Na última terça (15), a Prefeitura de Olinda se livrou do que poderia ser o seu cavalo de troia. Prestes a ser inaugurado como o maior centro de exposições de artes visuais de Pernambuco, o antigo Mercado Eufrásio Barbosa teve a gestão repassada para o Governo do Estado. Pelo projeto de lei 14/2018, a prefeitura passa a ter um lugar no conselho de gestão, cuja centralidade cabe, agora, à Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (AD/Diper). Com inauguração anunciada para o começo de julho, o futuro da instituição está parcialmente desenhado.
Interditado desde 2006, sob risco de desabamento de parte de sua estrutura, o prédio centenário onde já funcionou uma fábrica de doces e, bem antes, a alfândega de Olinda, teve as obras de requalificação iniciadas em 2014. Após quatro anos e R$ 20 milhões investidos através do convênio com o Banco Interamericano de Desenvolvimento por meio do Prodetur, está quase pronto. Uma estrutura inimaginável diante da maior parte dos museus e instituições oficiais de cultura no Estado. Nos últimos momentos, a Prefeitura de Olinda precisou abrir mão da gestão por uma questão pragmática: não tem saúde financeira.
Mercado é apenas o nome histórico que o Eufrásio Barbosa carrega. Na prática, o prédio vai se tornar um museu contemporâneo com pelo menos cinco espaços de exposições. A grande área onde antes ficavam as bancas de peixe, verduras e alguns botecos será destinada a uma grande exposição de longa duração. Após ida e vindas, vai receber parte do acervo de arte popular da coleção da arquiteta Janete Costa.
O acervo do Museu do Mamulengo também seria para ali transferido, desonerando também a prefeitura de ter que manter o sobrado com esta finalidade na Ribeira. Vai ocupar duas salas.
O resto do conteúdo do Eufrásio Barbosa ainda permanece em suspenso. O que tem provocado, por parte da comunidade do Sítio Histórico, reclamações para que a antiga Fábrica de Doces Amorim Ltda que virou mercado a partir da década de 1960 tenha uso misto. Não apenas como centro de exposições, mas também com serviços mais voltados para a vizinhança. “Nosso medo é que o Eufrásio vire uma nova Arena de Pernambuco, gigante e vazio”, diz Edmilson Cordeiro, membro da Sociedade de Defesa da Cidade Alta, a Sodeca.
No corredor dos fundos do mercado, entre os 19 boxes de artesanato, haverá espaço para duas lanchonetes. No quintal, um grande restaurante com 250 metros quadrados, a ser licitado. Na rampa do mercado, sem cobertura, espaço para 52 barracas de feira. Com oitenta lugares, o Teatro Fernando Santa Cruz está quase pronto. “Estamos criando um projeto com a Fundarpe para adquirir um projetor e ele funcione também como sala de cinema”, diz Manuela Marinho.
Uma pequena livraria da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) também será instalada. Incorporada à vida cultural da cidade desde os anos 1960, com festas de blocos e shows, o Eufrásio não terá seu perfil musical retomado. “É uma pena, algumas das bandas mais importantes de Pernambuco tocaram ali”, diz Cordeiro. O projeto arquitetônico, no entanto, não prevê isolamento acústico para grandes shows.
Manuela Marinho, secretária de Turismo de Pernambuco, diz que os usos do mercado podem ir se ajustando. Mas mudanças radicais podem provocar sanções por parte do BID. “O Eufrásio terá também uma escola de dança e de artesanato”, pontua. Oficialmente, ainda não foram anunciados os nomes dos profissionais que vão gerir o novo MEB. Mas Raul Córdula e Roberta Borsoi, para a curadoria de artes plásticas; César Santos, para a de gastronomia; e Joana Chaves, para a coordenação, já estão trabalhando pelo espaço.
Ali perto, na Rua 13 de Maio, um dos mais importantes acervos de arte moderna da América Latina continua interditado. Fechado desde 2016, o Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco, inaugurado em 1966 com a doação da portentosa coleção de Assis Chateaubriand, deveria ter sido aberto em janeiro do ano seguinte. Mas segue fechado por algo tão simples quanto trágico: formigas.
Após um estudo técnico, o Instituto de Tecnologia de Pernambuco confirmou que a colina sobre a qual o museu está assentado estaria cedendo devido à escavação de grandes formigueiros. Com verbas já disponibilizadas em torno de R$ 110 mil, uma empresa foi contratada para dar solução, mas, ao fim do mês passado, descobriu-se a incapacidade técnica da mesma.
Uma outra licitação deve ser aberta na semana que vem para a contratação de uma nova empresa. Por enquanto, as cerca de quatro mil obras do acervo com nomes como Portinari, Cícero Dias, Eliseu Visconti, Djanira, Telles Junior, Wellington Virgolino, Di Cavalcanti, João Câmara, Burle Max, Francisco Brennand e Tereza Costa Rêgo seguem na reserva técnica improvisada na principal sala.