Mesmo que as frutas mais brilhantes e vistosas sejam as preferidas, o Ministério da Agricultura quer mostrar que as “frutas feias” também tem um lugar à mesa.
De acordo com dados do órgão, no Brasil são desperdiçados, em média, 30% dos frutos e 35% de todas as hortaliças produzidas em um ano. “Nesse caso, não estamos falando de produtos podres ou inadequados para o consumo, mas sim daqueles que não são perfeitos, mas que todos nós podemos comer normalmente”, esclarece a Ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Kátia Abreu.
O Ministério salienta que as frutas e hortaliças cujo consumo está sendo estimulado são apenas as disformes ou com algum tipo de lesão, sem nenhum tipo de perda da qualidade ou do valor nutricional.
O pesquisador da Embrapa responsável pelo estudo, Antônio Soares, afirma que para evitar os desperdícios, é preciso melhorar o treinamento dos profissionais que lidam com esses alimentos, tanto no campo quanto nos centros de distribuição, e priorizar a melhora das condições de transporte e armazenamento.
“No campo, observamos muitas práticas inadequadas. Não se limpa o fruto direito e os que não estão sadios são jogados na terra, o que contamina outros pés. Isso tudo reduz a qualidade do produto”, afirma.
Nesse caso, não estamos falando de produtos podres ou inadequados para o consumo, mas sim daqueles que não são perfeitos, mas que todos nós podemos comer normalmente.
Kátia Abreu, Ministra
Ainda segundo o estudo, metade dessas perdas ocorre durante o transporte e manuseio dos frutos. Há também desperdícios registrados nas centrais de comercialização e abastecimento, nos supermercados e no campo. Apesar de a pesquisa ter sido finalizada em 2000, o pesquisador da Embrapa assegura que pouca coisa mudou nesse cenário. “Em alguns lugares, a qualidade do produto é melhor, mas em termos de perda pouca coisa mudou, porque muitas vezes não se usa embalagem adequada, os frutos perdem qualidade durante o transporte ou devido ao calor excessivo”, afirma Soares.
Incentivar a criação de espaços nos quais os produtores possam vender os produtos preteridos pela aparência é a solução para estimular o consumo dos “frutos feios”, evitando mandar para o lixo um alimento em boas condições para o consumo, mas que seria descartado apenas devido à aparência. “Queremos mostrar aos consumidores que frutas e hortaliças feias podem chegar à mesa com o mesmo sabor e a preços menores”, afirma a ministra Kátia Abreu.
Outra estratégia possível de redução do desperdício é o estímulo ao consumo das frutas e hortaliças “feias” nos supermercados a partir da adoção de estratégias como o encaminhamento das unidades disformes rejeitadas pelos consumidores à cooperativas ou a redução de preços desses produtos.
“Escolho bastante e não levo para casa frutas que não estejam bonitas ou com uma apresentação diferente da habitual. Mas, se o supermercado desse algum desconto ou fizesse alguma promoção, eu compraria e consumiria, sem dúvidas”, conta o estudante Marlon Nanuca.
INICIATIVA PORTUGUESA
O trabalho de uma cooperativa sediada em Lisboa serve como modelo de reaproveitamento desses alimentos. A Cooperativa Fruta Feia conta atualmente com 480 associados e já conseguiu evitar o desperdício de 81,1 toneladas de alimentos desde 2013, quando foi criada. No empreendimento lisboeta, os consumidores se inscrevem previamente junto à cooperativa e informam previamente a quantidade frutas que desejam levar para casa.
PRODUTO FORA DO PADRÃO COM 40% DE ABATIMENTO
Visando reduzir o descarte das “frutas feias”, um programa criado pelo Atacadão, do grupo Carrefour, oferece aos consumidores alimentos de qualidade, porém fora dos padrões estéticos de comercialização, com descontos de até 40%.
O projeto, batizado de Sans Form: qualidade além da aparência, é pioneiro no aproveitamento de alimentos no Brasil. “Por estarmos próximos ao consumidor final, tanto o varejo como o atacado podem ajudar a mudar essa cultura do desperdício”, atesta o diretor-presidente do Atacadão, Roberto Müssnich. Segundo o grupo, a tendência é que a iniciativa, adotada apenas em São Paulo, seja expandida para as outras unidades do Atacadão espalhadas pelo País. “Esta iniciativa leva qualidade à mesa do brasileiro, além de gerar economia na hora das compras”, destaca o executivo.
De acordo com a rede, a proposta é incentivar o consumo dos alimentos considerados “feios”, entretanto, com sua qualidade e propriedades mantidas. A ação reduz o desperdício e evita que as frutas e hortaliças sejam descartadas pelos produtores ainda nas fazendas.
CAMPANHA
Intitulado “Quo ima guele?” – O que há de errado com a minha cara? – um projeto de sucesso iniciado por um grupo de produtores franceses para promover as frutas que não agradam visualmente foi abraçado pelo varejista Intermarchè e representou um aumento de 24% nas vendas dos supermercados da rede.
Após constatar, a partir de uma pesquisa de mercado, que 1.200 kg de frutas e vegetais feios eram vendidos graças a um desconto de 30%, a rede lançou a campanha na qual os alimentos que seriam descartados eram comprados e revendidos nas unidades da rede em gôndolas com nomes diferentes, como “a maçã grotesca” e “ a desfigurada beterraba”.
Além disso, eram distribuídos para o consumidor sucos e sopas feitos com esses alimentos, para provar aos clientes que a aparência é o único aspecto no qual os alimentos “feios” diferem dos demais.