitado pelos oposicionistas.

"Nós demos oito dias para as big techs fazerem o horror que fizeram com esta Casa. E não estou vendo ninguém defendendo esta Casa. Não estou defendendo texto A ou B. Estou defendendo que esta Casa discuta temas. Desça o cacete nas ideias, suba o tom do debate, mas vamos parar com os achincalhes de parte a parte", disse.

O texto precisava de maioria simples dos votos para ser aprovado, desde que confirmado o quórum mínimo de 257 deputados em plenário. Ou seja, metade mais um dos votos dos parlamentares que registraram presença na sessão.

O deputado André Fufuca (PP-MA), líder do partido de Lira, foi o primeiro a endossar o pedido de adiamento.

Segundo ele, o relator havia recebido mais de 90 emendas ao projeto. Outros líderes de partidos aliados do governo endossaram o adiamento.

O PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro, preferiu, no entanto, pedir que o projeto fosse votado logo. Altineu Côrtes (RJ), líder do PL, cobrou de Lira uma previsão para a proposta ser votada.

O relator da proposta disse que serão necessárias mais duas semanas para trabalhar no novo texto. O prazo está vinculado à ausência do próprio Lira, que viaja no dia 4 para os Estados Unidos e só retorna no dia 10.

Antes do início da sessão, nem governo nem oposição, em lados opostos, afirmavam ter votos suficientes para aprovar ou barrar o texto. As bancadas, contudo, evitaram cravar o número de votos que teriam.

Proposta do PL das fake news

O projeto busca estabelecer a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet e prevê novas regras de uso para redes sociais, ferramentas de busca e aplicativos de mensagem instantânea.

O texto do relator tem 16 capítulos que tratam de responsabilização e regulação das plataformas até o uso de redes sociais por crianças e adolescentes.

O PL das Fake News prevê regras para plataformas digitais com mais de 10 milhões de usuários mensais no País.

O texto define como crime o ato de promover ou financiar, por meio de conta automatizada, a divulgação em massa de mensagens que contenham fake news sobre eleição ou que possam causar danos à integridade física. A pena é de 1 a 3 anos de prisão e multa.

A proposta define que as plataformas precisarão ter um nível elevado de privacidade, proteção de dados e segurança para crianças e adolescentes.

Devem impedir o uso pelo público desta faixa etária quando os serviços não forem desenvolvidos para eles. As empresas ficarão proibidas de monitorar o comportamento das crianças e adolescentes para direcionar anúncios publicitários para esse público.

Outro trecho destaca que as empresas deverão ter representação no País, com identificação e informações facilmente acessíveis em seus sites.

O representante deverá ter poderes para, por exemplo, cumprir determinações judiciais e fornecer informações às autoridades competentes.

Até semana passada, o projeto previu a criação de uma entidade autônoma de supervisão das plataformas digitais, que seria feita pelo Poder Executivo. O trecho foi retirado do texto após críticas.

Ofensiva das big techs contra PL das fake news

Na segunda-feira passada, 1º, as big techs, como o Google, iniciaram uma ofensiva digital com anúncios e restrição de buscas pelo termo "PL das Fake News". A iniciativa gerou a reação do governo.

No final da manhã, o líder do Governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), acusou o Google de adotar uma "posição criminosa" na discussão do projeto. Ele defendia a votação e alegava ter votos para aprovar. "Acho que tem que votar, acabar com essa chantagem, essa ação criminosa das plataformas contra a Câmara e contra as crianças", disse.

Já o líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes, defendeu uma alternativa ao projeto, enquanto deputados bolsonaristas se revezavam no plenário com críticas ao texto.

"Esse é o projeto da censura", declarou a deputada Bia Kicis (PL-DF). O discurso foi reeditado por outros integrantes do PL. Uma enxurrada de mensagens foi postada no canal do YouTube da própria Câmara com ataques ao projeto.

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE) usou suas redes sociais para reforçar a defesa à aprovação do PL. Autor do texto aprovado originalmente no Senado em junho de 2020 e agora em tramitação na Câmara, ele argumentou que as críticas à proposta não apontam problemas.

Segundo o parlamentar, o que ocorre é a divulgação de mentiras e manipulação feita por "criminosos, plataformas e políticos irresponsáveis".

"O mais triste neste debate sobre o PL 2630 é que as críticas não apontam nenhum problema concreto no texto ou alternativas reais para proteger o ambiente digital", disse em uma rede social.

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