Conteúdo verificado: Tuíte do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) com um vídeo do prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), anunciando a inclusão da cloroquina no protocolo de tratamento de pacientes com covid-19 nos hospitais municipais.
É enganoso o post no perfil do Twitter do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) que apresenta um vídeo no qual o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), anuncia a inclusão da cloroquina no protocolo de tratamento da covid-19 na cidade de São Paulo. E, no texto que acompanha o vídeo, diz: “Resta saber se Doria também cairá na real de que vidas estão acima de política, que para uma doença nova não existe remédio testado e que toda tentativa de cura é válida”. A Secretaria Estadual da Saúde já libera o uso da cloroquina para casos graves de covid-19, de acordo com a avaliação do médico, desde 5 de maio.
O trecho, publicado no dia 30 de julho, é de uma gravação de 9 de abril e traz o anúncio feito à época por Covas, durante coletiva de imprensa realizada no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. Ao publicá-lo, Eduardo Bolsonaro dá a entender que a adoção do protocolo ocorreu agora.
O protocolo, que só foi publicado em 17 de junho, orienta os profissionais de saúde da rede pública municipal sobre o manejo de pacientes com covid-19. Nele, o uso de cloroquina não é recomendado, mas é autorizado — desde que obedecendo critérios médicos e com aval do paciente.
Tentamos entrar em contato com o deputado Eduardo Bolsonaro, mas não tivemos resposta até a publicação desta verificação.
Uma verificação já publicada pelo Comprova esclareceu que o anúncio da adoção da cloroquina como parte do protocolo de tratamento da covid-19 na cidade aconteceu no dia 9 de abril. Uma busca no Google confirmou a informação. Com essa data, encontramos o vídeo original no canal do governo do estado de São Paulo no YouTube.
O vídeo editado tem uma marca d’água com o nome do deputado federal Luiz Lima (PSL-RJ) e o endereço de suas redes sociais. Na página de Facebook de Lima encontramos uma postagem com as imagens, datada do dia 9 de maio.
Pesquisamos a recomendação para o tratamento de pacientes com covid-19 no site da Prefeitura de São Paulo e da Secretaria Municipal da Saúde. Também consultamos a página da Secretaria Estadual da Saúde (SES-SP) para esclarecer qual é a orientação do estado em relação ao uso da cloroquina. Os dados sobre o número de casos confirmados e de mortes são do boletim da Secretaria Municipal da Saúde.
As ferramentas Tweetdeck e CrowdTangle foram úteis para mostrar a viralização do conteúdo investigado pelas redes sociais.
Por fim, entramos em contato por e-mail com a assessoria de imprensa do prefeito Bruno Covas, que respondeu ao Comprova e esclareceu que a Secretaria Municipal de Saúde não recomenda, mas permite a uso do medicamento na rede hospitalar, mediante prescrição médica e consentimento do familiar ou paciente. E acrescenta que, apesar de o Ministério da Saúde ter ampliado o uso da cloroquina para casos leves e moderados, a Secretaria Municipal da Saúde emitiu recomendação contrária, “em virtude da ausência de evidências científicas robustas que justifiquem tal indicação”. Também tentamos entrar em contato com o deputado Eduardo Bolsonaro por mensagem de WhatsApp e no Instagram, mas não tivemos resposta até a publicação desta verificação.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 31 de julho de 2020.
A equipe do Comprova começou a verificação analisando o vídeo publicado pelo deputado Eduardo Bolsonaro. Bruno Covas está no saguão do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. O logotipo da administração estadual pintado no púlpito junto à hashtag #FiqueEmCasa mostra que as imagens foram captadas em uma das entrevistas coletivas conduzidas pelo governador João Doria para atualizar a situação da pandemia. Chama a atenção o fato de que Covas não está de máscara. O uso do equipamento de segurança é obrigatório em locais públicos no estado desde 4 de maio, mas a gravação aconteceu antes dessa data.
Em junho, o Comprova já tinha desmentido uma postagem no Twitter que dizia que a cloroquina era proibida na capital paulista. Na ocasião, informamos que a Secretaria Municipal da Saúde incluiu a cloroquina no protocolo de tratamento da covid-19 em 9 de abril. Buscando por essa data, encontramos o vídeo original no canal do governo do estado de São Paulo no YouTube.
“Ainda não é possível ser uma política pública, pois não temos ainda pesquisas concluídas, mas havendo prescrição do médico e a concordância do paciente, a Secretaria Municipal de Saúde passou a integrar esse medicamento [cloroquina] no protocolo de tratamento da covid-19”, anunciou o prefeito aos 39 minutos.
O protocolo entrou em prática logo depois do anúncio. Apenas no dia 17 de junho uma recomendação técnica foi publicada detalhando o uso da medicação. O documento sugere uma “análise criteriosa do quadro clínico, o monitoramento do paciente, da resposta em relação à terapêutica selecionada e as reações adversas”. E indica a prescrição de drogas para o tratamento dos sintomas em diferentes momentos da infecção pelo novo coronavírus.
O protocolo da prefeitura autoriza, mas não recomenda, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina. A prescrição deve ocorrer de acordo com o critério do médico e com consentimento do paciente. “Em virtude da ausência de evidências científicas robustas que justifiquem tal indicação. A deliberação ainda recomenda que o uso em casos graves sob regime hospitalar não seja de rotina”, alerta a publicação.
O documento segue a posição da Secretaria Estadual da Saúde, que em 5 de maio orientou que o uso das drogas “não seja expandido para casos leves e moderados em acompanhamento ambulatorial. Em 20 de maio, o Ministério da Saúde estendeu o uso da cloroquina para pacientes com sintomas leves. O Conselho Municipal de Saúde de São Paulo criticou a decisão em uma nota técnica divulgada oito dias depois.
De lá para cá a situação se agravou na capital paulista. De acordo com o Boletim Epidemiológico do município, em 9 de abril o município registrava 5.832 casos de covid-19, com 386 óbitos. No dia 30 de julho, data em que Eduardo Bolsonaro postou o vídeo, já havia 223.571 casos e 9.547 óbitos confirmados.
O vídeo editado compartilhado por Eduardo Bolsonaro tem uma marca d’água com o nome do deputado federal Luiz Lima (PSL-RJ) e o endereço de suas redes sociais. Na página de Facebook de Lima encontramos uma postagem com as imagens, datada do dia 9 de maio — um mês depois do anúncio. Naquele momento, a cidade de São Paulo registrava 27.414 casos de covid-19 e 2.268 mortes, de acordo com o boletim da Secretaria Municipal da Saúde. O número de óbitos que aparece no vídeo editado é menor, 2.106. Essa diferença pode acontecer por causa dos casos positivos confirmados posteriormente e somados à estatística.
Até o momento, não há comprovação científica da eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento ou prevenção da covid-19. Pelo contrário, estudos publicados no Journal of the American Medical Association (Jama) e no British Medical Journal (BMJ) apontaram que pacientes tratados com cloroquina e hidroxicloroquina não tiveram melhores resultados que aqueles que não receberam os mesmos remédios. Uma pesquisa realizada em 55 hospitais brasileiros e publicada no New England Journal of Medicine (NEJM) chegou às mesmas conclusões.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o National Health Service no Reino Unido cancelaram estudos com cloroquina e hidroxicloroquina.
Em 17 de julho, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) publicou um informe em que afirma ser “urgente e necessário que a hidroxicloroquina seja abandonada no tratamento de qualquer fase da covid-19” diante das novas evidências científicas.
A posição dos médicos não mudou a opinião do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que defende a adoção da cloroquina desde o começo da pandemia. Ele teve covid-19 e declarou que tomou cloroquina para se tratar. Hoje, o Ministério da Saúde tem quatro milhões de comprimidos em estoque.
O Comprova já verificou diversos conteúdos que defendiam o uso da cloroquina, como estudos sem comprovação científica e declarações polêmicas de médicos.
O Comprova verifica informações sobre políticas públicas do governo federal e a pandemia de covid-19 sempre que os conteúdos tenham grande viralização. É o caso do tuíte do deputado federal Eduardo Bolsonaro, que até a data de publicação teve mais de 16 mil interações e 84 mil visualizações do vídeo incluído na postagem.
A cloroquina e a hidroxicloroquina se tornaram objeto de discursos políticos desde que os presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e do Brasil, Jair Bolsonaro, passaram a defender essas drogas como cura para a covid-19. A postagem de Eduardo se insere nesse contexto, ao insinuar que a prefeitura de São Paulo estaria “atrasada” na adoção da hidroxicloroquina em relação ao governo federal.
O fato de Bruno Covas ser o alvo é relevante, pois ele é um aliado político do governador de São Paulo, João Doria. No início da pandemia, as medidas de distanciamento social também foram objeto de disputa, pois Bolsonaro se opôs às regras, contrariando recomendações de autoridades de saúde nacionais e estrangeiras.
Nesse ponto, Doria se tornou antagonista do presidente e virou alvo de críticas de seus apoiadores. No auge da disputa, o governador chegou a afirmar que o presidente “despreza vidas” e deveria começar “a ser um líder, se for capaz”. Bolsonaro, por sua vez, acusou Doria de usar a crise como palanque para as eleições presidenciais de 2022 e chamou o governador de São Paulo de “bosta” em reunião ministerial tornada pública.
Enganoso, para o Comprova, é todo o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. É o caso do vídeo com as declarações de Covas que, apesar de verdadeiro, é antigo.
Texto produzido pelo Comprova, coalizão de veículos de imprensa para checar conteúdo viral nas redes sociais. Investigado por: SBT e Band News FM. Verificado por: Jornal do Commercio, Folha de S. Paulo, Nexo Jornal, UOL, Revista Piauí e O Estado de S. Paulo.