Quando o jovem Mateus Miranda, 21 anos, ingressou no curso de medicina da Universidade de Pernambuco (UPE) se espantou com a realidade do novo universo. A rotina pesada, com aulas em tempo integral e muitas cobranças por bom desempenho, espantou o aluno, que ainda precisava lidar com um agravante: viver longe da família – que mora em Palmares, na Zona da Mata Sul pernambucana – para seguir a vida acadêmica.
Não demorou para que Mateus notasse os primeiros sintomas de esgotamento mental. “Chega um momento em que tudo o que o aluno faz da vida é relacionado à faculdade. Nós somos treinados a achar que essa rotina é normal e que temos que resistir, por mais que as demandas terminem nos sufocando”, conta. Em maio deste ano, o estudante sentiu que necessitava de ajuda e procurou o serviço de psiquiatria do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), vinculado à UPE. O primeiro atendimento confirmou o que o jovem já suspeitava: ansiedade. Como não seguiu à risca o tratamento, o quadro do jovem evoluiu para depressão.
Este caso não é exceção no meio universitário, principalmente entre alunos de medicina. O aumento da incidência de transtornos psiquiátricos nessa população vem preocupando especialistas em saúde mental. O cenário fez com que o psiquiatra Leonardo Machado, professor de psiquiatria e psicologia médica da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), investigasse mais a fundo o problema. “Me chamou atenção o número de estudantes que me procuravam pedindo alguma ajuda em relação a problemas psicológicos, psiquiátricos e de relacionamentos. Muitos vinculados ao próprio curso e outros às suas vidas pessoais”, conta.
Ao longo de 2016, o psiquiatra fez um levantamento com mais de 400 alunos de medicina. Além de responder questionários que avaliavam diferentes fatores, os jovens participaram de aulas baseadas na psicologia positiva. “O foco primordial da psicologia positiva é estimular emoções positivas, gratidão e qualidades para promover satisfação com a vida, no sentido existencial e na resiliência. O objetivo não é diminuir, primariamente, sintomas psiquiátricos ou emoções negativas. Isso pode vir como consequência. Dessa maneira, as técnicas podem ser uma ferramenta de prevenção em saúde mental”, pontua.
O retorno positivo levou o corpo docente a adotar a metodologia humanista nas turmas seguintes. "Não é infrequente que esses jovens acabem abdicando de uma vida normal. Queríamos oferecer algo que pudesse ajudar os estudantes a viver bem a vida. Há, pelo menos, quatro disciplinas na UFPE dedicadas a esses aspectos psicológicos da prática médica", ressalta o psiquiatra Amaury Cantilino, professor adjunto do Departamento de Neuropsiquiatria da universidade.
Outro passo no suporte ao bem-estar mental dos jovens universitários foi a implementação, em janeiro passado, do Programa Galdino Loreto (Progad), projeto de extensão em andamento no Hospital das Clínicas (HC), da UFPE. O serviço oferece atendimento em psiquiatria e psicoterapia cognitiva para alunos de medicina. Outros alunos podem procurar apoio no Núcleo de Atenção à Saúde do Estudante (Nase).
Atualmente, Mateus tem acompanhamento psiquiátrico no Huoc e realiza psicoterapia particular. “Sempre pensamos que esses problemas só acontecem longe de nós, mas quando olhei ao meu redor vi que muitos estudantes estão passando pelas mesmas dificuldades”, conta o jovem.
Para a psiquiatra Kátia Petribú, professora associada de psiquiatria da UPE, o que falta no meio acadêmico é recorrer a ações preventivas. “É preciso investir na prevenção primária antes que as pessoas adoeçam. Os alunos precisam aprender mecanismos psicoterapêuticos e conhecer os recursos disponíveis para melhorar a qualidade de vida”, defende. Na UPE, os alunos podem procurar apoio no Serviço de Orientação Psicopedagógica.