A cerimônia do Oscar chega à sua 90ª edição com uma disputa que, apesar de favoritismos, se mostra bastante equilibrada nas principais categorias: Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Ator e Melhor Atriz. Veteranos vêm cedendo cada vez mais espaço aos novatos. Na competição de Melhor Diretor, por exemplo, só há um nome anteriormente indicado na categoria. Entenda a situação que se desenrolará no próximo domingo.
PAUL THOMAS ANDERSON
Paul Thomas Anderson, que concorre por seu trabalho em Trama Fantasma, é o único diretor que já foi indicado na categoria, em 2008, por Sangue Negro. PTA, como também é conhecido, é celebrado pela densidade dramática que confere às suas tramas, desenvolvendo complexos conflitos familiares – muitos deles abordando relações paternas – e por fazer longos planos e movimentos de câmeras sem cansar o espectador. Em Trama Fantasma, ele traz a história de um estilista da Londres pós-guerra e sua relação com a nova musa que entra em sua vida. Daniel Day-Lewis é quem assume o papel principal. Seu último trabalho com Anderson foi justamente Sangue Negro, que lhe rendeu o prêmio de Melhor Ator.
GUILLERMO DEL TORO
O favorito na competição de direção é o mexicano Guillermo Del Toro com sua fábula sci-fi A Forma da Água. O tom fabulesco é recorrente na carreira de Del Toro, que alcançou o sucesso global com O Labirinto do Fauno, em que mistura uma Espanha rural sangrenta da década de 40 com um universo de fantasia, repleto monstros e seres fantasiosos, contando com um design de produção cuidadoso em suas concepções. Seu domínio destes reinos fantasiosos o fez assumir por um tempo os filmes da trilogia O Hobbit, mas foi substituído por Peter Jackson após diferenças criativas. Em A Forma da Água, o mexicano conta uma história de amor entre uma reprimida mulher muda e um ser aquático antropomorfizado durante a Guerra Fria. O diretor conduz a trama estabelecendo bem sua já característica assinatura visual, dando importância a padrões de cores e cenários com um pé no real e outro no fantástico.
CHRISTOPHER NOLAN
Outro veterano na disputa é Christopher Nolan, responsável pelo drama de guerra Dunkirk. Nolan ganhou notoriedade pela ousadia narrativa apresentada em Amnésia, em que a linha principal do roteiro é percorrida de trás pra frente, dialogando com o problema psíquico do protagonista, incapaz de reter memórias. Após alguns outros bons trabalhos, Nolan se responsabilizou por assumir o ressurgimento do Batman nos cinemas, conferindo um tom hiperrealístico que marcou a produção de filmes de heróis. A trilogia de filmes do homem-morcego gerou um dos trabalhos mais fortes de sua carreira, Batman – O Cavaleiro das Trevas, transformando, junto ao ator Heath Ledger, o Coringa em um dos mais icônicos vilões do cinema contemporâneo. Seu último trabalho antes de Dunkirk foi a ficção-científica espacial Interstelar, que dividiu opiniões, principalmente por sua preguiçosa solução narrativa no terceiro ato da trama. Dunkirk conta com um primor visual e técnico que servem a um roteiro que pode ser considerado apenas “ok”.
GRETA GERWIG
Greta Gerwig é a única mulher na disputa deste ano. Assumindo a direção pela primeira vez, é conhecida por seu trabalho como atriz, trabalhando em filmes como Para Roma, com Amor, de Woody Allen e Frances Ha, um de seus principais trabalhos na frente e atrás das câmeras (Greta co-escreveu o filme junto ao seu marido, Noam Baumbach, diretor do filme). Sua popularidade começou ainda na década passada ao participar de filmes pertencentes ao Mumblecore, gênero que conta com produções independentes de baixo orçamento, marcadas pela improvisação. Frances Ha circulou bem entra a crítica e Greta chegou a ser indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz. Ela concorre por Lady Bird – A Hora de Voar, em que explora a vida de uma jovem adolescente que deseja se afastar de casa e se tornar mais independente, mas enfrenta resistência da família. O filme era uma das principais apostas no começo da temporada de premiações, mas acabou perdendo espaço. Chegou a ter a melhor avaliação da história no agregador de críticas Rotten Tomatoes.
JORDAN PEELE
Corra! também é dirigido por um estreante. O comediante Jordan Peele lançou ainda no começo de 2017 o filme que alcançou excelentes avaliações da crítica. É um suspense, mas conta com um humor acidamente desconcertante, desenvolvendo um desconforto progressivo até culminar no clímax quase surrealista. “Corra! é um documentário”, brincou Peele em seu Twitter na época da polêmica decisão que fez o filme concorrer a melhor comédia ou musical no Globo de Ouro. Mesmo com menores chances de vencer, a indicação traz um reconhecimento para Peele, apontando-o como uma ótima revelação em que se deve ficar de olho nos trabalhos dos próximos anos.
TRÊS ANÚNCIOS PARA UM CRIME
Três Anúncios Para Um Crime é um dos favoritos na disputa pelo título de Melhor Filme, vencendo prêmios considerados como um bom termômetro do Oscar, como o de melhor elenco do Sindicato dos Atores (SAG Award) e o BAFTA. Ele é dirigido pelo britânico Martin McDonagh, vencedor do Oscar de Melhor Curta-Metragem em 2006. Quem também já levou o prêmio e participa da equipe do filme é Frances McDormand, vencedora da estatueta de Melhor Atriz, em 1997, por Fargo, dos irmãos Coen. Ela faz uma mãe que, inconformada com a falta de solução da polícia sobre o cruel assassinato da filha, coloca três outdoors na beira de uma estrada, para chamar atenção para o caso. A atitude acaba por gerar uma série de consequências que atinge a vida de pessoas da pequena comunidade.
A FORMA DA ÁGUA
O outro favorito na competição é A Forma da Água, dirigido pelo mexicano Guillermo Del Toro. O filme já começou a angariar prêmios em setembro, ganhando o Leão de Ouro do Festival de Cinema de Veneza. Ainda conquistou outros troféus-termômetros, como os prêmios dos sindicatos dos diretores (DGA) e produtores (PGA). O enredo gira em torna de Elisa Esposito, faxineira de uma instalação militar norte-americana. Lá, ela se depara com uma criatura aquática e inicia uma relação amorosa com ela. A assinatura visual/temática de Del Toro ganha uma bela força nesta fábula sci-fi, não tendo medo de ser simples em sua história. Simplicidade que não impede A Forma da Água de ser uma das mais poderosas histórias de amor filmadas nesta década.
ME CHAME PELO SEU NOME
O filme do diretor italiano Luca Guadagnino concorre à estatueta com o romance entre dois jovens numa Itália provinciana do início da década de 1980. Sua trama também investe na simplicidade (de eventos, não de sentimentos), narrando os encontros do jovem Elio, vivido com uma naturalidade impecável por Timothée Chalamet, com Oliver (Armie Hammer), aluno de seu pai que passa uma temporada hospedado na casa de veraneio da família. O afeto entre ambos surge em tela tão naturalmente quanto a bucólica paisagem que rodeia as personagens. Guadagnino explora bem as aventuras que desenvolvem a sexualidade com a chegada da idade adulta. Além do ator Timothée Chalamet, Me Chame Pelo Seu Nome compartilha as apostas de prêmio desde que foi lançado, mas foi perdendo força com o próximo nome da lista.
LADY BIRD - A HORA DE VOAR
Lady Bird, com a já celebrada Greta Gerwig pela primeira vez na direção, gerou burburinhos ao ser lançado, principalmente por sua avaliação de 100% de aprovação no agregador de críticas Rotten Tomatoes. O filme, protagonizado por Saiorse Ronan, também explora as decisões e sentimentos que vêm com a aproximação da idade adulta. Lady Bird se diferencia pelas dimensões dos conflitos que confere a seus personagens, que ganham organicidade com o trabalho de seus intérpretes. Este trabalho de Gerwig conseguiu o Globo de Ouro de Melhor Filme (comédia ou musical).
CORRA!
Uma das surpresas deste ano foi a entrada de Corra! na competição. O primeiro trabalho do comediante britânico Jordan Peele faz uma gradação que começa no desconforto de um racismo sutil até um terror escancarado. A trama leva o fotógrafo Chris (Daniel Kaluuya), negro, para a casa da família de sua namorada, branca. Durante a visita, comportamentos estranhos são observados pelo fotógrafo, instigados de uma forma ou de outra por questões raciais. O desenvolvimento da narrativa vai do riso nervoso de pequenos comentários até um clímax de horror que flerta com o surrealismo. Tudo imerso em alegorias e simbolismos que remetem a estruturas de opressão racial.
DUNKIRK
Este é um filme isola o espectador nas praias de Dunquerque durante o cerco alemão na Segunda Guerra Mundial. Isola, pois a imersão sonora e visual é o maior trunfo de Dunkirk, de Christopher Nolan. O enredo, dividido em três fragmentos que se desenrolam em diferentes durações, pode parecer ter uma certa complexidade, mas não encontra uma solidez que se destaque, sem personagens fortes e com alguns incidentes bobos. Funciona, mas não maravilha. É um forte concorrente nas categorias mais plásticas, como som e fotografia.
O DESTINO DE UMA NAÇÃO
O filme de Joe Wright gira em torno dos 30 primeiros dias do governo do primeiro-ministro britânico Winston Churchill. Uma produção tipicamente isca de Oscar, com direito a reconstrução de figuras históricas, carregadas na caracterização e com um verdadeiro tour de force na interpretação de Gary Oldman, irreconhecível na pele do primeiro-ministro. Ainda assim, não vem se mostrando um forte concorrente para a categoria.
THE POST - A GUERRA SECRETA
The Post é outro que embasa seu enredo em um momento histórico. Dirigido por Steven Spielberg, o filme transforma Tom Hanks e Meryl Streep em Ben Bradlee e Katharine Graham, jornalistas à frente do jornal norte-americano The Washington Post na luta para expor documentos secretos do governo estadunidense que revelam aspectos obscuros da Guerra do Vietnã. É válido lembrar que a redação do The Washington Post já foi indicada ao Oscar de melhor filme em 1977 com o clássico Todos os Homens do Presidente, quando Jason Robards ganhou a estatueta de melhor ator coadjuvante interpretando o papel que é de Tom Hanks em The Post.
TRAMA FANTASMA
Dez anos depois de sua melhor chance de ganhar a premiação de melhor filme, Paul Thomas Anderson volta com Trama Fantasma, trazendo de volta também o ator Daniel Day-Lewis em seu trabalho. Aqui, Day-Lewis é Reynolds Woodcock, um estilista da alta costura britânica que se envolve com uma garçonete, que passa a ser sua musa inspiradora. É um filme que tem uma narrativa considerada mais “convencional” quando comparada com a de seu trabalho anterior, o psicodélico Vício Inerente. Trama Fantasma está sendo muito bem recebido pela crítica, mas não tem indo bem nas premiações correntes.
GARY OLDMAN
A vantagem na disputa do Oscar de Melhor Ator este ano está com Gary Oldman e seu Winston Churchill de O Destino de uma Nação. O britânico ganha um prato cheio para se destacar com um personagem que já carrega um certo carisma por si só, além do trabalho de caracterização e um roteiro que lhe dá momentos individualistas de monólogos e frases de efeito. Personagens nesse sentido já são velhos conhecidos do ator, a exemplo do Drácula em Drácula de Bram Stoke e o Sid Vicious em Sid e Nancy. Oldman já conseguiu os principais prêmios da temporada, como o do sindicato dos atores (SAG Awards), o da crítica (Critic’s Choice Award), o BAFTA e o Globo de Ouro. Sua última indicação ao Oscar foi em 2011 com O Espião que Sabia Demais.
TIMOTHÉE CHALAMET
Esta pode ser considerada a principal revelação da lista, com a sua doce e natural atuação em Me Chame Pelo Seu Nome. O jovem ator demonstra uma expressividade corporal que é o extremo oposto do exagero. Apresentando uma química afiada com Armie Hammer, seu principal parceiro de cena, Chalamet também foi apontado como principal aposta para os prêmios na época em que foi lançado. O ator está no elenco de dois filmes que concorrem ao prêmio principal, Me Chame Pelo Seu Nome e Lady Bird - É Hora de Voar. Ele protagonizará o próximo projeto do diretor Woody Allen.
DANIEL KALUUYA
Outra revelação entre os indicados é Daniel Kaluuya por seu trabalho em Corra!, em que o ator canaliza bem o desconforto sentido durante a projeção do filme, sendo os olhos do público dentro da narrativa. Aliás, seus olhos são o melhor veículo do terror experimentado nos últimos momentos do filme, em que derruba lágrimas tão pesadas como a situação vivida por seu personagem. Kaluuya já protagonizou um episódio da série britânica Black Mirror. O ator também faz parte do elenco principal de Pantera Negra, o mais recente e revolucionário filme da Marvel Studios.
DANIEL DAY-LEWIS
Se temos duas revelações no páreo, também temos um vencedor veterano que já anunciou o fim de sua carreira. Daniel Day-Lewis tenta ganhar sua quarta estatueta de melhor ator, batendo o recorde da categoria e se igualando a atriz Katherine Hepburn em prêmios de atuação. Vencendo anteriormente por Meu Pé Esquerdo (1990), Sangue Negro (2008) e Lincoln (2012), ele retorna à competição estrelando Trama Fantasma.
DENZEL WASHINGTON
O último nome da lista também já tem estatuetas em sua estante. Denzel Washington já ganhou o prêmio de melhor ator coadjuvante por Tempo de Glória em 1990 e o de melhor ator por Dia de Treinamento em 2002. Agora ele volta à categoria principal por Roman J. Israel, Esq., mas com menos chances, num filme que passou um pouco apagado pela temporada. Tanto é que a indicação de Denzel é a única que o filme conseguiu nos principais prêmios. Na produção, Denzel é um advogado frustrado por não conseguir os créditos de seu trabalho, mas consegue um cargo executivo na firma onde trabalha, descobrindo podres dos bastidores de seu meio e tomando atitudes para remediar essa situação.
FRANCES MCDORMAND
Frances McDormand já tem sua estatueta dourada em casa e é a preferida do prêmio com Mildred Hayes em Três Anúncios Para um Crime. A atriz já é bem familiarizada com prêmios, com cinco indicações ao Oscar, vencendo por Fargo em 1997, além de já possuir Emmy, Globo de Ouro, BAFTA, SAG e Tony. Nesta temporada, também já venceu prêmios que podem indicar sua possível vitória.
SALLY HAWKINS
A segunda favorita é Sally Hawkins e seu doce trabalho em A Forma da Água. A atriz, que começou a ganhar destaque no início dos anos 2000, teve sua primeira indicação em 2014, na categoria coadjuvante por Blue Jasmine, de Woody Allen. Esta é a segunda vez que a atriz concorre, desta vez na disputa principal, sendo apontada como a atriz com mais chances de tirar o prêmio de McDormand. Sally concorre com a personagem Elisa Esposito, uma faxineira muda que se apaixona por uma criatura aquática mística trazida para os Estados Unidos. A atriz faz de Elisa um apaixonado e apaixonante ser, que vai se libertando ao decorrer da narrativa, trazendo uma expressividade corporal silenciosa, dançando e fazendo monólogo em libras.
SAIORSE RONAN
É a mais jovem da lista, com 24 anos, disputando por Lady Bird - A Hora de Voar. Apesar da pouca idade, essa já é a terceira indicação da atriz, que concorreu na categoria coadjuvante em 2008 por Desejo e Reparação, quando tinha apenas 13 anos. Em 2016, concorreu na categoria principal por Brooklyn. Agora ela vem com um pouco mais de força na disputa, conquistando alguns prêmios menores. Já chegou a ser apontada como principal aposta, mas outros nomes foram ganhando mais espaço. Em Lady Bird, Saoirse faz uma jovem decidida a obter uma independência de sua família ao mesmo tempo em que vai lidando com questões inerentes à chegada da vida adulta.
MARGOT ROBBIE
Outra que também já chegou a ter um certo favoritismo é a australiana Margot Robbie, que vem com Eu, Tonya para o prêmio. Robbie foi revelada ao mundo por Martin Scorsese em O Lobo de Wall Street, em que interpreta o par romântico de Jordan Belfort, protagonista do filme. Indicada pela primeira vez, Margot protagoniza a história real da patinadora artística Tonya Harding, envolvida em um ataque a uma colega de patinação, que acabou por banir Harding do esporte. A australiana se desdobra bem para conferir uma autenticidade para Tonya, que consegue se sair bem tanto quando o filme assume sua linguagem ficcional, quando ele brinca com a linguagem documental.
MERYL STREEP
Meryl Streep concorre pela 21ª vez desde 1979, vencendo três vezes, com Kramer vs Kramer (1979), A Escolha de Sofia (1983) e A Dama de Ferro (2012). Ela vem agora com The Post, interpretando a jornalista Katharine Graham, uma das primeiras mulheres a frente de um grande jornal, o The Washington Post. A indicação fez Meryl bater o recorde de pessoa mais indicada em categorias de interpretação. O recorde anterior era de 20 indicações, que pertencia a… Meryl Streep.