Conteúdo verificado: Publicações afirmam que vídeo de motoristas de caminhão-pipa descartando grande volume de água mostra pessoas contratadas pelo governo do Ceará para sabotar canal recém-inaugurado pelo presidente Jair Bolsonaro no estado.
É falso que um vídeo compartilhado mais de 18 mil vezes em redes sociais mostre “pipeiros contratados pelo governo” do Ceará, dirigido pelo PT, descartando água retirada de um canal inaugurado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no estado. A gravação, na qual uma mulher mostra motoristas de caminhões-pipa jogando fora um grande volume de água, foi feita em junho de 2017 no município de Pariconha, Alagoas, mais de um ano antes da eleição de Bolsonaro.
Os motoristas gravados nas imagens faziam parte da Operação Carro-Pipa, coordenada pelo Exército em Alagoas para distribuir água potável às populações rurais e urbanas atingidas por estiagem na região. Após a primeira viralização do vídeo, em 2017, eles foram descadastrados do programa, como informou ao Comprova o batalhão responsável pelo projeto.
Para iniciar esta verificação, realizamos buscas reversas no Google Imagens por capturas de tela do vídeo associadas a palavras-chave identificadas na gravação. Essa pesquisa levou a um artigo publicado em 1º de junho de 2017 no portal alagoano Correio Notícia, ilustrado com as imagens viralizadas.
Segundo a reportagem, o vídeo havia sido gravado na época em uma área próxima ao Canal do Sertão, em Pariconha, Alagoas. Com base nessas informações e com o intuito de localizar a pessoa responsável pela gravação, buscamos publicações feitas no Facebook em junho de 2017 com os termos “água” e “canal do sertão”.
Essa busca levou a uma publicação feita às 10h21 do dia 1º de junho de 2017 por um morador do município alagoano de Piranhas, localizado a 56km, cerca de uma hora de carro de Pariconha. “Olha minha gente so pq está chovendo sertão o qui estão fazendo com a nossa água [sic]”, dizia a postagem. “o qui o exército está fazendo qui não fiscalizar isso minha gente [sic]”, continuava o texto.
O Comprova entrou em contato com o usuário para solicitar informações sobre a gravação, mas não obteve resposta até o fechamento deste texto.
Em seguida, procuramos a Prefeitura de Pariconha, que confirmou que as imagens foram gravadas no município alagoano em junho de 2017. Também foi consultado o 59º Batalhão de Infantaria Motorizada do Exército, que informou que os motoristas eram cadastrados na Operação Carro-Pipa, mas foram desligados após a viralização do vídeo.
Para reiterar a conclusão, consultamos imagens do Canal do Sertão disponibilizadas no Google Maps em busca de semelhanças com o cenário retratado no vídeo.
Um vídeo em que uma mulher filma dois motoristas de caminhão-pipa descartando um grande volume de água em uma área rural foi amplamente compartilhado no Facebook e no Twitter como se mostrasse “pipeiros contratados pelo governo demoníaco do Ceará” pegando água “do canal inaugurado pelo presidente para jogar fora”. “Essa esquerda maldita é o câncer da sociedade”, dizem algumas das postagens.
O conteúdo ganhou força após o presidente Jair Bolsonaro inaugurar, no final de junho, um trecho da obra de transposição do Rio São Francisco no Ceará, estado governado por Camilo Santana, do PT.
O vídeo não é, contudo, atual, nem retrata uma tentativa do governo cearense de sabotar a obra inaugurada por Bolsonaro.
Uma busca reversa no Google por capturas de tela da gravação associadas a palavras-chave identificadas no vídeo levou a um artigo publicado em 1º de junho de 2017 pelo portal Correio Notícia. O texto diz que o “flagrante ocorreu no sítio Rolas, zona rural de Pariconha, bem ao lado do Canal do Sertão”, em Alagoas. O vídeo foi publicado na mesma data no canal do site de jornalismo no YouTube.
De fato, na gravação é possível escutar a mulher que faz a denúncia cobrando um posicionamento do Exército de Maceió, capital do Alagoas, e afirmando: “Isso aqui é o Canal do Sertão”.
As informações também foram publicadas em outra reportagem, no mesmo dia, no site GazetaWeb.
Uma análise das imagens do Canal do Sertão disponíveis no Google Maps permitiu identificar semelhanças com o vídeo compartilhado nas redes, como as pontes de cor laranja destacadas na comparação abaixo:
Para confirmar o local e a data da gravação, o Comprova entrou em contato com a Prefeitura de Pariconha, que informou que o vídeo efetivamente foi gravado “entre os municípios de Pariconha e Delmiro Gouveia” em junho de 2017.
A Prefeitura afirmou, ainda, que não puniu os motoristas de carro-pipa na época, porque seus contratos seriam de responsabilidade do Exército.
Com esta informação, o Comprova procurou o 59º Batalhão de Infantaria Motorizada do Exército, responsável pela Operação Carro-Pipa em Alagoas, que reiterou que as imagens datam de junho de 2017.
“Naquela ocasião, os Pipeiros alegaram que tiveram um problema mecânico e o peso do caminhão estava impossibilitando de prosseguir viagem”, afirmou um porta-voz do batalhão ao Comprova por e-mail. “Todas as medidas administrativas foram tomadas e os Pipeiros foram descadastrados da Operação Carro-Pipa”, completou.
O Projeto Comprova faz a verificação de conteúdos virais sobre políticas públicas do governo federal. Neste caso, o vídeo de motoristas de caminhão-pipa descartando água obteve mais de 18 mil compartilhamentos no Facebook, Twitter e Instagram, somando mais de 265 mil visualizações em menos de 24 horas.
O conteúdo, encaminhado por leitores do Comprova, circula no momento em que as ações de infraestrutura hídricas do governo Bolsonaro estão em alta, com a recente inauguração do Eixo Norte do Projeto de Integração do Rio São Francisco — obra iniciada no segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2010).
A conclusão de parte do projeto durante o governo Bolsonaro, opositor público do PT, gerou debates sobre quem seria responsável pela obra, desencadeando outras desinformações verificadas pelo Comprova.
A alegação de que o vídeo dos caminhões-pipa seria atual também foi checada pela Agência Lupa.
Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Texto produzido pelo Comprova, coalizão de veículos de imprensa para checar conteúdo viral nas redes sociais. Investigado por: AFP e Band News FM. Verificado por: Jornal do Commercio, UOL, SBT e O Estado de S. Paulo.