Há 50 anos, em 19 de abril de 1968, a Cidade Alta de Olinda recebeu o título de patrimônio histórico brasileiro e a missão de preservar para as gerações futuras edifícios coloniais dos séculos 16 e 17, fachadas de azulejo do século 18, casas neoclássicas do século 19 e a arquitetura eclética do século 20. O tombamento começa pelo casario antigo, adentra nos quintais verdes e se completa com a vista para o mar.
“Casario, vegetação e mar é o tripé que dá sustentação ao tombamento de Olinda pela União e também ao título concedido pela Unesco em 1982, de Cidade Patrimônio da Humanidade”, afirma o engenheiro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan-PE) Frederico Almeida. As leis de proteção do Sítio Histórico do município, diz ele, foram criadas para manter os três pilares em equilíbrio.
O desafio dos poderes públicos ao longo desses 50 anos é tentar evitar a descaracterização da arquitetura e o corte das árvores nos quintais da cidade, fundada em 1535 e que completou 483 anos em 12 de março último. “Por falta de controle urbano, os quintais estão sendo devastados. De 1970 a 2005, o Sítio Histórico perdeu 25% da sua cobertura vegetal”, afirma o arquiteto da Secretaria de Patrimônio e Cultura de Olinda Clodomir Barros.
Ele fez o levantamento para a pesquisa de mestrado em desenvolvimento urbano e alerta para o aumento do desmatamento nos últimos anos. “Isso é preocupante, a paisagem faz parte do tombamento. Michel Parent (inspetor da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, Unesco) descreve Olinda como um jardim entremeado de arquitetura”, acrescenta a arquiteta Nazaré Reis.
A destruição das árvores dos quintais é mais significativa do que as modificações nas fachadas do casario, na avaliação de Nazaré Reis, representante da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) no Conselho de Preservação dos Sítios Históricos de Olinda. “E não é de hoje que isso está acontecendo”, destaca a arquiteta. Os problemas se agravaram, observa Clodomir Barros, a partir de 1995 com o desmonte do Sistema de Preservação dos Sítios Históricos criado em 1979.
“O sistema, formado pelo conselho, fundo de preservação e órgão executor, era considerado de vanguarda e serviu de modelo para o mundo”, destaca Plínio Victor, arqueólogo da prefeitura. A cidade foi obrigada por lei a ter uma estrutura que cuidasse do patrimônio para conseguir o título da Unesco e o sistema não pode ser revogado porque sem ele Olinda perde a certificação mundial, explica Plínio Victor.
Em 1995, a Fundação Centro de Preservação dos Sítios Históricos, órgão executor do sistema, foi substituída pela Secretaria de Patrimônio, que é mais vulnerável a questões políticas, observa o também arqueólogo da prefeitura José Aylton Coelho. Com as mudanças, as obras passaram a ser executadas por secretarias distintas, sem a visão única e integrada dos técnicos como na época da fundação, completa Valéria Macedo, engenheira da Secretaria de Patrimônio e Cultura.
A fundação tinha mais de 200 funcionários, dos quais 100 específicos para executar obras, como canteiros, marceneiros e pedreiros, recorda Patrícia Pedrosa, arquiteta da prefeitura e presidente do Conselho de Preservação. O Sítio Histórico, diz ela, deixou de ser tratado como uma área especial desde que o sistema de preservação ficou inativo (não é considerado extinto). O resultado é visível nas fachadas modificadas do casario e nos postes cheios de fios nas ruas, ressalta.
“Este deveria ser um ano de celebrações para Olinda – 50 anos do título de patrimônio nacional e 80 anos do tombamento isolado das primeiras edificações da Cidade Alta pelo Iphan, como o Mosteiro de São Bento, Convento de São Francisco, Igreja da Graça e a casa 28 da Rua do Amparo, entre outros – mas no lugar de comemorar estamos juntando frustrações”, lamenta o arquiteto Clodomir Barros.