E se Joaquim Levy sair do Ministério da Fazenda?

Seria ruim para o Brasil. Alvo de hostilidades da própria base do governo Dilma, ministro representa a luz no fim do túnel
Emídia Felipe
Publicado em 26/05/2015 às 12:01
Seria ruim para o Brasil. Alvo de hostilidades da própria base do governo Dilma, ministro representa a luz no fim do túnel Foto: Foto: André Dusek/Estadão Conteúdo


A pergunta acima passou a ser relevante depois que a crescente tensão entre o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e outros integrantes do governo foi exposta. Embora o próprio ministro já tenha assegurado que não vai deixar o cargo, a possibilidade de uma cadeira vazia em uma das pastas mais estratégicas do governo deixa margem para o desenho de cenários nada amigáveis. Para especialistas consultados pelo JC, dois pontos críticos se abrem em possível saída de Levy: a descontinuidade do emprego de medidas austeras para debelar as perdas econômicas e a difícil busca por um substituto.

Mesmo encarado como o mal necessário, o ajuste fiscal encontra resistência no governo federal, no PT e no Congresso, aumentando o descontentamento de Levy com o fato de que, para muitos gestores públicos e empresários, “a ficha ainda não caiu” sobre a real situação da economia. Na sexta-feira passada (24/05), a ausência dele na entrevista coletiva sobre o pacote de medidas foi vista muito além da justificativa oficial. O Ministério da Fazenda disse que Levy estava gripado, mas, nos bastidores, o que se comentava era a conversa dura que ele teve com o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que apresentou os itens do pacote sozinho. Articulado com o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, Barbosa encabeçou o movimento para tirar os cortes da faixa entre R$ 70 bilhões e R$ 80 bilhões: ficou em R$ 69,9 bilhões, o que teria passado um recado ao titular da Fazenda, de que ele não teria tanto poder assim.

Resistências expostas, Levy teve que se posicionar e disse ontem que não vai sair do governo. Mas, e se ele saísse? Como a economia do País reagiria? “A saída dele seria realmente um desastre”, comenta o professor de economia da Unicap e diretor da Ceplan Consultoria Valdecir Monteiro, ao pontuar principalmente a fragilidade política do momento e como isso afetaria, de novo, a credibilidade do governo. “A bola da vez é o ajuste fiscal e a figura de Levy está muito associada a isso. Há toda uma equipe por trás, mas ele é o condutor”, diz o economista.

Integrante dos Conselhos Federal e Regional de Economia (Cofecon e Corecon PE), Fábio Silva também avalia que as características do pacote estão muito ligadas ao ministro. “Ele personifica boa parte do que está sendo feito. Temos que pensar que, com o andar da economia, podem ser necessárias novas medidas e, se ele não estiver no governo, aquilo que poderia ser feito talvez não seja”, acrescenta Fábio. Ambos destacam ainda o alto impacto que a demissão ou a desistência de Levy teria para os mercados nacional e internacional, tendo em vista que a chancela desses segmentos teve peso forte na escolha do ministro, que era diretor do Bradesco antes de assumir a Fazenda, há menos de seis meses.

Já para o sócio da Delloite e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças, Emílio Calado, Levy “não pode ser visto como um salvador da Pátria”. “Não acredito que ele seja insubstituível. Tudo dependeria de quem fosse escolhido no lugar dele. Se fosse na mesma linha, não vejo problema”, avalia o economista.

SEM APOIO
De perfil liberal e conhecido por sua carreira no mercado financeiro, Joaquim Levy tem muitos opositores dentro do governo. Outro rumor forte que emana dos corredores do Planalto é que somente a presidente Dilma Rousseff dá suporte ao ministro e, mesmo assim, com restrições.

Menos de seis meses atrás – quando acatou o convite da presidente para tirar do contribuinte o dinheiro para consertar as lambanças feitas pelo próprio governo na economia do País –, Levy viu a chance de fortalecer seu currículo. Quando seu nome foi anunciado, abrandaram-se os abalos das oscilações do câmbio, da instabilidade da Bolsa de Valores. E a desconfiança de empresários e investidores desacelerou. Movimentos que se inverteriam caso o ministro caísse, como pontua o economista Fábio Silva.

Talvez por esse “efeito calmaria”, Levy não imaginasse o tamanho da resistência que encontraria entre aqueles que seriam seus novos – ou renovados – aliados. Ele é ex-secretário do Tesouro Nacional no governo Lula, cargo que ocupou por três anos sob a batuta de Antônio Palocci, então ministro da Fazenda. Nove anos depois, Levy viu o ex-presidente da República no mesmo palanque em que manifestantes exibiam a placa “Abaixo Plano Levy”, condenando as medidas provisórias que contêm o ajuste fiscal. Petistas engrossam as vaias, como o senador Lindbergh Farias (PT RJ), que só endurece as críticas ao pacote e diz que essa postura está alinhada com as lutas históricas do partido.

Nesta segunda-feira (25/05), Levy teve que dar entrevista ao lado de Mercadante para reafirmar sua permanência no governo. “Não houve divergências. Eu estava realmente resfriado ou gripado. Houve um certo alvoroço em torno dessa história”, assegurou Levy. Curiosamente, Nelson Barbosa não apareceu. Mercadante disse que ele estaria em um reunião, mas o posicionamento oficial do Ministério do Planejamento foi que o titular da pasta estava doente e por isso não foi à reunião citada pelo ministro nem para a entrevista.

Enquanto isso, as medidas tramitam no Congresso e a maioria está ligada a cortes em áreas básicas como educação, saúde e habitação, comprometendo investimentos e continuidade de programas e dando novas regras a direitos trabalhistas. “O País precisa disso. É difícil prever, mas entre seis ou dez meses poderemos começar a sair dessa situação”, avalia o economista Emílio Calado. O também economista Valdecir Monteiro faz um resumo da influência desse cenário no entrave econômico. Apesar de ser muito prático e real no dia a dia da população, no âmbito das macrodecisões o problema não estaria contido apenas em números, porcentagens e cifras. “Essa crise econômica está sendo potencializada pelas crises ética e política”, resume.

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