Mesmo sendo a maioria, mulheres enfrentam machismo no mundo dos games

Além de, quase sempre, não se enxergarem na tela enquanto personagens, elas também se sentem isoladas por uma cultura machista que tenta excluí-las do processo criativo

Foto: Divulgação/Game Jam
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Apesar de representarem mais da metade dos jogadores de games no País (53,6%), segundo pesquisa realizada pela Game Brasil, as mulheres ainda sofrem com a falta de representatividade na área. Além de, quase sempre, não se enxergarem na tela enquanto personagens, elas também se sentem isoladas por uma cultura machista que tenta excluí-las do processo criativo.

Catarina Macena, designer de jogos e idealizadora do Game Jam, evento voltado apenas para mulheres gamers, explica que o espaço, em geral, ainda é masculino. “A mulher é, muitas vezes, menosprezada. As personagens são na maioria das vezes hipersexualizadas. Ou seja, as manifestações de machismo no mundo dos games não são diferentes das que a gente já vê no dia a dia, independente da área”, afirmou.

A indústria de videogames se comercializa inequivocamente como um clube para meninos. Como resultado, a entrada das mulheres neste espaço se torna mais complicada. Porém, as garotas sempre jogaram e graças ao crescimento da indústria de jogos móveis, em particular, tem sido impulsionado por uma base de consumidores do sexo feminino.

Foto: Divulgação/Game Jam
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A estudante de jornalismo Luciana Serao, 23 anos, começou a jogar por influência do irmão, quando tinha apenas quatro anos. “Desde então, minha paixão por jogos eletrônicos foi crescendo cada vez mais, com o passar dos anos e dos lançamentos na área. Minha preferência sempre foi por jogos de console, porém, há uns anos comecei a migrar um pouco para o computador a fim de acompanhar meu amigos em seus jogos online”, contou. 

Elas percebem que jogos que, de alguma forma, dialogam com o público feminino, costumam ser vistos como produtos menores. Luciana conheceu o machismo no universo virtual quando passou a jogar jogos comercializados para homens. “Em partidas de jogos como League of Legends e Overwatch, foi que eu descobri o machismo. Acontecia de às vezes eu sofrer na mão de amigos dos meus amigos, que se juntavam para jogar conosco”, contou.

A história se repete para a estudante universitária Lavínia Paganini, que entre sua convivência nesse universo se encontrou em situações constrangedoras. “Jogar online é meio complicado porque tem dois extremos de reações: ‘Eita é menina…’ e ‘Aff, é por isso que tá sendo um lixo pô, é menina’”, desabafa.

Entre 2014 e 2015, os abusos online se tornaram tema de discussão. Em um episódio conhecido com Gamegate, mulheres e homens reclamaram publicamente desse tipo de assédio. Por causa da estranheza de ver uma jogadora em um mundo considerado ‘seu’, homens usam formas de expulsá-las das partidas. “O homem geralmente atrapalha sua partida inteira e tem até o apoio de outras pessoas, gerando muito estresse e você pode não voltar a jogar por um tempo”, explica Lavínia Paganini.

Videogames com protagonistas femininas ainda estão em minoria, e até mesmo ser capaz de jogar como mulher, muitas vezes ainda é considerado uma estranheza por desenvolvedores e editores. Segundo dados divulgados pela empresa Entertainment Software Association (ESA), em 2014, 10% das desenvolvedoras de games no Brasil são mulheres.

SEXUALIZAÇÃO

Como já comentado, a indústria de videogames, historicamente, representa a mulher por um viés sexualizado. Mas será que a presença feminina nos videogames ficou melhor com o passar do tempo? A história indica que as mulheres começaram a aparecer em jogos de videogame em meados dos anos 1980. Essas personagens eram distinguíveis dos masculinos apenas por pequenas características, como cílios longos. Apenas em 1986, a primeira personagem mulher, chamada de Samus Aran, surgiu.

 

 

A chegada da personagem Lara Croft, nos anos 1990, apresentou o que agora é considerado uma das primeiras personagens femininas fortes, não apenas nos videogames, mas na mídia em geral. No entanto, Lara foi retratada em calças apertadas e tops que mostravam a barriga, o que fez algumas pessoas afirmarem que o foco não era sua força, mas sua sexualidade. Também houve queixas sobre os seios anormalmente grandes da personagem.

Poucos anos depois da sua primeira apresentação, a personagem Lara Croft obteve uma reforma que dura até hoje. Ela agora usa uma camisa e uma calça, continuando o papel de uma forte heroína. Catarina Macena acredita que a explicação para casos como o de Lara é que não só o mercado de artistas é ocupado predominantemente por homens, mas também os maiores cargos de liderança.

“Não falo somente dos artistas, mas o fato de a maioria dos cargos de liderança ser ainda ocupados por homens tem sua parcela de contribuição para essa representação das personagens femininas que as reduz a objetos sexuais. Ou seja, parte da indústria é formada por homens que criam visando um público formado por outros homens”, lamenta a gamer.

Teresa Lynch, pesquisadora de mídia na Universidade de Indiana, completou um projeto de doutorado no qual avaliou 571 personagens femininas jogáveis em videogames lançados de 1989 a 2014. Lynch procurou indicadores que explicassem como seios enormes e cintura minúscula são ‘desenhadas’ para personagens femininas.

Ela descobriu que a sexualização extrema das mulheres atingiu seu ponto mais alto em 1995 e depois declinou. No entanto, ainda há problemas com as mulheres sendo mostradas apenas em papéis secundários e objetivadas mais do que seus homólogos masculinos. “O setor de jogos enfrentou um grande declínio”, disse Teresa. “Estão percebendo que está marginalizando a metade da audiência por fazer as personagens das mulheres passarem para o olhar masculino”.

CONTRA O ASSÉDIO

 

 

Muitas jogadoras de videogame ainda sofrem com preconceito, mesmo as pesquisas nacionais e internacionais apresentarem que o público feminino corresponde por quase metade do mercado. Para não passar por algum constrangimento, mulheres optam por avatares ou nomes masculinos durante as partidas online. Estudos sobre o tema encontraram percentuais de jogadoras vítimas de assédio durante partidas online que variam de 60% a 100%.

Pensando nisso, a ONG norte-americana Wonder Women Tech (WWT) lançou a campanha #MyGameMyName para que as mulheres não tenham que esconder o seu gênero. O órgão sugeriu que os jogadores mais famosos do mundo usassem os nomes de mulheres próximas, como mães, irmãs e namoradas, e assim se sentissem como é estar no lugar das mulheres.

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