Com lançamento hoje, Destemida, o segundo disco da Bande Dessineé a princípio iria se chamar Chanteclair – nome do edifício do século 19 e Patrimônio Histórico localizado no Bairro do Recife. Tempo depois, durante a gravação, a banda resolveu mudar o título para sintetizar os temas levantados no álbum.
“O disco tem três atmosferas de discussão: a noite (como espaço de liberdade, de aproveitamento); o ambiente da cidade, espaços públicos (estar na cidade e não apenas passar por ela); e a feminilidade (o feminino centrado como ponto de identificação independente de gênero)”, explica a vocalista Clarice Mendes no vídeo de making of do álbum. Este último tema figura como ponto central, perpassando todo o trabalho. O eu lírico feminino permeia canções e vai se cruzando, formando esta destemida personagem feminina.
Destemida - Making Of #1É amanhã! Lançamento do nosso segundo álbum: Destemida. Confira o making of do nosso disco.? PRÉ-VENDA EXCLUSIVA DO ÁLBUM: www.kickante.com.br/campanhas/destemidaEdição e Finalização: Matheus FariasDesign de cartelas: Enock Paulo Carvalho.Publicado por Bande Dessinée em Terça, 15 de março de 2016
Na faixa-título, ela canta de peito aberto e em nova direção: “E nem me venha com suas mentiras/ Que eu dei descanso pro/ Meu coração/ Eu vou pra rua/ Saio destemida”. Já em Perdizes (feita para trilha do filme Minha Alma é Irmã de Deus), ela ameaça: “Mas eu não sei de onde eu vim/ Só sei que vim pra te fazer sofrer”.
“Teve um direcionamento sobre a feminilidade, sobre abordar a ótica feminina, o lugar de fala, o desafio que é compor como se fosse uma mulher ou pensando como, ou se colocando no lugar de”, diz Barro, guitarrista, cantor e compositor. “Em parte do conteúdo, devo muito ao diálogo com Clarice porque ela é muito feminista, ligada a esse momento atual que a gente está vivendo do feminismo. Ela está muito no foco dessa discussão e trouxe muitas questões. Isabella Valle, do grupo feminista Deixa Ela em Paz, é muito amiga, sempre conversa e aborda essas questões ligadas ao machismo, o lugar da mulher, o lugar do prazer. Fui captando essa energia da pauta e isso influenciou muito a refletir sobre e tentar retratar de alguma maneira nessa personagem. Essa foi uma das coisas fortes pra mudar de nome. Destemida é uma metáfora da banda, da cidade, da mulher”, afirma ele. Clarice completa: “Destemida representa a leveza de ser quem se é. É desprendimento, coragem e a busca pelo novo”.
Rumo ao pop
O álbum marca a saída do baixista Bruno Vitorino e do tecladista André Sette (da Anjo Gabriel) e a efetivação do tecladista Ed Staudinger no processo de composição, em parceria com Barro. A mudança na formação aliviou o ar jazzístico e sublinhou o apelo pop da Dessinée. "É quase uma mutação em termos de identidade da banda. O primeiro disco carrega muito da primeira formação da Dessinée, que foi 2007, e é um pouco resultado da nossa primeira estrada. O segundo disco é resultado dessa segunda estrada que é botar o disco na rua e ir pro mundo tocar dele e pensar e refletir a partir dele", diz Barro. "André era um cara que gostava muito de jazz e Bruno, que fez muito dos arranjos, também. Tati é uma cantora que veio do jazz e do choro. O início da banda tinha essa cara mais jazzísitica e foi se modificando", aponta.
Barro diz que compor em português era outro desafio a ser encarado em Destemida, reafirmando a ligação da banda com o formato canção. "No primeiro disco havia o desafio de compor em francês que para mim, como compositor, acho que foi bem executado. Mas o universo sonoro da banda ainda ficava distante. Quando tocávamos músicas como Intempestiva ou Setubanalidades, que eram todas ou quase em português, abria uma cortina e o contato com o público era muito maior. Como na França, o Brasil tem essa tradição da canção. A galera gosta de cantar junto e se identificar com a letra", analisa.
Outro interesse da Dessinée foi deixar de lado o lado vintage, retrô, e trabalhar com mais maturidade maior a produção musical, rumo a um "pop refinado". O diretor artístico Patricktor4 teve papel importante nesse processo. "Ele foi num show da gente em Arcoverde e falou: 'o som de vocês é massa, mas têm algumas coisas que não são bem exploradas'. Ele ajudou a pegar o DNA a gente, que tava ali, e colocar numa dimensão maior", conta Barro. "Então decidimos abordar o contemporâneo. Lógico que o contemporâneo está recheado de informações do passado. Tem ainda um pouco da sonoridade dos anos 60, 70, esse som da Motown que a gente gosta e admira como caminho de produção", explica.
Citando desde brasileiros como Beto Villares, Eumir Deodato, Lincoln Ollivetti aos trabalhos recentes de Drake e Rihanna e o soul pop de Janelle Monáe e Justin Timberlake, Barro resume: “Acho que o som são esses três pilares: a música brasileira com esse hip hop contemporâneo e essa sonoridade 60, 70 pensando o hoje – não mais revivalista ou vintage como fetiche pelo passado, e sim trazendo influências e reposicionando”.