Garganta da Serra. O nome da trilha é sugestivo e já dá uma ideia da aventura que literalmente engole os que desafiam a Serra do Ponto, em Brejo da Madre de Deus, no agreste, cujo pico é considerado pelo IBGE o ponto mais alto de Pernambuco, a 1.195 metros de altura. O cume pode ser acessado por vários caminhos, sendo o mais difícil justamente o da garganta que por exigir grande esforço físico e a utilização de diferentes técnicas e equipamentos é considerada pelos especialistas como a mais desafiadora de Pernambuco. Prontos então para deglutir essa aventura?
Antes de tudo é importante entender porque essa “goela” da imponente formação rochosa exige tantos dos trilheiros. Da base até o topo da Serra do Ponto são quase 600 metros de desnível em percurso de 4,5 km repleto de obstáculos. Os números em si não chegam a impressionar e de fato o tamanho do trajeto não é o problema e sim as condições em que ele é feito. O solo é extremamente acidentado e o caminho é feito por enormes blocos de pedra, raízes espessas e gigantes troncos de árvores. Todos esses obstáculos são utilizados para a ancoragem, como se fossem corrimões na subida. Por isso, a necessidade da prática da “escalaminhada”, uma mistura de escalada e caminhada em que os braços e pernas são cobrados o tempo todo, em alguns momentos exaustivamente.
“A Garganta da Serra realmente é a trilha mais técnica de Pernambuco, para muitos a mais difícil também. Ela é classificada como nível cinco que é o mais alto por isso é importante estar com o condicionamento físico em dia. Ela é uma trilha muito técnica porque exige força e cuidado, nela você precisa usar bastante os braços e as pernas. Mas apesar dessas exigências e ela oferece um caminho lindo e no pico você ganha de presente o visual único do ponto mais alto de Pernambuco”, afirmou Djair Pedro, um dos sócios da D’Trilhas, uma agência pernambucana especializada em trilhas e ecoturismo, com a qual a Coluna Turismo de Valor encarou a aventura.
A equipe deles é extremamente técnica e capacitada, composta inclusive por guias locais da agência Heraldo Turismo. Além do excelente material humano, ela também conta com diversos equipamentos de segurança, como cordas, estribos e mosquetões para dar mais segurança aos aventureiros, sem contar os kits de primeiros socorros, radiocomunicadores e apoio externo para possíveis socorros ou resgates. “Nós somos extremamente rigorosos quanto à segurança e utilizamos todos os recursos necessários para que as pessoas apenas desfrutem do trajeto. E a garganta te dá uma grande lição de superação. Olhando lá debaixo para a serra, algumas pessoas podem se impressionar com o tamanho e achar que não conseguem, mas no final todos atingem o pico, é só acreditar”, garantiu Daniel Pereira, outro sócio da agência.
Bom, mas vamos lá para a temida (ou melhor amada pois é cada vez mais procurada) trilha da Garganta da Serra. A trilha se inicia por volta das 12h30 com um trajeto de 1,6 km no terreno plano e empoeirado num sol castigante, só um aperitivo do que está por vir. Depois o grupo adentra a mata fechada e é esta densa vegetação que protege o grupo dos raios solares durante quase toda a subida, proporcionando um clima um pouco mais úmido e ameno para o grande esforço a seguir. E realmente ele não pequeno não. No começo o desnível nem é tão acentuado, mas na medida em que vai se adentrando na mata a subida vai ficando cada vez mais íngreme e com mais obstáculos naturais. O grupo realmente age como tal e todo mundo se ajuda o tempo todo. Óbvio que várias paradas são realizadas para o grupo descansar, lanchar e se hidratar. Mesmo assim é natural que uma ou outra pessoa sinta um pouco mais o esforço e até tenha câimbras, algo absolutamente normal devido ao desgaste da subida.
A analista técnica de química de petróleo Nálen Avelino de 31 anos foi um grande exemplo. Ela sempre praticou esportes de aventura e em março deste ano enquanto fazia uma trilha de bicicleta foi atropelada por uma moto. Ele fraturou a clavícula e teve luxação no quadril. Após seis meses de recuperação, ela decidiu voltar a se aventurar justamente na trilha da garganta da serra. “Há muito tempo eu desejava fazer esse trajeto e então resolvi me desafiar. Realmente é uma trilha muito técnica, mas consegui me superar e o trajeto é realmente incrível. Vale muito a pena e indico a todos!”, disse Nálen.
Não se trata de uma corrida contra o tempo ou desafio para vencer a natureza. Pelo contrário, a trilha faz com que você dê mais valor ao tempo e faça dele um amigo, além de aprender a interagir com a natureza de uma forma diferente. Por isso, sem pressa e respeitando o meio ambiente, o grupo leva em média quatro horas para concluir o trajeto. E quando se atinge o topo mais alto do Estado, a 1.195 metros de altura, com uma visão espetacular do por do sol no agreste pernambucano, todo o esforço é plenamente recompensado. No dia da reportagem bem no horário do crepúsculo, o tempo subitamente mudou com uma chuva forte e nem assim o visual arrebatador foi comprometido.
E se engana quem pensa que a aventura termina ali. Depois é hora de colocar as lanternas para funcionar e fazer o caminho de volta à noite, mas por um trajeto de quase 5 km mais seguro e aberto, de nível fácil. No total, as pessoas percorrem durante todo o dia cerca de 11 km em um caminho inesquecível de literalmente altos e baixos em Brejo da Madre de Deus. O alto, claro, representa o famoso cume, e o baixo, diz respeito somente a sensação pós-aventura de ficar pra baixo pela trilha ter acabado e já desejar outra.