Ele nasceu holandês, em 1631, com o nome de Forte Orange. Foi reconstruído pelos portugueses em 1696 e rebatizado de Fortaleza de Santa Cruz. Atravessou séculos, concorre ao título de Patrimônio da Humanidade da Unesco, passa por obra de restauração e em dezembro de 2017 estará novinho em folha para receber os visitantes da Ilha de Itamaracá, no Grande Recife.
Os primeiros resultados da obra de restauro da fortificação do século 17 já são perceptíveis nas muralhas, que voltaram à cor natural depois de lavadas; nas rampas de acesso aos baluartes, revestidas com pedras fabricadas de forma artesanal; nas cercaduras de portas e janelas, com a cantaria livre de camadas de pinturas; e nas telhas que cobrem as salas preparadas para, futuramente, abrigarem um museu.
Todas as pedras usadas no revestimento das rampas e no piso dos baluartes, do corredor de entrada e do terrapleno (área aterrada entre a muralha e a contramuralha) são fabricadas no canteiro de obra montado no Forte Orange, num trabalho medieval. “São pedras que desmoronaram da fortaleza, ficaram no chão e foram cobertas pela areia”, declara Regina Gaudêncio, sócia-administradora da empresa Concrepoxi Engenharia.
Desenterradas do entorno da edificação, as pedras são cortadas e preparadas manualmente, como se fazia no passado. “Além de manter a identidade histórica do forte, isso garante sustentabilidade financeira e ecológica à obra”, diz Regina Gaudêncio. Contratada para fazer a intervenção no prédio, a Concrepoxi iniciou o serviço em outubro de 2014 e está com 45 operários no local, para cumprir o prazo de execução.
Uma a uma, as salas do Forte Orange tiveram as telhas tipo canal retiradas, lavadas e devolvidas aos seus lugares. Para protegê-las de frequentes vazamentos de areia, a empresa instalou um forro (guarda-pó) de madeira abaixo do telhado. A contramuralha, antes escondida nas salas, está aparente em todas elas. “Encontramos tudo pintado e deixamos os vestígios da contramuralha expostos para as pessoas perceberem que não é uma parede.”
Apenas o ambiente adaptado para funcionar como sanitário teve de ser coberto com telhas novas, porque não havia peças antigas suficientes para cobrir todas as salas. Nas muralhas, lavadas com água e detergente especial, a empresa tirou cimentos de obras anteriores e aplicou biocida, substância para inibir fungos. Os organismos provocam porosidade na pedra e, consequentemente, perda de resistência.
Outra medida adotada é uma contenção de rip-rap (sacos de cimento e areia) no terrapleno, para evitar que a areia deslize e a muralha fique vulnerável, explica Regina Gaudêncio. “Tivemos de refazer trechos danificados da muralha.” O Forte Orange, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1938, pertence à União e está sob guarda do Iphan.
A obra de restauração, orçada em R$ 10,9 milhões, é feita com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo, numa parceria do Iphan com a Secretaria de Turismo, Cultura, Esportes e Lazer de Pernambuco. “Estamos em negociação com a Prefeitura da Ilha de Itamaracá para que ela assuma a gestão do forte, após a obra”, afirma o engenheiro do Iphan-PE Frederico Almeida.
Segundo ele, o projeto de museologia desenvolvido pelo Iphan está pronto, só faltam recursos para a implantação. A proposta prevê resgate de vestígios da construção holandesa de areia e tábua (taipa), que está por baixo do forte português, descobertos pelo Laboratório de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco numa escavação coordenada pelo arqueólogo Marcos Albuquerque em 2003.
Os arqueólogos localizaram a porta de entrada do forte de 1631 sob 1,2 mil toneladas de areia no terrapleno, a casa de pólvora e a cacimba que abastecia a tropa no período holandês. O prédio português, feito de pedra, sobretudo calcária, sofreu uma reforma em 1777 e intervenções posteriores. “Estamos respeitando restauração da década de 1970”, diz Regina Gaudêncio.
Mesmo em obra, a fortaleza recebe visitas de terça a domingo, das 9h às 17h. “O Forte Orange é uma peça museológica e pode reabrir antes da instalação do museu”, destaca Frederico Almeida.