A trajetória dos Mamonas Assassinas foi tão rápida quanto estrondosa. Joviais, sarcásticos e incorporando, da forma mais pop possível, o conceito de antropofagia cultural, o quinteto de Guarulhos (SP) se tornou um fenômeno que ainda permeia o imaginário nacional. O espírito do desbunde proposto pelos músicos, falecidos em acidente aéreo em 1996, e a possibilidade de rebeldia (no mais amplo sentido da palavra) pelo humor norteiam O Musical Mamonas, espetáculo que ganha sessões hoje e amanhã no Teatro Guararape.
Antes de se tornarem os Mamonas Assassinas, um dos grupos mais marcantes da música pop/rock brasileira, Bento Hinoto e os irmãos Samuel e Sérgio Reoli formaram a banda Utopia. Com relativa repercussão nas regiões periféricas de São Paulo, costumavam tocar versões de sucesso de bandas nacionais. Um dia, durante show em Guarulhos, alguém na plateia pediu que entoassem um versão de Sweet Child O’Mine, dos Guns N’Roses. Nenhum integrante sabia a letra, então convidaram um rapaz da plateia para ajudar na missão. O jovem, no entanto, tampouco dominava a língua inglesa, mas vez uma versão improvisada e cheia de energia que chamou a atenção da plateia e dos músicos. A partir dali, o espectador, Dinho, tomava o palco como vocalista da Utopia. Com a adição de Júlio Rasec e a percepção de que o humor beirando o non-sense, a salada musical e a energia singular no palco, o agora quinteto parecia ter encontrado a fórmula perfeita que acabou conquistando milhões de brasileiros.
“É uma linguagem que me excita bastante; a primeira lembrança que me veio deles foi o humor infantil, aquela facilidade muito brasileira para lidar e brincar com preconceitos sem ser ofensivo. Os Mamonas trazem uma herança do humor popular. São herdeiros de Oscarito e Grande Otelo, de Zé Trindade, de Dercy, do Velho Guerreiro, dos Trapalhões. Tem essa coisa das chanchadas da Atlândida. Eles têm um humor genuinamente brasileiro, cáustico, escrachado, de se assumir ‘errado’, da brincadeira, isso que fez com que o povo se identificasse com eles e tivessem tamanho sucesso”, acredita o diretor do musical, José Possi Neto.
No palco, os atores Ruy Brissac (Dinho), Adriano Tunes (Julio), Yudi Tamashiro (Bento), Elcio Bonazzi (Samuel), Arthur Ienzura (Sergio), Rafael Aragão (Cover Dinho) e Kadu Veiga (Rick Bonadio, produtor musical responsável pelo primeiro CD do grupo) contam, de forma irreverente, a singular carreira dos Mamonas através de seus maiores sucessos, como Robocop Gay, Vira-Vira, Pelados em Santos e Sabão Crá-Crá. No papel de Dinho, Ruy Brissac tem recebido elogios por sua performance e semelhança física com o vocalista do Mamonas.
Para construir o personagem, encarou uma rotina de oito horas diárias de ensaio, de segunda a sábado, e, ao chegar em casa, passava horas em frente ao computador atrás de material sobre o artista.“Assistia muitos vídeos pra que os trejeitos do Dinho se tornassem natural em mim. O que ajudou muito foram vídeos que os fans me enviavam, eram vídeos que não tinha no YouTube, foram essenciais”, conta.
“É muito engraçado a primeira vez que entro em cena, só ouço sussurros de como sou parecido. O meu maior desafio foram as imitações , eu nunca tinha pensado em imitar alguém”, ressalta.
Com narrativa não linear, o espetáculo aposta em muitas referências estéticas facilmente reconhecidas pelos fãs, que vão do cenário ao figurino. O acidente aéreo, no entanto, não é mencionado, pois o objetivo é, de fato, homenagear a essência do coletivo.“Tragédia, namoradas, família e fofocas não foram nosso foco. A tragédia, o final do grupo, é lugar comum, todos sabem o que aconteceu com os cinco. Optamos ficar com o que eles nos deixaram por legado: a alegria, irreverência e a história de cinco jovens que acreditaram num sonho até realiza-lo. Eram cinco jovens atrás de um sonho, o sonho do rock’n’roll”, enfatiza o diretor.