Violência: 60% dos homicídios no Grande Recife ocorrem em 35 localidades

Disputa pelo tráfico de drogas é a principal causa
Felipe Vieira
Publicado em 29/04/2017 às 17:14
Disputa pelo tráfico de drogas é a principal causa Foto: Diego Nigro/JC Imagem


A maior parte dos homicídios registrados na Região Metropolitana do Recife (RMR) segue um roteiro bem definido. São homens entre 18 e 30 anos, mortos por outros da mesma faixa etária, à noite, nos becos, vielas e descampados de comunidades de baixa renda. Em 70% dos casos, são vítimas da guerra do tráfico de drogas, de grupos de extermínio ou egressos do sistema prisional. Os 14 municípios da RMR foram responsáveis por 42,1% dos homicídios no Estado em 2016 e carros-chefes da volta de Pernambuco às manchetes nacionais negativas.

A novidade é que os assassinatos estão cada vez mais concentrados geograficamente. Segundo dados do governo do Estado, quase 60% das mortes violentas ocorrem em 35 localidades que, somadas, correspondem a apenas 2,6% da extensão territorial do Grande Recife. O principal motivo, de acordo com o governo, é a guerra entre grupos criminosos pelo controle de pontos de venda de drogas. Alegando razões operacionais, a gestão não divulga quais os locais onde mais se mata no Grande Recife. Mas as recentes operações integradas das Polícias Civil e Militar dão pistas de alguns dos pontos.

Bairros como Ibura e Cohab, na Zona Sul do Recife; Charneca, Charnequinha e Pirapama, no Cabo de Santo Agostinho; Cajueiro Seco, Muribeca e Cavaleiro, em Jaboatão dos Guararapes, estiveram entre os “ocupados” pelas forças de segurança desde o último dia 25 de março, quando tiveram início as operações policiais batizadas de Força no Foco, numa clara referência à incidência da criminalidade. A ideia é aumentar a ostensividade da Polícia Militar e a prisão de homicidas.

NÚMEROS

Alguns municípios já têm índices preocupantes em 2017. Somente nos três primeiros meses deste ano, Jaboatão registrou 113 homicídios. O número é pouco menos da metade dos 371 ocorridos na cidade durante todo o ano de 2016. E o perfil dos assassinados segue inalterado. São pessoas como Adelson José de Medeiros Júnior, de 27 anos. Ele foi executado na noite da última quarta-feira, na comunidade de Nova Divineia, no bairro de Cajueiro Seco. Tinha saído da prisão em agosto do ano passado, após cumprir dois anos de pena por tráfico de cocaína. O corpo foi encontrado em um descampado próximo ao local onde ele morava. Tinha dois tiros na cabeça, numa clara demonstração de execução. “Só este mês, aqui na nossa área, já são 35 homicídios”, disse, no cenário do crime, um policial do 6º Batalhão da Polícia Militar (BPM), que, junto com o 25º, cuidam dos municípios de Jaboatão dos Guararapes e Moreno.

 

 


Quase no mesmo horário, na localidade de Cosme e Damião, no bairro da Várzea, Zona Oeste da capital, Thiago Henrique da Silva, 18, era assassinado. O palco, uma ladeira de barro deserta. O modo: três tiros na região da cabeça, um deles desferido com a arma praticamente colada à bochecha, segundo os peritos. Mais uma execução. Apesar da pouca idade, segundo a PM, Thiago tinha duas passagens pelo sistema socioeducativo por roubo.

Por trás do morticínio, a realidade implacável do tráfico, principalmente de crack, que é consumido por 88% dos usuários de drogas no Estado. O ciclo é conhecido: sem escola, emprego, e com a oferta abundante do entorpecente na periferia, vem o vício. Os roubos surgem, na maioria, para suprir o consumo. “Uma pessoa viciada consome, em média, de dez a 15 pedras de crack por dia. O custo de uma pedra é R$ 10. Então, como se faz para conseguir de R$ 100 a 150 em um dia? Roubos, principalmente de celulares”, diz o secretário estadual de Planejamento e gestor do Pacto pela Vida, Márcio Stefanni. Segundo ele, 50% dos roubos registrados no Estado são relativos aos aparelhos de telefonia móvel.

Um outro exemplo: também na última quarta-feira, três homens roubaram um ônibus da linha Barro/Prazeres, no bairro do Ibura, Zona Sul da capital. Um deles, Mário Luís Laureano, de 18 anos, teve um mal súbito e morreu na descida do coletivo, com uma faca na mão, após recolher os celulares dos passageiros. “Ele estava fora de si, completamente transtornado”, comentou o cobrador do ônibus, que não quis de identificar. Segundo o Instituto de Medicina Legal (IML), a causa da morte só será conhecida em 30 dias, após exames laboratoriais.

Para estancar a criminalidade no Estado, a Polícia Civil aposta na descentralização das investigações. Desde o início de março, os casos menos complexos de homicídio ficam a cargo das delegacias distritais. Agora o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) cuida de casos envolvendo tráfico, grupos de extermínio e outras organizações criminosas. “São os homicidas por atacado. Estamos qualificando ainda mais as investigações e realizando prisões nos pontos críticos. Com isso, a tendência é de que os índices de assassinatos voltem a baixar”, comenta o chefe da Polícia Civil, Joselito Kehrle do Amaral.

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