Em livro, Donald Barthelme faz uma ode destrutiva à parternidade

O escritor americano cria em O Pai Morto uma obra poderosa, cheia de pastiches e críticas
Diogo Guedes
Publicado em 15/03/2016 às 9:15
O escritor americano cria em O Pai Morto uma obra poderosa, cheia de pastiches e críticas Foto: Divulgação


Escrever a partir de uma alegoria é complexo, mas é um caminho comum. Em O Pai Morto, clássico da escrita pós-moderna americana, o mecanismo é exatamente o oposto: explicitar a metáfora, repeti-la, gastá-la até ela se transformar em mais do que uma imagem. O romance de Donald Barthelme, publicado em 1975, é uma ode – no papel irônico que restou para elas nos dias atuais – à figura paterna, ao absoluto resumido na figura de Deus e de um homem.

Na trama, traduzida por Daniel Pellizzari, um filho leva, junto com um grupo de pessoas, o seu Pai Morto, alguém “morto apenas em certo sentido”. Esqueça a aparência de realidade: O Pai Morto é um livro contado através de pastiches, pequenos causos, diálogos quase gratuitos e sem nenhuma moral. Barthelme mexe meticulosamente com clichês da paternidade e do discurso da vida moderna, repetindo-os até que eles percam um pouco da mesmice. Como ele diz, repetição é realidade, ainda mais em uma história beckettiana como a sua.

Com o tema do livro escancarado e um personagem que é a metáfora escancarada, o autor dá golpes duros, ora irônicos, ora simplesmente belos, na forma como vemos e vivemos a relação filho e pai. O trecho mais forte, um pequeno livro dentro do livro, traz um manual da paternidade – uma dessas homenagens demolidoras, feitas pela necessidade de odiar o que se ama. Pais, ali, são “como ler, em um jornal, um longo relato sobre um filme a que você já assistiu e do qual gostou imensamente mas não tem vontade alguma de assistir de novo ou ler a respeito”. Barthelme faz uma obra forte sobre se libertar da prisão da paternidade e, ao mesmo tempo, perdoar o pai: “Sua tarefa, enquanto filho, é reproduzir todas as barbaridades tratadas neste manual, mas de forma atenuada. Você deve se transformar em seu pai, mas em uma versão mais pálida, mais fraca.”

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