AGENDA 2030: Relatório aponta que Brasil retrocede em mais de 100 metas de desenvolvimento sustentável da ONU

Documento mostra impactos mais profundos sobre as mulheres e meninas, população negra, povos indígenas e grupos sociais historicamente mais vulneráveis
Cinthya Leite
Publicado em 25/09/2023 às 15:34
O Relatório Luz destaca os ODS que foram mais afetados pelos retrocessos: ao lado do combate à pobreza e erradicação da fome, está o avanço do desmatamento e das queimadas Foto: FERNANDO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASIL


Mais de 100 metas da Agenda 2030 no Brasil estão em situação de retrocesso, segundo o 7º Relatório Luz, lançado na tarde desta segunda-feira (25). 

A Agenda 2030 é um plano de ação para as pessoas, o planeta e a prosperidade, que busca fortalecer a paz universal. O compromisso foi assumido por líderes de 193 países, inclusive o Brasil, e coordenada pelas Nações Unidas (ONU). 

O plano indica 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os ODS, e 169 metas, para erradicar a pobreza e promover vida digna para todos. No Brasil, segundo o relatório (leia mais detalhes abaixo), 60,35% dessas 169 retrocederam em 2022. 

O evento de lançamento da sétima edição do Relatório Luz sobre a Agenda 2030 no Brasil acontece no auditório do anexo I da Secretaria Geral da Presidência da República, em Brasília, e contou com representantes de ministérios e da sociedade civil.

O Relatório Luz 2023 é um documento único no País que faz uma análise do cumprimento das metas da Agenda 2030 no Brasil, com base em dados oficiais divulgados pelo Governo Federal.

Nesta edição, o relatório mostra que:

  • 102 metas (60,35%) estão em situação de retrocesso
  • 14 (8,28%) ameaçadas
  • 16 (9,46%) estagnadas em relação ao período anterior
  • 29 (17,1%) com progresso insuficiente
  • 3 (1,77%) com progresso satisfatório
  • 4 (2,36%) delas sem dados suficientes para classificação
  • 1 (0,59%) não se aplica ao Brasil

O documento traz um compilado da situação dos ODS, consolidando um ciclo de retrocessos referente ao ano de 2022, com impactos mais profundos sobre as mulheres e meninas, população negra, povos indígenas e grupos sociais historicamente mais vulneráveis, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.

O relatório destaca os ODS que foram mais afetados pelos retrocessos: ao lado do combate à pobreza e erradicação da fome, está o avanço do desmatamento e das queimadas.

O Relatório Luz 2023 destaca o ciclo de empobrecimento de parte significativa da população e volta do País ao Mapa da Fome e que o ano de 2022 marcou um período de seis anos em que os poderes Executivo e Legislativo federais tiveram um papel desastroso em relação ao cumprimento do ODS, que é erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável. Em 2022, quase 66 milhões de pessoas (30,7% da população) viviam em insegurança alimentar moderada ou grave.

No quesito saúde e bem-estar, correspondente ao ODS 3, o relatório ressalta que o orçamento de 2022 do Ministério da Saúde sofreu redução de 20%, passando dos R$ 200,6 bilhões em 2021 para R$ 160,4 bilhões.

Nos dois primeiros anos da pandemia, o orçamento da Saúde foi elevado com decretos extraordinários e de calamidade pública que flexibilizaram o teto de gastos (Emenda Constitucional 95).

Porém, as verbas de urgência não se repetiram em 2022, o que ameaçou ainda mais a qualidade e disponibilidade dos serviços de saúde no País.

Embora 80,56% da população tenham tomado ao menos duas doses do imunizante contra o coronavírus, a cobertura nacional das demais vacinas obrigatórias ficou em 67,94%, com patamar ainda menor nas Regiões Norte (63,03%) e Sul (74,21%). Esse contexto fez com que a maioria das metas do ODS 3 estejam em retrocesso ou ameaçadas.

Para o ODS 4 (educação de qualidade), o relatório identificou, em 2022, retrocesso em seis das 10 metas deste ODS, também ameaçado pelo Novo Ensino Médio, que rebaixa a formação básica para grupos populacionais mais vulneráveis e historicamente marginalizados (negros, mulheres, classes C, D e E e indígenas), segundo especialistas, instituições de classe e estudantes.

O governo federal anunciou o fim do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares até o fim de 2023, mas o Estado de São Paulo, por exemplo, pretende implementar programas similares. Essa e outras propostas em debate no Congresso Nacional, como nacionalização do homeschooling, ameaçam o direito à educação. Com 13 das 20 metas do Plano Nacional de Educação em retrocesso, estima-se que 90% delas não serão alcançadas em 2024.

MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL - A universalização efetiva do direito à água e ao saneamento carece de uma política de Estado, que priorize o acesso para populações marginalizadas e em situação de vulnerabilidade

No capítulo do relatório referente ao ODS 5 (igualdade de gênero), destaca-se que o Brasil é o 92° de 153 países no ranking de garantia de equidade para mulheres, tendo retrocedido ainda mais em 2022 com os efeitos da pandemia da covid-19 e as múltiplas violências de gênero derivadas da insuficiência de políticas públicas e investimento no setor.

Como na quase totalidade dos ODS, as recomendações do último Relatório Luz não foram acatadas e, para encerrar o ciclo de retrocesso dos últimos anos, é necessária urgência na retomada de políticas e programas ao nível ministerial para mulheres. 

O Relatório Luz também mostra preocupação com o ODS 6 (água limpa e saneamento), já que é uma meta que impacta diretamente nove dos dezessete objetivos da Agenda 2030. No entanto, o ODS 6 retrocedeu: quatro de suas metas que estavam ameaçadas em 2020 passaram a situações de retrocesso e estagnação. 

Neste ano, o documento foi escrito por 82 especialistas de 41 instituições, que, além da análise dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) no Brasil, ainda produziram mais de 160 recomendações ao Governo.

AGENDA 2030 

O Brasil é um dos 193 países signatários da Agenda 2030, um pacto global assinado em 2015 nas Nações Unidas com o objetivo de diminuir as desigualdades.

O Relatório Luz 2023 é um instrumento que indica caminhos, sinaliza retrocessos e alerta para a necessidade da construção de instrumentos de gestão que promovam políticas voltadas para a equidade, de forma a não deixar ninguém pra trás.

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