Rua cidadã. É possível que você ainda não tenha escutado esse termo em suas rodas de conversa. Mas certamente esse é o sonho de todo pedestre. A rua cidadã é aquela na qual a pessoa anda sem tropeçar em buracos, os carros trafegam em baixa velocidade, as edificações não são cercadas por muros altos, árvores garantem sombra aos caminhantes, as paradas de ônibus são confortáveis e há bancos nas calçadas para quem quiser sentar e descansar.
“É o resultado do planejamento integrado da arquitetura, mobilidade, arborização, mobiliário e infraestrutura”, resume a arquiteta da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) Clarissa Duarte, que está desenvolvendo propostas de ruas cidadãs para a cidade do Recife. O estudo fica pronto em abril de 2017 e faz parte do Plano Centro Cidadão, uma parceria entre a Católica e o Instituto Pelópidas Silveira da prefeitura.
Uma amostra de rua cidadã poderá ser conferida antes desse prazo, na Rua do Príncipe, numa iniciativa da reitoria da Unicap com a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana e a Empresa de Urbanização do Recife. A proposta consiste em recuar o muro do antigo Colégio Nóbrega para alargar a calçada, num trecho de cem metros de extensão. O passeio público passaria de 2,40 metros de largura para 10,5 metros.
“Os jesuítas vão compartilhar um espaço privado com a cidade”, afirma a também arquiteta da Unicap Andréa Câmara, que divide com Clarissa a coordenação do Plano Centro Cidadão. Elas esclarecem que esse é o estudo inicial (e não um projeto pronto) da proposta de criação de uma Praça dos Estudantes, com parada de ônibus mais ampla, bancos estimulando áreas de permanência e iluminação pública.
Nenhuma árvore será derrubada e os fiteiros são mantidos e organizados. As barracas de lanche, observa Clarissa, ajudam a manter a segurança. “Elas têm um papel importante de vigilância social.” Andréa acrescenta que será sugerida a implantação de zona 30 (limite de velocidade) na Rua do Príncipe, das imediações da Celpe (Avenida João de Barros) até a Rua Bispo Cardoso Ayres.
Estão previstas duas travessias de pedestre com piso elevado, uma perto da Rua Afonso Pena e outra na frente do Nóbrega. A rua cidadã, explica Andréa, está inserida no contexto das rotas estratégicas cidadãs que estão sendo traçadas no plano e são formadas por ruas frequentemente usadas pela população para deslocamentos a pé.
Uma das rotas é formada pela Rua Fernandes Vieira (a partir do Parque Amorim), Rua Joaquim Felipe, Avenida João de Barros e Rua do Príncipe. É um roteiro repleto de obstáculos para os caminhantes, como calçadas quebradas, barracas de lanche, árvores de grande porte em passeios estreitos e muro alto gerando insegurança.
Nesse percurso, só no encontro das Ruas Nunes Machado, do Príncipe e Afonso Pena as arquitetas contaram 600 pessoas passando num intervalo de meia hora, em uma manhã. “A Afonso Pena é uma via muito utilizada, com muitas possibilidades de roteiros”, destaca Andréa.
Como exemplo, ela cita uma pessoa que sai do Colégio Salesiano, no bairro da Boa Vista, com destino ao Cemitério de Santo Amaro, à Unicap ou ao Parque 13 de Maio. “A probabilidade de ela passar pela Rua Afonso Pena é muito maior do que a de seguir pela Rua Bispo Cardoso Ayres”, afirma. A Rua do Príncipe congrega de 20 a 30 rotas que levam a equipamentos como o 13 de Maio, o Cinema São Luiz e o Shopping Boa Vista.
“Não nos guiamos, no estudo, pelo percurso dos carros, as rotas articulam espaços públicos entre si e com eixos do transporte de passageiros desapegadas do sentido do trânsito de veículos, são os caminhos dos pedestres”, destaca Clarissa. No Plano Centro Cidadão elas sugerem redução do número de vagas de estacionamento nas ruas, divisão equilibrada das ruas para todos os tipos de veículos, ciclorrotas, faixa azul e redução da velocidade dos carros, em busca de conforto e segurança para todos.
O secretário de Planejamento Urbano do Recife, Antônio Alexandre, avisa que a prefeitura tem interesse em melhorar as condições das rotas, para estimular deslocamentos a pé. “Porém, não se pode jogar a responsabilidade só sobre o poder público. Com estímulos e mecanismos de compensação, a iniciativa privada pode participar desse novo modelo de planejamento urbano. Muitas das soluções são ações simples”, afirma.