CINEMA

Memória do cinema pernambucano resgatada em uma coleção com 212 filmes

A coletânea, feita com filmes realizados no Estado, ao longo de noventa anos, vai ter distribuição gratuita para cincelubes, bibliotecas, curadores, historiadores e jornalistas

Ernesto Barros
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Ernesto Barros
Publicado em 12/01/2015 às 11:07
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A coletânea, feita com filmes realizados no Estado, ao longo de noventa anos, vai ter distribuição gratuita para cincelubes, bibliotecas, curadores, historiadores e jornalistas - FOTO: Divulgação
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Quem pensa que a pujança do cinema pernambucano atual é fruto do acaso não sabe da missa um terço. Dos ciclos mais produtivos – o primeiro durante o período silencioso, na década de 1920; o segundo pegando carona na bitola amadora do Super 8, na década de 1970 – até os dias que correm, a produção audiovisual de Pernambuco é das mais ricas e venturosas do cinema nacional. A prova disso é a monumental Antologia do Cinema Pernambucano, uma coleção com 212 filmes realizados no Estado, ao longo de 90 anos de altos e baixos, mas de persistência ímpar.

Organizada em 20 DVDs, a coletânea é fruto de dois anos de pesquisa, suor e dedicação das produtoras culturais Isabela Cribari e Germana Pereira e do curador do projeto, o jornalista e cineasta Rodrigo Almeida. Com recursos do Edital do Audiovisual/Funcultura, Isabela e Germana juntaram suas respectivas produtoras – a Set Produções Audiovisuais e a Tangram Cultural – e prestaram o maior serviço que a memória do cinema pernambucano já recebeu. O projeto também teve a participação da Ateliê Produções, que cuidou da edição e autoração dos discos.

Para Germana, uma coisa ficou clara durante a realização da antologia: a questão da preservação do cinema pernambucano. “Foi um trabalho de detetive encontrar os filmes telecinados com qualidade. A produção atual é grande e bem-sucedida, mas não basta ver apenas os filmes. É preciso que se adote como prioridade uma linha de preservação na Lei do Audiovisual. Até filmes feitos na década de 1990 já estão perdidos”, aponta Germana.

A antologia começou a tomar corpo quando Isabela e Germana desenvolveram o site Cinema Pernambucano, que visava prestar serviços para realizadores com informações sobre mecanismos e leis de incentivo à produção audiovisual. “Durante a concepção do site, notamos que não existia nada do cinema local catalogado, daí pensamos em disponibilizar a reunião dessas obras”, explica Isabela.

Os boxes não serão comercializados. A distribuição será gratuita para cineclubes, bibliotecas, escolas de cinema, videoclubes, curadores, historiadores e jornalistas, além de órgãos públicos como o Ministério da Cultura, a Ancine e a Cinemateca Brasileira. A partir desse acervo, a história do cinema pernambucano poderá ser analisada por meio de seus filmes mais representativos, como também de títulos esquecidos, que só agora foram resgatados. Por motivos contratuais, os longas-metragens – com exceção dos clássicos do Ciclo do Recife – ficaram de fora da coletânea. 

Para organizar os curtas e média-metragens – e não apenas catalogá-los cronologicamente –, o curador Rodrigo Almeida dividiu a antologia em três linhas de pensamento: Cinema/Transcinema, com filmes ligados ao cinema, história, salas de exibição, experimental, videoarte e outras linguagens; Câmera/Cidade, com a reunião de títulos sobre o Recife, urbanismo, periferia, marginalidade, violência e terror; Áridos Movies, com os filmes sobre o Sertão, a Zona da Mata, cultura popular, regionalismo e artistas pernambucanos.

“A produção reunida na antologia desenha um perfil do cinema pernambucano em todas as suas vertentes. Mas a maior surpresa foi descobrir a potência desses filmes. Geralmente somos levados a ver os curtas como uma escolinha para os longas-metragens. Esses filmes, ao contrário, já são grandes e não precisam ser melhorados. Muitos, claro, já apontam a estética que vários cineastas desenvolveriam em seus longas-metragens”, analisa Rodrigo. 

Além de auxiliar a circulação dos filmes, o curador acredita que a antologia vai ajudar em novas pesquisas sobre o cinema pernambucano. “O Ciclo do Super 8 tem uma grande quantidade de filmes interessantes, que só durante a pesquisa pude conhecer melhor, como a obra de Jomard Muniz de Brito, Paulo Bruscky, Daniel Santiago e Osman Godoy”, salienta.

Um dos discos, por exemplo, traz 14 filmes dirigidos por Jomard, entre eles O palhaço degolado, Recifernália e Noturno em Ré (cife) maior, e o documentário Eternamente Ágora, realizados pelos jornalistas Alexandre Figueirôa (estudioso do movimento) e George Moura, em 1989.

Do Ciclo do Recife estão incluídos Aitaré da praia, A filha do advogado, Retribuição, Jurando vingar, Revezes e os documentários (“naturais”, como eram chamados na época), Recife no centenário da Confederação do Equador e Veneza americana. Da produção mais recente, estão presentes curtas e médias-metragens produzidos a partir dos anos 1980 até obras feitas em 2013. As omissões – como o premiado curta Muro, de Tião – só aconteceram devido a restrições das produtoras (a Trincheira vai lançar um DVD em comemoração aos dez anos da produtora).

Apesar de a qualidade dos filmes variar bastante – principalmente os mais antigos, que não tiveram as cópias conservadas adequadamente –, o fato dessa produção ganhar uma nova vida é digna de todos os aplausos. Afinal, muitos desses 212 filmes da Antologia do Cinema Pernambucano representam um legado inestimável. No próximo mês, em data ainda a ser divulgada, Isabella e Germana vão preparar uma série de debates sobre preservação, durante o lançamento oficial da coletânea.

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