Em Abraçar e Agradecer, Maria Bethânia canta e diz o que quer

Intérprete brasileira se apresentou no Recife nos dias 30 de setembro 1º de outubro
Mateus Araújo
Publicado em 03/10/2015 às 6:50
Intérprete brasileira se apresentou no Recife nos dias 30 de setembro 1º de outubro Foto: André Nery/JC Imagem


“Uma carregadeira de amor. Você não me vê assim, vê? Pois esta sou eu”, o trecho do texto Candeeiro, de Carmen Oliveira, anunciava o fim de uma consagração: Maria Bethânia, a intérprete brasileira mais celebrada neste ano no País, em quase duas horas de apresentação, celebrou a si e a todos os que a erguem, em um espetáculo de amor e gratidão. Um espetáculo celebrativo, acolhido com êxtase e euforia por centenas de fãs que lotaram o Teatro Guararapes, nas últimas quarta e quinta-feira. 

O título da turnê, tão apropriado para quem, como Bethânia, está plenamente em sintonia com a vida e os mistérios da vida, aponta justamente para o caminho de louvor: Abraçar e Agradecer é a definição justa para uma artista que, em 50 anos, traçou um caminho singular na arte nacional. E é a particularidade, a personalidade, o âmago desse ofício de devoção e guia deste espetáculo.

Em um repertório de 41 canções, a intérprete baiana diz e canta exatamente o que quer, o que queria dizer numa data tão sua. Quem esperava ouvir as clássicas românticas, irretocáveis na voz de Bethânia, como Negue ou Olhos nos Olhos, não ouviu. 

No seu oásis sagrado de luz e de som, a Abelha Rainha preferiu, desta vez, enveredar por caminhos menos óbvios, mais pessoais e surpreendentes. Lançou à plateia uma proposta poética de ser seu abismo, de ser a rede que seguraria a diva no mergulho em si própria. 

Se em Carta de Amor, último show que trouxe a Pernambuco, em 2013, Bethânia transpôs ao palco suas paixões em tons mais densamente emotivos, desta vez, em Abraçar e Agradecer ela fala de si em samba e celebração, leve e contundente, festa de quem completa cinco décadas de profissão transformada em sacerdócio, ofício e vida, com a plenitude de amar o palco.

Com voz límpida e serena, a senhora de 69 anos e brilhos nos olhos e sambar de menina, olha com fé e respeito para sua trajetória. É plácida e sublime ao ver e entender o seu passado, ao louvar suas origens, caminhar descalça pelos seus sertões e reverenciar seus deuses – os orixás e os mestres, como Dorival Caymmi e Mãe Menininha do Gantois. 

 

Nesse repertório afetivo, Bethânia visitou universos dos seus ídolos notórios. Chamou para a sua voz canções de Roberto Carlos, Chico Buarque e Caetano. E os uniu em uma seleção emblemática, assumindo a figura da grande índia que ela incorpora no seu recente Meus Quintas

Em arranjos modernos, a maioria dançantes e leves, sob um chão tecnológico e iluminada por um impecável e expressivo desenho de luz, Bethânia interpretou e nos fez assistir a momentos inesquecíveis, como a arrebatadora versão de Non, Je Ne Regrette Rien – sem dúvida, ápice da noite. 

Ao ver Abraçar e Agradecer, a paráfrase inevitável que se pode fazer é da música Doce: se quem cantou a Bahia foi Oxum, quem embalou e adoçou foi Caymmi, diremos, sem medo: quem interpretou a Bahia (metáfora do Brasil) foi e é Bethânia, um carregadeira de amor.

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